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Os deslocamentos por transporte individual na região
metropolitana de São Paulo já superam os modos
coletivos, num fenômeno que cresce e atinge maiores
proporções principalmente nos municípios
do ABCD paulista.
Nessa área, que já se
consolida como símbolo da cultura do automóvel,
60,41% das viagens de seus moradores eram feitas em 2002 por
meios de transporte individuais. De toda a Grande São
Paulo, foi lá que, desde 1997, houve a maior elevação
desses deslocamentos -por carros, táxis, motos e bicicletas,
por exemplo.
Os resultados são da mais recente
pesquisa OD (Origem/Destino) do Metrô, com dados levantados
em 2002 e divulgados agora. Ela aponta que, na média
da região metropolitana, pela primeira vez desde 1967
a proporção de viagens individuais (52,96%)
ultrapassou as coletivas (47,04%).
No ABCD, esse cenário já
era uma realidade na pesquisa de 1997, quando 54,87% dos deslocamentos
eram feitos por transporte individual. Na capital paulista,
nesse intervalo de cinco anos, mesmo com a restrição
do rodízio de veículos (que proíbe a
circulação de 20% da frota diariamente), essas
viagens saltaram de 47,73% para 52,24% do total.
"É uma péssima
notícia, uma ameaça ao nosso futuro", afirmou
ontem Nazareno Stanislau Affonso, vice-presidente da ANTP
(Associação Nacional de Transportes Públicos),
em referência aos efeitos danosos dos automóveis
à qualidade de vida da população -que
incluem congestionamentos, acidentes e poluição.
Os dados que apontam um enfraquecimento
do transporte coletivo desanimaram os especialistas do setor
até mesmo porque, num espaço de cinco anos,
a evolução do transporte individual se aproximou
das previsões que chegaram a ser feitas para 2020.
No Pitu 2020 (plano feito em 1999
por Estado e prefeituras), estimava-se que os deslocamentos
por carro, motos, táxis e bicicletas atingiriam 54%
em duas décadas. "Nada me diz que a tendência
ao caos será revertida", afirma Epaminondas Duarte
Júnior, da Coordenadoria de Concepção
de Planos de Transportes do Metrô.
Problema metropolitano
Não é só a região do ABCD que
tem proporção de viagens individuais superior
à da capital paulista. A área nordeste da região
metropolitana (que abrange Guarulhos, Arujá e Santa
Isabel) já tem 54,06% de seus deslocamentos sustentados
nos carros, motos, táxis e bicicletas, seguida ainda
pela leste (Mogi das Cruzes, Poá e Suzano, entre outras),
com 54%.
Duarte Júnior destaca a preocupação
com municípios vizinhos porque, diferentemente da cidade
de São Paulo, não há neles nenhuma discussão
de desestímulo ao uso do carro. "Na capital, além
do rodízio, também há mais medidas de
priorização aos ônibus, que tiram faixas
dos carros", afirma.
Os dados também reforçam
os debates sobre a necessidade de políticas metropolitanas
de transporte -e não isoladas. "Sem uma integração
entre Estado e prefeituras, todas as soluções
serão apenas paliativas", afirma Cláudio
de Senna Frederico, ex-secretário dos Transportes Metropolitanos.
"Mas seria um contra-senso pensar
numa restrição aos carros no berço da
indústria automobilística", diz Epeus Pinto
Monteiro, superintendente da EPT (Empresa Pública de
Transportes) de Santo André, refletindo a forma como
a região -que teve sua economia alavancada pelas montadoras-
encara a possibilidade de "punir" os automóveis.
"Não é deficiência
dos coletivos. A tendência natural é todo mundo
querer ter seu carro próprio", diz Renato Maués,
coordenador de infra-estrutura do Consórcio Intermunicipal
do Grande ABC.
"Esperamos que esses dados acendam
a luz vermelha no foco dos futuros investimentos do Estado",
diz Eurico Leite, secretário que cuida dos projetos
especiais de São Bernardo do Campo, cobrando a ampliação
de metrô.
A pesquisa OD, que fez 20 mil entrevistas
(com margem de erro geral de dois pontos percentuais), também
indica evolução de participação
de motos e lotações entre os modos de transporte,
mas ainda distantes de automóveis e ônibus. As
viagens por motos, que representavam 0,71% do total em 1997,
saltaram para 1,70%. As de lotações, de 0,97%,
para 2,58%.
ALENCAR IZIDORO
da Folha de S. Paulo
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