A queda na renda do trabalhador impediu que a indústria brasileira mantivesse
em outubro a trajetória de crescimento apresentada
em julho, agosto e setembro. Por causa da estagnação
da categoria de bens semi e não-duráveis, a
produção industrial caiu 0,5% na comparação
com o mês anterior, já descontados os efeitos
típicos de cada período.
"A renda está restringindo uma expansão
mais forte dos bens de consumo, o que rebate na indústria
como um todo", disse Silvio Sales, chefe da Coordenação
de Indústria do IBGE (Fundação Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística).
O "efeito renda" é notado principalmente
pelo desempenho dos bens semi e não-duráveis,
que teve o pior entre todas as categorias em outubro. A categoria
abrange os produtos de consumo mais essencial: de alimentos
a remédios.
"Foram os semi e não-duráveis que seguraram
a produção, sob efeito da renda, que continua
em queda", disse Luciana Sá, economista da Firjan
(Federação das Indústrias do Estado do
Rio de Janeiro). Em outubro, o rendimento do trabalhador caiu
15,2% em comparação com o mesmo mês de
2002, segundo o IBGE.
Francisco Pessoa, da consultoria LCA, concorda. Mas disse
que 2004 será melhor, pois o rendimento crescerá
com as correções salariais maiores do que os
índices de preço, que estão em queda.
Sobre os dados de outubro, Sales disse que o recuo não
aponta uma trajetória de queda porque a retração
está concentrada em apenas três dos 20 ramos
industriais. Nenhuma categoria de uso, diz, teve sinal negativo.
O problema é que dois dos ramos que caíram
são os mais importantes da indústria -alimentos
(não-durável) e química, com retração
de 1,6% e 0,7%, respectivamente. Além desses, recuou
também a produção do segmento farmacêutico:
4,4%.
Na comparação com outubro de 2002, a indústria
geral registrou alta de 1,1%. No acumulado de janeiro-outubro,
a taxa ficou em zero. E nos últimos 12 meses, o crescimento
foi de 0,8%.
Para o IBGE, a retração de outubro é
uma "acomodação do nível de produção
em um novo patamar", mais elevado do que o de agosto,
porque em setembro houve um aumento expressivo da produção:
4,1%.
"Não dá para falar em mudança de
tendência. Setembro cresceu muito e agora está
devolvendo parte dessa expansão. Se olharmos melhor,
o resultado é positivo", avalia Juan Pedro Jensen,
da Tendências Consultoria.
Segundo Luciana Sá, houve uma "aceleração
muito grande" em setembro. "Com isso, muitas empresas
resolveram estocar, pois tiveram um acúmulo de encomendas",
afirma.
Para Sales, novembro pode ser um mês de crescimento
forte, uma vez que, neste ano, por causa da crise, os picos
de produção estão deslocados. Costumam
ser agosto (bens intermediários) e outubro (bens de
consumo). Mas pesquisas indicam que os estoques estão
baixos, o que sinaliza a possibilidade de uma reação.
Bens de capital
Os bens de capital -máquinas e equipamentos -tiveram
em outubro a quarta expansão seguida: 3,8%, a maior
alta de todas as categorias de uso no mês.
"É um dado muito positivo. Indica que há
uma recuperação do investimento. É bom
porque evita pressões de preço no futuro, quando
o consumo subir forte, e evita gargalos", afirma Jensen.
Para ele, o retorno do investimento, o aumento da renda e
o efeito tardio da queda dos juros sobre o crédito
permitirão uma melhora da indústria em 2004.
Na visão de Pessoa, a indústria vai manter
o ritmo de expansão nos próximos meses. Terá,
porém, alguns "soluços" no início
de 2004 por causa da demora na reação do rendimento.
PEDRO SOARES
da Folha de S. Paulo, sucursal do Rio
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