"Este
é o meu ano de sorte!", entusiasma-se Iramar Alves
da Cruz, de 42 anos. Costureira da cooperativa da Fernão
Cardin, em Pilares (Zona Norte carioca), ela não conteve
a emoção ao ver peças que confeccionou
para a etiqueta FAZ PAZ em exposição no Fashion
Rio. A participação no mega evento de moda no
Museu de Arte Moderna, realizado entre os dias 25 e 30 de
junho, aconteceu graças a uma parceria inovadora que
recentemente começou a se costurar: cooperativas de
comunidades de baixa renda executaram as idéias de
onze estilistas das mais badaladas grifes brasileiras exclusivamente
para o projeto Comércio Solidário, do Viva Rio.
O lançamento da marca FAZ PAZ inaugurou uma nova
etapa projeto, que é desenvolvido há três
anos. "Decidimos enfocar um público-alvo novo,
que esteja buscando produtos diferenciados onde o trabalho
das cooperativas possa ser valorizado. Com o desenvolvimento
de roupas mais sofisticadas e a assinatura de designers, queremos
atingir um público classe A e, com isso, conseguir
preços melhores", explica Marta Ramos, coordenadora
do projeto.
No exterior, o fair trade (comércio justo) tem se
voltado para o desenvolvimento de produtos diferenciados,
já que é difícil competir com os preços
praticados pelas grandes empresas. "As cooperativas são
pequenas organizações, não conseguem
comprar matéria-prima em quantidades grandes como a
indústria e não têm a mesma produtividade.
Conseqüentemente, o preço justo para a indústria
é injusto para as cooperativas", explica Marta.
"Hoje trabalhamos muito abaixo de nossa capacidade total.
Os clientes que normalmente atendemos impõem preços
muito baixos e exigem um alto padrão de qualidade.
Sabemos que nosso trabalho vale mais, mas acabamos aceitando
porque precisamos trabalhar", explica a costureira Angélica
Alves de Oliveira, de 25 anos. Solteira e mãe de quatro
filhos, ela também integra a cooperativa da Fernão
Cardin. Por sinal, coube a ela e a suas colegas executarem
o corte e a montagem das roupas desenhadas por Andréa
Marques, da grife Maria Bonita Extra.
Apesar da mostra no Fashion Rio, as roupas ainda não
estão à venda. Os pedidos em atacado só
começarão a ser feitos em agosto, com a inauguração
de um showroom na sede do Viva Rio, na Glória (Zona
Sul).
Coleções temáticas
A ponte que ligou o sofisticado mundo da moda e as
cooperativas foi feita voluntariamente pela consultora de
marketing e estilo Luiza Bomery: "Há muito tempo
desejava participar de um trabalho social com moda. Conheci
os projetos de comércio solidário e, junto à
equipe do Viva Rio, concluí que era preciso criar peças
que refletissem as principais bandeiras desta ONG". Foram
então escolhidos os temas Paz, Preservação
da Natureza, Favela, Desarmamento, Amor, Carnaval, Não
à Fome, Não à Violência e Não
à Dengue. "Para elaborar roupas e acessórios
que divulgassem estas mensagens e ao mesmo tempo estivessem
afinadas com as últimas tendências, convidamos
alguns dos melhores designers do meio", conta Luiza.
Cada estilista elaborou de cinco a dez peças com o
mesmo tema - as coleções incluem camisetas,
saias, vestidos, casacos, roupas infantis e acessórios.
A partir daí, foi confeccionado um mostruário,
num primeiro passo para dar uma nova cara para os produtos
das cooperativas capacitadas pelo projeto.
Artistas solidários
A exposição já começou
a render mais parcerias e adesões. Alguns estilistas
já se ofereceram para desenvolver novos designs e a
cenografia do showroom no Viva Rio será feita pela
diretora teatral Bia Lessa. Já Alexandre Aquino, diretor
executivo da marca Maria Bonita, elaborou o planejamento estratégico
e a viabilidade financeira do projeto. Entre os Gestores Estratégicos
do Viva Rio estão André Midani e Cristian Nach,
que junto com Rubem César Fernandes, coordenador geral
do Viva Rio, são os principais idealizadores desta
proposta diferenciada e mais humana de comercialização.
A previsão é que a etiqueta FAZ PAZ seja auto-sustentável
em um prazo de três anos com investimentos e a abertura
de sete lojas no Rio, incluindo o showroom.
Geração de renda
O mostruário exibido na sala vip do Viva Rio
no MAM foi produzido somente por três das catorze cooperativas
capacitadas pelo projeto. Fora as costureiras de Pilares,
as de Santa Cruz (Zona Oeste) e de Macaé (Norte Fluminense)
também colocaram mãos aos modelos. Marta Ramos
acredita que a partir de agosto, quando os pedidos começarem
a chegar, a produção deve atingir muito mais
mulheres. "Este trabalho prova para nós mesmas
que temos capacidade de fazer coisas maiores e nos dá
uma injeção de otimismo", emociona-se Angélica.
A parceria ainda possibilita que as cooperativas não
fiquem limitadas à execução de serviços
muito específicos, como a confecção apenas
de parte de uma peça. "Há um resgate da
integridade da costureira que acompanha todas as etapas da
produção e passa a ter um carinho especial com
aquilo que está fazendo. O sucesso de um barracão
de escola de samba, por exemplo, está no desfile, quando
todos vêem o resultado de seus esforços individuais",
analisa Diva Achui, responsável pela capacitação
das cooperativas no projeto. Capacitação essa
iniciada há três anos.
Santa Marta
Outro objetivo do Comércio Solidário
é ensinar às cooperadas a planejarem seus custos
e a negociarem com os clientes, o que só é possível
na medida em que as costureiras se sintam seguras da qualidade
de seu trabalho. "As costureiras que estão nas
cooperativas são artesãs, amam o que fazem e
têm sensibilidade para lidar com detalhes e acabamentos
delicados. Elas são capazes de produzir com um alto
padrão de qualidade. Mas para alcançar este
nível, precisam de experiência. Daí a
importância de criar uma demanda constante, quanto mais
elas fizerem, maior domínio terão sobre o processo
e os custos de produção", explica Diva.
No que depender do empenho das costureiras, não há
dúvidas de que a etiqueta FAZ PAZ será um sucesso.
"Ficou perfeita! É maravilhoso ver um trabalho
em um evento chique", baba Iramar, diante de uma das
peças que confeccionou. "Agora vejo como valeu
a pena me empenhar mesmo estando de resguardo e com o meu
filho tão pequeno", acrescenta, na companhia do
pequeno Claudionor Júnior, seu bebê de dois meses
MARIANA LEAL
do site Beleza Pura
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