É uma maternidade pública,
mas não tem um único obstetra e ninguém
reclama. Só existem enfermeiras, e todos os partos,
sempre bem-sucedidos, são naturais.
A casa de partos faz parte de um projeto de saúde da
família que, iniciado no final da década de
90 pela Fundação Zerbini, da Universidade de
São Paulo, transformou a empobrecida Sapopemba, um
distrito com 250 mil pessoas na zona leste, num bairro-laboratório.
Não há notícia de nenhum outro lugar
no Brasil que concentre tantos testes de medicina preventiva.
As parteiras públicas são viáveis porque
as mães, ainda no início da gravidez, passam
por seguidos exames. Aquelas que apresentam riscos de sofrer
complicações são encaminhadas a maternidades
normais.
Nesse bairro-laboratório, o ideal perseguido é
que as pessoas possam se cuidar no próprio bairro,
de preferência indo ao médico a pé. Ou
nem mesmo saindo de casa. Para isso, está sendo montada
uma rede articulada composta pelos mais diferentes tipos de
atendimento, dos mais simples aos mais complexos.
O passo inicial é a presença de agentes comunitários,
que, apoiados por médicos, visitam as casas. A partir
daí, encaminha-se a pessoa a um centro de saúde,
a um ambulatório ou a um hospital regional. Apenas
em último caso, esgotados todos os recursos locais,
a pessoa receberia um tratamento mais complexo em algum hospital
mais distante.
Por isso, no próximo mês, será inaugurada,
em Sapopemba, mais uma experiência para reter o paciente
no bairro: um pequeno hospital de apenas 50 leitos com 12
especialidades e apto a realizar pequenas cirurgias.
Como os indicadores de saúde estão melhorando
rapidamente - a começar da mortalidade infantil-, o
próximo passo é instalar em Sapopemba uma unidade
de pesquisas da USP, uma espécie de campus avançado,
para formar médicos e enfermeiros em saúde da
família. "Já vimos que isso funciona",
garante o responsável pelo lançamento dessa
experiência em Sapopemba, Adib Jatene, ex-ministro da
Saúde e professor aposentado da USP, que teve de enfrentar
duras críticas de muitos médicos por causa da
casa de partos. "Basta ir lá e verificar que não
existe risco."
Aliás, ele próprio é um exemplo: Jatene
nasceu na floresta amazônica nas mãos de uma
parteira pobre e analfabeta.
Coluna originalmente publicada na
Folha de S. Paulo, na editoria Cotidiano.
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