Rubens
Matuck aplica folha de ouro sobre a madeira e desenha, por
cima, as árvores que já plantou em São
Paulo
O artista plástico Rubens Matuck está conseguindo
transformar lixo em ouro -e aqui não se trata de nenhuma
figura de linguagem ou misterioso projeto de um alquimista.
Ele percorre as ruas em busca de madeiras jogadas nos entulhos.
Depois de tratá-las, aplica em sua superfície
folha de ouro. Deixa secar e, enfim, desenha em cima árvores.
Não qualquer árvore. Só aquelas que ele
plantou na cidade de São Paulo. "Minha paixão,
desde menino, é plantar."
Essa paixão acabou germinando uma confraria paulistana
que sai pelas ruas, nos finais de semana, plantando -um grupo
que envolve zeladores, faxineiros, garçons e cozinheiros.
O prazer de Matuck com a flora é tão grande
que, nas suas viagens pelo Brasil, ele vai registrando o que
vê em cadernos. Ao todo, já montou uma coleção
com mais de 300 desses cadernos, empilhados em seu ateliê-estufa.
É um espaço que mistura suas obras e a criação
de mudas.
As mudas criadas no ateliê-estufa são espalhadas
entre os integrantes da confraria que, sozinhos ou em grupo,
procuram espaços para o plantio. "Tem gente que
trabalha em bar que ajuda a produzir adubo com pó de
café."
Já perdeu a conta de quantas plantou. "Talvez
mais do que cinco mil." Com o tempo e estudo, aprendeu
quais as espécies melhor se adaptavam na cidade.
A confraria acabou ganhando ramificações. Pessoas
de outras partes do Brasil passaram a trocar mudas com Matuck.
"No rastro das trocas, vieram novas amizades e novos
parceiros. Sinto-me, sem exagero, apenas uma das sementes."
Veio, então, a ideia de fazer um projeto mais radicalmente
natural.
Matuck percorreu os entulhos atrás das madeiras descartadas
para serem usadas em suas obras -e, aí, decidiu aplicar
a folha de ouro para ver o que acontecia. Gostou e decidiu
fazer uma coleção.
Natural, portanto, que Matuck escolhesse para expor sua obra
um espaço em que artistas façam da rua, ao mesmo
tempo, inspiração e galeria -preferiu uma galeria
tomada por grafiteiros. "Pintar e plantar são,
para mim, quase uma mesma coisa."
O que significa que São Paulo não é apenas
uma cidade, mas uma espécie de tela viva. Quando anda
pelas ruas, sente-se como se estivesse em quadros que sempre
mudam.
PS- Coloquei neste
link uma seleção das obras de Matuck, expostas
no Choque Cultural -aliás, essa galeria é hoje
uma das estufas dos artistas, muitos deles grafiteiros, que
fazem da rua sua inspiração e paisagem. Baixo
Ribeiro, criador da Choque Cultural, é um dos responsáveis
pela disseminação, no mundo, da arte de rua
brasileira.
Coluna originalmente publicada na
Folha Online, editoria Pensata.
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