Às vésperas de lançar A revolução
gerenciada no qual diz que o Brasil deu um salto
na educação nos oito anos de governo Fernando
Henrique , o ex-ministro da Educação Paulo
Renato Souza diz que o governo Lula perdeu o foco na área
de educação, por mudar sucessivamente suas prioridades,
e critica medidas do atual ministro, Tarso Genro. Entre elas,
a mudança no Provão.
Paulo Renato não vê contradição
entre seu diagnóstico e a pesquisa da Unesco que pôs
o Brasil no 72 lugar num ranking de educação.
Para ele, o filme da evolução da educação
brasileira é bom, a fotografia do momento a
pesquisa é que é ruim.
O senhor diz que houve uma revolução na
educação no Brasil durante o governo Fernando
Henrique, mas a Unesco divulgou um ranking de educação
em que o Brasil está na 72 posição. Como
explica isso?
Paulo Renato Souza: O filme da educação
brasileira é muito bom, mas a fotografia do momento
é ruim. Evoluímos muito, mas ainda há
muito por fazer. Esses dados todos eram muito piores. Nesse
estudo não tem avaliação de qualidade,
só dados quantitativos sobre matrícula, evasão
escolar, analfabetismo. Concordo com o Tarso (Genro, atual
ministro da Educação) quando ele diz que o resultado
não é a história do atual governo nem
do governo anterior. Herdamos uma situação muito
ruim, de anos de descaso.
Como o senhor avalia a gestão de Tarso Genro?
Paulo Renato: O Tarso é um bom realizador. O problema
é que ele, como não vem da área de educação,
tem que se fiar em assessores, pessoas que têm idéias
um pouco desfocadas na área da educação.
A coisa mais importante que aconteceu foi a mudança
de foco da atual administração. O governo atual
desviou a atenção do ensino básico, tirou
a prioridade. No primeiro ano de governo, concentrou-se na
questão do analfabetismo com o ministro Cristovam.
Quando entrou Tarso, a prioridade passou a ser o acesso ao
ensino superior. São temas muito importantes, mas o
país ainda não completou o avanço necessário
na educação básica. Ainda não
universalizou o acesso ao ensino médio, nem à
educação pré-escolar, e alguns programas
foram abandonados.
Quais, por exemplo?
Paulo Renato: O programa de treinamento de professores
e na questão do livro didático. O governo tornou
a avaliação menos transparente ao acabar com
os indicadores da avaliação. Deixou de avançar
na questão da informatização das escolas,
apesar de ter os recursos para isso com o Fust (Fundo de Universalização
dos Serviços de Telecomunicações). Acho
que o governo perdeu o foco. No ano passado, o governo aceitou
uma deliberação que praticamente deixa de exigir
nível superior para os professores da educação
infantil da primeira à quarta série. São
quatro ou cinco pontos que mostram que se perdeu o foco na
melhoria da educação básica.
O que achou da entrevista de Tarso no GLOBO sobre seu
livro "Esquerda em progresso"? A idéia de
uma democracia radical é viável?
Paulo Renato: Só li a entrevista agora. Pelo que
vejo, ele fez algumas declarações extremamente
injustas e oportunistas. Por exemplo, ele diz que o presidente
Fernando Henrique seguiu deliberadamente uma agenda neoliberal,
mas o governo Lula, que tem feito praticamente a mesma coisa,
não pode fazer muito por exigência da realidade.
Então antes era uma vontade deliberada de seguir uma
agenda neoliberal e agora é uma exigência da
realidade? Francamente! Chega a ser caricato. Os políticos
no Brasil têm que aprender a ser mais realistas. A população
deu um recado nas últimas eleições de
que não aceitará mais dissimulação
nem oportunismo.
O que acha da mudança no Provão e no programa
Universidade para Todos?
Paulo Renato: O novo exame (Exame Nacional de Desempenho
dos Estudantes, Enade) é um grande retrocesso. Vamos
perder todo o histórico da avaliação
que o país já tinha assimilado. Não sei
por que a necessidade de mudar para um processo por amostragem,
onde vai haver uma volta ao passado, no sentido de transparência
nos indicadores de qualidade para aprovar os novos cursos.
E o governo erra também na questão do Prouni
(Programa Universidade para Todos), essa compra de vagas nas
universidades privadas. O governo acerta no diagnóstico,
mas erra muito no remédio. Ou seja, comprar vagas pela
via da isenção de impostos é um atraso
brutal na vida do país. Se o governo queria comprar
vagas, deveria ter comprado vagas diretamente, e não
dar isenção de impostos. Isso porque a isenção
de impostos no passado foi a porta para a corrupção,
o desvio de recursos e a fraude ao Fisco.
O governador Geraldo Alckmin é o nome mais forte
do partido para 2006?
Paulo Renato: Sem dúvida ele é o nome mais
forte hoje. Obviamente, daqui até 2006 é um
longo caminho e ele precisa se fortalecer como um nome nacional.
O partido tem outros nomes, eu acho que o próprio presidente
Fernando Henrique não descarta a possibilidade de se
candidatar, se vier a ser convocado. Eu não acredito
e nem ele acredita e deseja isso, conforme ele mesmo expressou
em entrevista recente à imprensa, mas obviamente é
um grande nome do partido também. Mas acho que hoje
o desejo dele é apoiar Alckmin.
O senhor pretende voltar à administração
pública?
Paulo Renato: Ainda não sei. Aproveitei os últimos
dois anos para organizar a minha vida privada. Montei uma
empresa de consultoria na área de educação
em sociedade com meu filho, presto serviço a diversas
empresas e publico um boletim mensal (Educação
& Conjuntura). Mas eu não fecho a porta para voltar
à área pública ou mesmo disputar uma
eleição em 2006, dependendo das circunstâncias
partidárias. Não estou buscando isso, mas não
descarto.
JORGE HENRIQUE CORDEIRO
do jornal O Globo
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