Para Antônio Erivaldo Silva,
o Toninho, andar de ônibus é, ao mesmo tempo,
uma fonte de renda e um hobby. Sentado na cadeira de cobrador,
ele ganha seu sustento, mas também é dali que,
câmara à mão, faz aquilo de que mais gosta:
tirar fotos. "Juntei duas paixões: fotografar
e andar por São Paulo", diz Toninho, um migrante
cearense nascido na cidade do Crato. No início do ano
passado, conseguiu comprar uma câmara digital.
Na linha em que trabalha, ele passa três vezes por dia
em lugares como o Museu do Ipiranga, a praça da Sé,
o Pátio do Colégio, o viaduto do Chá,
a praça da República, o Teatro Municipal. Para
muitos, são apenas paradas; para Toninho, são
cenários.
Cada trajeto leva aproximadamente uma hora e 40 minutos. Não
há, na cidade, nenhum fotógrafo que gaste tanto
tempo todos os dias à procura de flagrantes.
Era natural que estivesse assistindo, em movimento, à
chegada dos policiais ao local onde estavam os corpos dos
mendigos assassinados, quase todos seus conhecidos a distância.
"Eu via essas pessoas quase todos os dias, já
tinha até tirado foto delas."
Mas não é atraído apenas pelas cenas
fortes do estresse paulistano, com seus ziguezagues de motoqueiros,
atropelamentos, congestionamentos, polícia correndo
atrás de marginal, meninos se drogando. Também
é seduzido pelos detalhes arquitetônicos de prédios
históricos e pelos diferentes efeitos da luz refletida
nos edifícios ou viadutos ao nascer do sol. "Presto
atenção às crianças brincando,
aos casais namorando, aos velhos vendo o tempo passar."
Como o trajeto passa pelos mais importantes pontos culturais
e históricos da cidade, Toninho decidiu aprimorar seu
olhar -mais uma vez, ajudado pelos recursos digitais. Comprou
livros sobre a história de São Paulo. "Foi
aí que decidi tornar público meu trabalho."
Para expor os flagrantes paulistanos, ele montou um blog,
enriquecido com um roteiro que mostra a história da
cidade a partir de seu trajeto de ônibus. Ele chega
a misturar reportagem com aula de história. Na entrada
do blog, por exemplo, é exibido um homem atropelado
estendido no chão. Acompanha texto sobre a história
daquela rua. Apenas os amigos e alguns passageiros acessam
a página, hoje seu maior motivo de orgulho. Os recursos
da virtualidade fizeram com que o migrante encontrasse seu
melhor endereço: http://fotolog.terra.com.br/toninho.
Coluna originalmente publicada na
Folha de S.Paulo,
na editoria Cotidiano.
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