Criado
para garantir os direitos fundamentais da infância,
o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) completa
amanhã 14 anos, em meio à discussão para
mudar alguns pontos do texto original. Uma proposta que tramita
na Câmara dos Deputados, em Brasília, pretende
aumentar o rigor da pena imposta a adolescentes que cometeram
crimes – os chamados atos infracionais. Pela lei atual,
o jovem de 12 a 18 anos envolvido em casos de grave ameaça
ou violência à pessoa, como homicídios
e latrocínios (assalto a mão armada), pode ser
“condenado” a permanecer internado em instituições
de recuperação, sob a cústodia do estado.
Pela proposta do deputado federal Vicente Cascione (PTB-SP),
o período mínimo de reclusão passaria
a ser de três anos e o máximo de 27 anos –
quase a pena máxima (30 anos) que um adulto pode cumprir
em cadeias comuns. O tempo foi determinado pela média
da soma das penas mínimas e máximas previstas
nos casos de crimes hediondos – 24 e 30 anos. Atualmente,
o tempo máximo de detenção é de
três anos
A proposição causou uma forte reação
entre especialistas de todo o Brasil e colocou o destino do
adolescente infrator no centro dos debates sobre o ECA. “O
Estatuto é a melhor coisa que esse país já
fez pela criança e o adolescente. Ele não precisa
ser melhorado. Tem é que ser cumprido”, afirma
a presidente da Associação dos Conselheiros
Tutelares de Curitiba, Maria Rosa Carvalho de Mello. Para
ela, discutir a ampliação da pena é um
crime, uma maneira cômoda de fugir à responsabilidade.
“As pessoas esquecem de analisar o que foi que a sociedade
deu a esse adolescente infrator para que ele seja assim. Quais
as violações de direito que foram cometidas
contra ele. Enquanto não conseguirmos olhar a criança
marginalizada com o mesmo olhar que damos aos nosso filhos,
o problema vai sempre persistir”, explica.
O presidente do Instituto de Ação Social do
Paraná (Iasp), José Wilson de Souza, é
categórico ao afirmar que a ampliação
da pena não resolverá nada. Responsável
pelo gerenciamento de 16 centros de internamento e recuperação
no Estado, ele acredita que o atual modelo de detenção
é muito bom. “Jovens infratores precisam é
de um referencial, de alguém que diga a eles o que
é certo ou errado. E até os 21 anos é
o melhor período para se trabalhar isso porque a estrutura
neurológica do adolescente ainda está em formação”,
argumenta ele, lembrando que no Paraná os adolescentes
privados de liberdade não ficam mais do que um ano
e meio reclusos nos educandários. “Às
vezes seis meses dentro de uma unidade já é
suficiente para torná-lo uma pessoa calma”, diz.
A cada 180 dias, o jovem é submetido a uma avaliação
que pode abreviar ou esticar o tempo de permanência
dele na unidade.
Para Souza, nem a participação em crimes graves
ou hediondos justificaria uma punição maior
ao adolescente. “Geralmente quando comete um ato grave,
ele está acompanhado ou é induzido por um adulto.
Por si só, ele não pode ser responsabilizado”,
opina.
Para Marta Tonin, integrante da Comissão da Criança
e do Adolescente da Ordem dos Advogados do Brasil, seção
Paraná (OAB-PR), a proposta de mudança erra
ao privilegiar uma punição mais rígida
ao invés de propor novas maneiras de se investir na
recuperação do adolescente infrator. “A
proposta traz a falsa idéa de que aumentando a repressão
haverá uma redução na criminalidade e
isso não é verdade”, diz. “Acho
que se os três anos de detenção impostos
ao jovem fossem bem trabalhados, oferecendo condições
de estudo, profissionalização e contato permanente
com a família, ele de fato teria a condição
de se recuperar”, argumenta. Segundo o presidente do
Iasp, aumentar a pena, neste caso, só comprometeria
a perspectiva do jovem de ter um futuro melhor, longe das
ruas e da criminalidade.
As informações são
da Gazeta do Povo, de Curitiba-PR.
|