BRASÍLIA - Em duas solenidades
ao longo desta segunda-feira, o Poder Executivo e o comando
das principais cortes da Justiça brasileira deixaram
claras suas divergências sobre a proposta de controle
externo do Judiciário. Em discursos tanto na solenidade
de abertura dos trabalhos do Judiciário em 2004 quanto
na reunião preparatória da VIII Cúpula
Ibero-Americana de presidentes de Cortes Supremas e Tribunais
Superiores, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva
defendeu o controle externo. Nos dois eventos, os presidentes
do Supremo Tribunal Federal (STF), Maurício Corrêa,
e do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Nilson Naves,
rebateram a idéia, chamando-a até de inconstitucional.
"O respeito pelo princípio da separação
dos poderes e o apreço pela afirmação
de sua independência não nos devem afastar das
responsabilidades que temos. Ao contrário, a manutenção
da harmonia entre os poderes, princípio também
consagrado pela Constituição do Brasil, exige
que nos dediquemos a esta tarefa com o melhor dos nossos esforços",
disse Lula, na frente de Corrêa e Naves, na sede do
STJ.
Mais cedo, ele já afirmara ser favorável à
criação dos conselhos nacionais de Justiça
e do Ministério Público. Pela proposta já
aprovada na Câmara dos Deputados - e que faz parte da
pauta da convocação extraordinária do
Senado -, os dois conselhos teriam a função
de fiscalizar as partes administrativa e financeira e casos
de desvio de função. O Conselho Nacional de
Justiça seria formado por nove magistrados, dois representantes
do Ministério Público, dois advogados nomeados
pela Ordem dos Advogados do Brasil e dois representantes da
sociedade civil, um indicado pela Câmara e outro pelo
Senado. O Conselho Nacional do Ministério Público
teria composição semelhante, só que com
nove representantes do Ministério Público e
dois magistrados, além dos demais membros.
Após a solenidade de abertura do ano judicial, o presidente
do STJ disse que se fosse membro do Supremo não teria
dúvidas em decretar a inconstitucionalidade de um órgão
de controle externo do Judiciário. Para Naves, o Judiciário
deve ter um controle, mas ele deve ser exercido por membros
do próprio Judiciário, sob pena de se ferir
o artigo 2º da Constituição, que trata
de independência dos poderes. Segundo seu entendimento,
os conselheiros deveriam ser integrantes do STF, do STJ e
dos tribunais estaduais.
"O Judiciário não pode ser colocado em
posição de subordinação a qualquer
dos outros poderes. Caso o fosse, ficaria exposto a influências
políticas, o que, como sabemos, sucede nos regimes
totalitários, em que o ditador não admite que
o Legislativo e o Judiciário não lhe sejam submissos",
disse Naves.
Mais tarde, ele acrescentou, em discurso:
"Independência não existe pela metade:
ou é ou não é. Entre nós já
foi estabelecido que os tribunais são órgãos
da soberania nacional, que o Judiciário é soberano.
Quando historicamente se cogitou a criação de
um órgão controlador do Judiciário pensou-se
em dar proteção à magistratura. Ao contrário
dessa visão, surgiu nos últimos tempos no Brasil
a idéia de um controle externo do Judiciário
que, antes de conferir proteção à magistratura,
pressupõe castigá-la".
O presidente do STF, Maurício Corrêa, também
rejeitou a idéia do controle externo.
"A criação de um órgão desse
gênero não vai responder à expectativa
da sociedade brasileira, que deseja mais presteza e eficiência
do Poder Judiciário. A sua adoção transformaria
o Judiciário no único Poder da República
que passaria a ter um órgão específico
de fiscalização externa de suas atividades administrativa
e financeira", afirmou.
BERNARDO DE LA PEÑA
do Globo Online
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