A
Declaração do Milênio, proposta pela Organização
das Nações Unidas (ONU) no ano de 2000 e ratificada
por 189 países, estabeleceu 8 objetivos, 18 metas e
48 indicadores claros que devem ser cumpridos até 2015.
Os "Objetivos de Desenvolvimento do Milênio"
buscam erradicar a pobreza no planeta, promover o desenvolvimento,
a proteção do meio ambiente, a defesa dos direitos
humanos e da democracia. No Brasil, a rodada de discussão
em torno das medidas da ONU começou no último
dia 9 de agosto, com a presença do presidente Luiz
Inácio Lula da Silva, e termina no próximo dia15.
Na abertura da Semana Nacional pela Cidadania e Solidariedade,
Lula disse que é preciso planejar uma relação
efetiva entre o governo e a sociedade civil. E advertiu que,
se por um lado o Estado não pode se isentar de sua
responsabilidade, por outro, cada cidadão tem o papel
de cobrá-lo. Em relação aos "Objetivos
de Desenvolvimento do Milênio" (ODM), o presidente
afirmou que o Estado deve prestar contas anualmente à
sociedade, informando o que está fazendo para cumprir
as metas.
Carlos Lopes, representante do Programa das Nações
Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e coordenador do Sistema
ONU no Brasil, disse que se o mundo continuar caminhando a
passos lentos em busca destas mudanças, mesmo com o
crescimento e desenvolvimento de alguns países, apenas
duas das oito metas – erradicar a pobreza e reduzir
o número de pessoas sem água potável
- poderão ser cumpridas. O representante da ONU deu
seu recado na mesa que debateu "Metas do Milênio:
Um Desafio Positivo para as Parcerias", promovido pela
Secretaria Municipal de Relações Internacionais
e pelo Fórum Empresarial de Apoio à Cidade de
São Paulo.
De acordo com Carlos Lopes, ao ritmo atual, a meta de reduzir
pela metade o número de famintos no mundo e a de diminuir
em 2/3 a mortalidade infantil só serão atingidas
entre 2020 e 2050. Situação mais grave diz respeito
ao compromisso de que todas as crianças de até
14 anos estejam matriculadas na escola. A meta só seria
atingida depois de 2050. "Os 59 países que partem
de um patamar muito baixo provavelmente nunca poderão
atingir as metas. E, se atingirem ao passo atual, eles conseguirão
somente em 2147", estimou.
Os 54 paises em desenvolvimento também têm
sofrido quedas da sua renda per capita e, a maioria, está
mais pobre do que em 1990. Na América Latina a situação
não é diferente, mesmo em países com
crescimento. Carlos Lopes ressalta que no Brasil, apesar de
a pobreza ter começado a cair nos anos 90, isso ocorreu
de forma desigual e não tão rapidamente quanto
o necessário para o país atingir os objetivos
da primeira meta, que é erradicar a fome e a miséria.
Entre o final da década e o ano de 2001, cerca de 10%
dos brasileiros viviam com menos de US$ 1 por dia.
O cenário de desigualdade entre as regiões
do país também fica evidente. O representante
do PNUD afirma que a pobreza cresceu na região Norte
de 36% para 44% na última década, de acordo
com o IBGE. O país alterna performance acima da média
em alguns indicadores e, em outros casos, desempenho preocupante.
O Brasil se destaca, por exemplo, na meta que de diz respeito
à igualdade de sexo, que é medida pela proporção
entre o número de meninas em relação
ao de meninos matriculados nas escolas, de forma igualitária,
atingindo 100%. No Brasil esta taxa já é de
103%. Em relação às ações
de combate a fome, o Brasil também tem tido desempenho
superior à média latino-americana. Mas, mesmo
esta meta, alerta Carlos Lopes, vai ser atingida por uma média
e não de forma igual no país. Somente a Região
Sul do país deve cumprir essa meta.
Outro exemplo é a saúde. O indicador sugerido
para esta meta é a razão de mortes de crianças
de até 5 anos para cada mil nascidos. O país
vem reduzindo essa taxa no mesmo ritmo que a média
latino-americana e deve conseguir atingir a meta até
2015. Mas os registros mais preocupantes para o Brasil, de
acordo com Carlos Lopes, dizem respeito ao saneamento básico
e o acesso à água potável, que cresceu
de 83 para apenas 87% de 1990 a 2001, quando a meta é
92%.
Alguns países, no entanto, tem conseguido bons resultados.
Ao longo dos anos 90, a China, por exemplo, conseguiu reduzir
a pobreza pela metade. Em Uganda, houve uma reversão
do crescimento da AIDS. O representante do PNUD destaca como
exemplo ainda a África do Sul que, em apenas sete anos,
conseguiu oferecer acesso à água potável
para 11 milhões de pessoas.
Na opinião de Carlos Lopes, isso prova que os avanços
podem ser conquistados, mas é preciso o comprometimento
dos países ricos com novas regras de comércio
justo, ajuda financeira, revisão das dívidas,
e a contrapartida dos países pobres que devem promover
reformas e otimizar recursos para as situações
urgentes.
Segundo José Tubino, representante da FAO (Organização
das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação)
no Brasil, a grande contradição está
justamente no fato de que existem os recursos suficientes
para mudar a situação atual do mundo, mas se
gasta grande parte destes recursos em caminhos equivocados.
"Um exemplo disso é que os recursos necessários
para atingir a meta do milênio seriam US$ 50 bilhões
de dólares a mais por ano. Esse número está
perto do que é gasto no Iraque em um ano: US$ 80 bilhões.
Ou seja, vamos continuar fazendo grandes investimentos nestas
linhas que já conhecemos ou vamos tentar encontrar
uma terceira via que permita o desenvolvimento econômico
e social?".
Na avaliação dos especialistas, para que as
metas sejam realmente atingidas, é necessário
trabalhar estes objetivos não apenas no âmbito
global, mas trazer estas questões para a realidade
de cada nação, com articulações
nas dimensões nacionais, estaduais e municipais. "Se
não articularmos desta forma, vamos continuar fazendo
esforços na destinação de recursos deficientes
e com falta de coerência e impacto. Precisamos compartilhar
que esse sentimento de solidariedade em todos os níveis",
destacou José Tubino.
Alberto Paranhos, oficial principal de Assentamentos Humanos
do ROLAC/UN-Habitat, acredita que, caso esta nova postura
mais regionalizada não seja adotada por todos, a partir
de uma construção coletiva e consecutiva, algumas
metas serão atingidas somente quantitativamente, mas
não com a garantia da qualidade de vida para a população
de todas as nações. "Se, por exemplo, conseguirmos
atingir a meta de melhorar a vida de 100 milhões de
pessoas até 2020, mas toda essa população
estiver na China, a meta está atingida, mas não
resolvemos o problema do mundo, só daquele país.
Por isso precisamos ter uma visão clara de como a meta
global se traduz regionalmente e que cada país tenha
uma meta monitorada".
DANIELE PRÓSPERO
do setor3
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