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Os programas
sociais voltados para a educação -como o Bolsa-Família,
do governo federal, e outros similares- concentram esforços
nos grupos etários que menos precisam de ajuda para
freqüentar a escola e seriam mais eficazes se dessem
prioridade a crianças de cinco e seis anos ou de 14
anos ou mais.
Além disso, há problemas de focalização
(fazer chegar o benefício aos realmente mais pobres)
nos Estados do Rio de Janeiro e de São Paulo, justamente
os que apresentam a menor cobertura de crianças beneficiadas
entre todos os Estados.
Há também aspectos positivos: 1) a porcentagem
de beneficiados pelos programas que estão fora da escola
é de só 2,2% -entre os não beneficiados,
ela é de 11,6%;
2) quando se analisa todo o Brasil, os benefícios estão
chegando principalmente aos mais pobres.
É o que indicam tabulações feitas a partir
da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios)
de 2003, do IBGE, pelo presidente do Iets (Instituto de Estudos
do Trabalho e Sociedade) e ex-presidente do IBGE, Simon Schwartzman.
Para chegar a essas conclusões, o autor fez uma análise
do perfil socioeconômico das famílias que, segundo
a Pnad, eram beneficiárias de programas sociais voltados
para a educação.
A primeira conclusão é que esses programas estão
mal focalizados do ponto de vista educacional, concentrando
esforços nos grupos que menos necessitam apoio ou estímulo
para ir à escola.
Para chegar a essa conclusão, o estudo comparou a taxa
de freqüência escolar por idade entre crianças
que recebem e que não ganham o benefício. No
caso das que têm entre 7 e 13 anos, receber ou não
faz quase nenhuma diferença, já que mesmo as
que não são beneficiadas têm taxa de escolarização
superior a 95%. Ou seja, sem o incentivo, mais de 95% dessas
crianças já estão na escola.
No caso de crianças de cinco ou seis anos, porém,
receber ou não faz mais diferença. Aos cinco
anos, 82% das crianças beneficiadas estavam na escola,
taxa que cai para 69% entre as não atendidas. Aos seis
anos, os índices são, respectivamente, de 95%
(beneficiadas) e 86% (não atendidas).
A diferença volta a ser significativa a partir dos
14 anos. Aos 16, 92,3% dos que recebiam benefício em
2003 estavam na escola, enquanto, entre os que não
recebiam, o índice caía para 82%.
A Pnad mostra que 70,3% das crianças beneficiadas por
um desses programas tinham entre 7 e 13 anos. Só 4,4%
tinham cinco ou seis anos, enquanto 25,3% estavam na faixa
etária de 14 a 17.
"A principal explicação para isso é
que, como a freqüência à escola no Brasil
já era muito alta para as crianças de 7 a 14
anos, o estímulo para estudar por causa de um auxílio
monetário torna-se redundante", diz Schwartzman.
Benefício a famílias pobres
A pesquisa indica que, das 42,2 milhões de
crianças de 5 a 17 anos no Brasil, 8,3 milhões
(19,7% do total) pertenciam a famílias que recebiam
benefícios sociais, enquanto outras 3,8 milhões
já estavam inscritas nesses programas em 2003, mas
ainda não haviam começado a receber o benefício.
A maioria (52,3%) das crianças já beneficiadas
era de famílias cuja renda média per capita
as colocava entre as 20% mais pobres do país. As menores
porcentagens de cobertura foram encontradas no Rio (só
7,7% das crianças de 5 a 17 anos) e em São Paulo
(8,4%).
Por serem Estados com renda maior do que a média nacional
e menor proporção de pobres, era de se esperar
que Rio e São Paulo apresentassem uma porcentagem menor
de beneficiados. A proporção encontrada, no
entanto, foi muito pequena mesmo quando comparada com outras
unidades da federação de renda alta para os
padrões brasileiros, como Rio Grande do Sul (14,8%)
e Distrito Federal (14,2%). Os
Estados com maior cobertura são Piauí (36,1%)
e Maranhão (33,7%).
Apesar de a Pnad não informar em qual programa a família
está inscrita, Schwartzman afirma que, em todo o Brasil,
as análises tratam principalmente do programa Bolsa-Família,
do governo federal, o maior desse tipo no país.
Avaliação
Para o ex-presidente do IBGE, os dados da Pnad sugerem
que os programas sociais voltados à educação
estão bem focalizados do ponto de vista da renda familiar
dos beneficiados, apesar de haver algumas discrepâncias
regionais. Ele afirma que o mesmo não pode ser dito
da focalização nas crianças que mais
precisam de apoio para ir à escola.
"Uma política adequada de melhoria da educação
básica deveria concentrar seus esforços na qualidade
e no segmento de maior risco, que são os adolescentes
que começam a abandonar a escola aos 14 e 15 anos.
Programas sociais voltados para a educação são
justificáveis como política de renda e de apoio
a famílias pobres com crianças, mas seus impactos
sobre a educação parecem duvidosos", diz
Schwartzman.
Segundo ele, porém, a "ausência de impacto
significativo sobre o atendimento à escola e mesmo
a ausência de controles eficazes de freqüência
não diminuem a importância do programa como política
de distribuição de renda".
ANTÔNIO GOIS
da Folha de S.Paulo
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