Nesta quarta-feira
de cinzas, o sambódromo está vazio e silencioso;
e assim deveria ficar até o próximo Carnaval,
sem utilidade, à espera dos desfiles. A solidão
está com os dias contados: prepara-se uma experiência
para mantê-lo ocupado sempre. Até mesmo com ensaios
de música erudita. "É um ótimo lugar
para caçar talentos musicais", diz o pianista
João Carlos Martins, reconhecido mundialmente por suas
interpretações de Bach.
Depois de perder o movimento das duas mãos, Martins
começou a estudar regência e voltou a viajar
pelo mundo, desta vez como maestro. Os dedos, todos tortos,
ainda se prestam, porém, a agarrar as baquetas e se
preparam para reger no sambódromo. A idéia é
atrair e desenvolver talentos para a música erudita
entre alunos de escolas públicas e transformá-los
em profissionais. Bancado com recursos privados, o projeto
prevê a manutenção de uma orquestra permanente
no sambódromo, onde existem dezenas de salas para ensaios.
Dividir espaço entre samba e uma orquestra sinfônica
pode, para muitos, ser uma péssima combinação
musical. Mas talvez se preste como um arranjo educacional.
O prefeito José Serra determinou a seus secretários
que transformassem o sambódromo, tão pouco usado,
num espaço cultural e esportivo entregue para as escolas
municipais e estaduais da região. "Em nosso primeiro
levantamento, descobrimos que pelo menos 5.000 estudantes,
apenas de escolas municipais, poderiam chegar a pé
ao sambódromo", diz José Aristodemo Pinotti,
secretário municipal da Educação.
Além do Anhembi, administrador do sambódromo,
e da Secretaria da Educação, estão envolvidas
no projeto as Secretarias Municipais da Cultura, Esportes
e Assistência Social. Buscam-se também atividades
bancadas pela comunidade, como a orquestra dirigida por João
Carlos Martins ou as aulas do coreógrafo Ivaldo Bertazzo,
que desenvolve programas de arte-educação pela
dança. "Não precisamos construir nada,
apenas precisamos preencher o espaço já disponível
sem uso, oferecendo atividades para os estudantes antes ou
depois da escola", diz Pinotti. Esses alunos teriam,
portanto, uma espécie de escola integral, dividida
entre a sala de aula e a comunidade.
O grande projeto ali, porém, é mesmo o samba.
Há uma série de blocos nas imediações
e se imagina fazer do sambódromo um espaço permanente
para o aprendizado das mais diversas atividades voltadas ao
Carnaval. Se conseguirem colocar mesmo essa idéia para
desfilar, fazendo do sambódromo uma escola do prazer,
a cidade terá produzido um enredo e tanto para seduzir
crianças e jovens para o aprendizado
Coluna originalmente
publicada na Folha de S. Paulo, na editoria
Cotidiano.
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