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Imagens da infância fizeram com que Geraldo Rangel,
passeando pela avenida São João, onde morou
quando era criança, cruzasse a rua em direção
ao chafariz da praça Júlio de Mesquita à
procura de lagostas de bronze. "Foi uma decepção",
conta. As lagostas, fixadas na memória do menino, tinham
sido arrancadas.
Decepção compreensível.
Ele é um dos últimos paulistanos de classe média
que, na infância, brincavam no centro. Praças,
para ele, não eram cenários ameaçadores,
mas locais de brincadeira. Geraldo morava na avenida São
João e tinha um avô que vivia na praça
da Sé. Acompanhava os pais nos então charmosos
cinemas e descobria curiosidades na "feira hippie"
da praça da República. As lagostas do chafariz
faziam parte de seus trajetos.
De volta a seu gabinete, com as lagostas
na cabeça, decidiu reagir. Começou a preparar
uma ação, a ser lançada depois do Carnaval,
para exigir da prefeitura que cuide melhor dos monumentos
da cidade. Ação seria apenas um desabafo nostálgico
de um cidadão inconformado, desses que povoam a cidade,
se Geraldo Rangel não fosse promotor estadual do Meio
Ambiente. "É inacreditável o número
de monumentos jogados às traças."
Geraldo, para quem zelar pela cidade
é uma questão não apenas de nostalgia
mas de obrigação profissional, está metido
em algumas das polêmicas que envolvem São Paulo.
Conseguiu evitar o início do processo de despoluição
do rio Pinheiros, prestes a entrar em teste, exigindo estudos
mais detalhados. Isso o levou a ser acusado por gente do governo,
mais especificamente do PSDB, de estar a serviço do
PT. "Estou a serviço do que diz a lei", defende-se.
Resolveu atacar um dos novos cartões-postais
paulistanos, o show de jatos e luzes do lago do parque Ibirapuera.
Por causa das suspeitas de que aquela mistura de jatos e água
poluída poderia espalhar doenças entre os espectadores,
pediu a especialistas que elaborassem um laudo sobre o assunto.
Dessa vez, foram funcionários da prefeitura petista
que o acusaram de "radical". "Infelizmente,
as pessoas ainda não entendem o papel de um promotor",
afirma.
Assim como conseguiu deter as obras
de despoluição do rio Pinheiros -e, depois,
aceitou negociar a sua retomada se os testes fossem acompanhados
de estudos de impacto ambiental-, ele promete lutar para suspender
o show se houver risco à saúde pública,
o que certamente vai dar bem mais trabalho à prefeitura
do que devolver as lagostas ao chafariz.
Coluna originalmente publicada na Folha de S. Paulo,
na editoria Cotidiano.
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