SALVADOR
(BA) - A menos de 100 quilômetros da capital, a superintendência
regional do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS)
"descobriu" recentemente uma comunidade de descendentes
de quilombolas que vive praticamente isolada e como se ainda
estivesse no século 19, quando a escravidão
foi abolida no Brasil.
Como a Canudos descrita por Euclides da Cunha na virada dos
séculos 19 e 20 no sertão da Bahia, as cerca
de 300 pessoas que habitam a região do povoado de Acupe,
no município de Santo Amaro da Purificação,
no Recôncavo Baiano (região que no passado concentrou
o maior número de engenhos de açúcar
do Estado) sobrevivem da agricultura de subsistência
e, eventualmente, vendem o pouco excedente de frutas, legumes
e hortaliças que produzem a moradores de Santo Amaro.
É um local em que o Estado brasileiro não se
faz presente, exatamente como ocorria na Canudos de Antonio
Conselheiro. Os quilombolas de Acupe não aparecem nos
registros oficiais do País, pois não possuem
documentos e foram contatados pela primeira vez pelo INSS
no início do mês durante uma visita da coordenadora
regional do Programa de Educação Previdenciária
Solange Dantas a Santo Amaro. "Estava ocorrendo uma feira
na cidade e havia um grupo de quilombolas que funcionários
da prefeitura nos apresentou", conta.
Ela conversou, entre outras, com uma senhora centenária
do grupo e se inteirou do quase que total alheamento da comunidade
ao mundo atual. "Eles não tem certidão
de nascimento, CPF, carteira de identidade, título
de eleitor; poucos possuem certidão de batismo que
não tem valor legal e títulos de terra",
contou, informando que os quilombolas não sabem da
existência de um instituto de seguro social no Brasil
e que muitos já poderiam estar recebendo aposentadorias.
O Programa de Educação Previdenciária
foi criado para tentar localizar e integrar no sistema os
cerca de 27 milhões de brasileiros que estão
fora dele. São trabalhadores informais, pescadores
e agricultores. "Os quilombolas se encaixam num tipo
de seguridade especial criada exatamente para não deixar
desamparados trabalhadores rurais que nunca pagaram o INSS,
mas que trabalharam durante todo a vida", explicou Solange.
Segundo ela, o instituto junto com a prefeitura de Santo
Amaro e o governo da Bahia vai promover uma espécie
de mutirão da legalidade na segunda quinzena de junho
para tirar os documentos de todos os moradores da comunidade
quilombola de Acupe e finalmente "trazê-los"
para o ano de 2005.
BIAGGIO TALENTO
da Agência Estado
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