Pelos cálculos do economista
Mark Weisbrot, que tomam por base projeções
do Fundo Monetário Internacional (FMI) e resultados
da economia brasileira, a expansão anual da renda per
capita nos cinco primeiros anos desta década deve ficar
em torno de 1%.
"Com isso, o Brasil deve seguir o mesmo ritmo lento
das duas décadas anteriores. É uma grande decepção
para quem esperava que as reformas fossem pôr o país
nos trilhos do desenvolvimento sustentado", disse o economista
americano, um dos autores do estudo.
Na década de 80, segundo os números citados
pela pesquisa, a renda per capita do brasileiro – resultado
da divisão do Produto Interno Bruto (PIB) pelo número
de habitantes do país – cresceu 0,9%. Nos anos
90, esse percentual caiu um pouco, ficando em 0,7%.
São números muito inferiores aos das décadas
de 50 (3,8%), 60 (3,9%) e 70 (5,9%), de acordo com a pesquisa
intitulada Outra Década Perdida?.
"Os brasileiros acham que os resultados das décadas
de 60 e 70 foram resultado de um milagre. O crescimento foi,
sim, sustentado pelo endividamento, o que não é
bom, mas, nos anos 90, também houve um enorme aumento
da dívida e o país pouco cresceu", disse
Weisbrot.
"Infelizmente, não apenas no Brasil, mas em toda
a América Latina, estamos vendo a repetição
de um padrão de crescimento - ou de estagnação
- que já vem sendo observado há mais de duas
décadas", concluiu Mark Weisbrot.
Fantasia
Para reverter esse resultado e chegar perto do resultado
dos anos 60 e 70, a renda per capita brasileira teria que
dar saltos anuais de 9,3% nos últimos cinco anos desta
década, uma proeza alcançada apenas pela China
na história econômica recente.
"Seria uma fantasia achar que isso é possível",
disse o pesquisador.
Segundo o estudo, algumas das causas para o que eles chamam
de "fracasso" das economias latinoamericanas pode
estar nas reformas neoliberais implementadas nos países
da região a partir dos anos 80.
Ele cita, por exemplo, a substituição de uma
política de desenvolvimento industrial pela abertura
do país para importações.
"O discurso da época era de que insumos importados
mais baratos impulsionariam o desenvolvimento. Isso não
aconteceu. Nenhum país do mundo se desenvolve se abrindo
para exportação. Os Estados Unidos nunca fizeram
isso, a Alemanha nunca fez isso, a China não faz isso",
afirmou Weisbrot.
Ele citou também as elevadas taxas de juros no Brasil
como parte dessas receitas neoliberais que frearam o crescimento
brasileiro.
"A política de juros altos, endossada pelo FMI,
exige um aperto fiscal imenso, inconcebível. Milagre
é o país não estar numa recessão
profunda com taxas tão altas", disse.
"Não é sempre fácil isolar as causas
de um fenômeno dessa magnitude, mas precisamos deixar
claro que algo sério aconteceu. A região teve
o pior resultado de sua história recente nesses últimos
25 anos. Nem a Grande Depressão teve um impacto tão
nocivo", afirmou Weisbrot, acrescentando que, apesar
dos problemas, houve progressos.
"Você tem exemplos positivos. A privatização
das telecomunicações no Brasil, por exemplo,
melhorou o serviço", disse.
Coréia do Sul
Para ele, chamar o desempenho econômico dos
anos 60 e 70 de milagre é não querer admitir
o fracasso das décadas posteriores.
Países como a Coréia do Sul, segundo ele, provam
que é possível viver um "milagre"
por muitas décadas.
Em 1960, a renda do brasileiro era, em média, duas
vezes e meia superior à do sul-coreano.
Essa situação foi, aos poucos, se revertendo
até que, hoje em dia, o sul-coreano ganha, em média,
duas vezes e meia o que ganha o brasileiro, de acordo com
o estudo.
"A Coréia nunca abandonou uma política
desenvolvimentista. Até hoje, não há
muitos carros importados no país. Um certo grau de
protecionismo foi importante para os Estados Unidos, para
a França, para a Alemanha. Por que não seria
bom para o Brasil?", questionou.
O economista participou, em Miami, das discussões
para a criação da Área de Livre Comércio
das Americas, a Alca.
Para ele, o Brasil tem que tomar cuidado para, nas negociações
de acesso a mercados para a criação da Alca,
não deixar ganhos na área agrícola prejudicarem
o desenvolvimento de setores da indústria brasileira.
"Os Estados Unidos nunca vão aceitar uma Alca
que não dê a eles as vantagens que a comunidade
empresarial quer. O Brasil precisa ficar atento. De que adianta
exportar mais produtos agrícolas se a indústria
é impedida de crescer? Que país no mundo se
desenvolveu por exportar mais soja?", questionou o economista.
SILVIA SALEK
Da BBC Brasil
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