Durante
todo o primeiro semestre deste ano, o governo Lula deixou
de fiscalizar a freqüência em sala de aula dos
alunos que são beneficiados pelo Bolsa-Família,
programa unificado de transferência de renda que foi
lançado em outubro de 2003.
A verificação da contrapartida do Bolsa-Escola,
um dos programas que deram origem ao Bolsa-Família,
vinha sendo realizada a cada três meses desde 2002,
o último ano do governo FHC.
Acompanhar a saúde das crianças beneficiadas
e a freqüência dos estudantes está entre
as contrapartidas que foram "herdadas" das bolsas
Alimentação e Escola, incluídas na unificação.
Já a fiscalização da saúde e do
estado nutricional das famílias continua a ser realizada.
De acordo com o secretário nacional de Renda de Cidadania,
André Teixeira, o sistema usado para verificar a permanência
no ensino fundamental está sendo reformulado. Será
descentralizado para que Estados e municípios fiquem
responsáveis por ele.
Com isso, a possibilidade de retirar as famílias do
programa por não-cumprimento das contrapartidas exigidas
também caberá às administrações
locais.
"Não há sentido imaginar que, daqui de
Brasília, o governo federal tenha olhos para ver no
Brasil inteiro e tomar decisões sobre uma criança
que não foi à escola. O gestor local pode buscar
soluções para que a criança, que saiu
da escola por circunstância específica, tenha
condição de retornar", afirma o secretário.
A previsão é que até o final deste ano
esteja funcionando o novo sistema, possivelmente com informações
on-line. Enquanto isso, Teixeira diz que, até o próximo
mês, será feito o acompanhamento, nos moldes
antigos, da freqüência no primeiro semestre.
Ou seja, a Caixa Econômica Federal, que é responsável
pelo pagamento dos benefícios, envia formulários
às prefeituras para que as escolas respondam se as
crianças beneficiadas estão ou não comparecendo
às aulas. Essas informações são
repassadas ao governo federal.
"A suspensão gerou descontinuidade, mas se deve
ao esforço para conseguir que o Bolsa-Família
tenha informações com mais qualidade. Não
compromete", afirma Ricardo Henriques, secretário
da Educação Continuada, Alfabetização
e Diversidade do Ministério da Educação.
De acordo com Henriques, os técnicos do governo estão
trabalhando para que, além de saber se a freqüência
dos alunos está ou não dentro do exigido pelo
programa, o governo tenha dados sobre desempenho dos beneficiados
na escola e a defasagem de idade em relação
à série cursada.
Financiamento
Para montar o novo sistema, o governo vai utilizar
parte dos US$ 15 milhões que são destinados
pelo Banco Mundial à melhoria do cadastro único
dos beneficiados e dos instrumentos de gestão, além
da avaliação e do monitoramento do Bolsa-Família.
"O sistema, da forma como está, não permite
que o governo, diante de um problema, responda a ele, em vez
de simplesmente aplicar uma sanção. Não
queremos uma lógica de vigiar e punir a família.
Nós queremos a garantia pelo Estado da oferta do serviço",
afirma Teixeira.
A diretora de Estudos Sociais do Ipea (Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada), Anna Maria Medeiros Peliano, diz
que contrapartidas são importantes em programas de
transferência de renda porque estimulam as famílias
a buscarem os serviços públicos.
"É uma forma de trabalhar um programa social com
caráter emergencial para ter resultado de impacto a
médio e longo prazo", justifica a diretoria do
Ipea.
A primeira unidade da Federação a adotar o novo
sistema de fiscalização será o Distrito
Federal, que vai assinar hoje o termo de cooperação
com a União.
Histórico
O secretário de Renda de Cidadania afirma
ainda que, desde 2002, o sistema de fiscalização
do então Bolsa-Escola era "frágil".
"Historicamente não temos boa informação
no controle da condicionalidade do ensino. Depois de lançado,
em abril de 2001, o Bolsa-Escola ficou mais de um ano sem
acompanhamento", diz Teixeira.
As contrapartidas do Bolsa-Escola começaram a ter acompanhamento
apenas no terceiro trimestre de 2002, quando 62% dos municípios
atendidos à época responderam ao questionário.
No último trimestre do ano passado, o acompanhamento
do governo atingia 90% das cidades beneficiadas e 13% das
escolas.
O secretário afirma que o aumento do número
de crianças atendidas neste ano também foi um
dos pontos que dificultou o acompanhamento.
O Bolsa-Família fechou o mês passado atendendo
a 4,1 milhão de famílias (incluindo 11,5 milhões
de crianças matriculadas no ensino fundamental) em
5.463 municípios do país.
LUCIANA CONSTANTINO
da Folha de S.Paulo
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