O Ministério
da Saúde vai relativizar a importância do auto-exame
da mama e priorizar o exame clínico e a mamografia
como forma de prevenir o câncer mamário, o que
mais mata as brasileiras.
As medidas constam de um consenso que vai nortear a política
nacional para o controle do câncer da mama, que o ministro
da Saúde, Humberto Costa, e o Inca (Instituto Nacional
de Câncer) lançam hoje no Rio. É a primeira
vez que será estabelecida uma política de prevenção
no país, que pretende reduzir em 20% a taxa da mortalidade.
Até agora, campanhas de prevenção financiadas
pelo governo sempre defenderam que o auto-exame era o principal
aliado no combate à doença.
A nova proposta é que todas as mulheres acima de 50
anos façam a mamografia a cada dois anos e se submetam
a exame clínico anualmente. As que tenham histórico
familiar da doença devem fazer a mamografia todos os
anos, a partir dos 35 anos. Para isso o ministério
deve anunciar a compra de mais mamógrafos. Hoje, apenas
9% dos municípios brasileiros possuem o aparelho.
Em São Paulo, por exemplo, as mulheres chegam a esperar
quase um ano para a realização do exame radiológico
das mamas.
O documento foi baseado em duas pesquisas recentes, feitas
com 387 mil mulheres na Rússia e na China, financiadas
pela OMS (Organização Mundial da Saúde)
e pelo Instituto Nacional do Câncer dos EUA, respectivamente,
que revelam a ineficácia do auto-exame para diminuir
a mortalidade por câncer da mama.
Segundo Ezio Novais, presidente da Sociedade Brasileira de
Mastologia e que participou da elaboração do
consenso, há um entendimento internacional de que a
mamografia é o único exame que consegue prevenir
as mortes por câncer da mama.
Até 30% dos casos registrados nos principais serviços
de oncologia brasileiros são referentes a tumores não-detectáveis
na apalpação feita pela paciente ou no exame
clínico. Nesses casos, só mesmo a mamografia
é que vai identificar o câncer, diminuindo em
até 30% as chances de mortalidade.
Dados do Inca de 2003 indicaram 9.335 óbitos pela
doença e o surgimento de 41.610 casos.
Segundo Novais, o auto-exame continuará sendo estimulado
por três razões: pode detectar o câncer
em mulheres fora da faixa etária de risco (acima dos
50 anos), descobrir outras doenças benignas da mama
(mas que precisam de tratamento) e ajudar mulheres que não
têm acesso ao serviço de saúde a descobrir
os tumores, ainda que em fase mais avançada.
No auto-exame, são detectados nódulos de 1,5
cm a 2 cm. Já a mamografia pode diagnosticar tumores
malignos com só 1 mm, quando as chances de cura são
de 95%. "Claro que o ideal seria indicar a mamografia
a todas as mulheres. Mas, tratando-se de países do
Terceiro Mundo, isso é impossível." Cada
mamógrafo custa, em média, US$ 150 mil.
Segundo o mastologista José Luiz Bevilacqua, do Hospital
Sírio Libanês, além de mostrar a ineficácia
para combater as mortes, os estudos revelam que o estímulo
ao auto-exame leva a um aumento do número de biopsias
desnecessárias e provoca ansiedade, depressão
e medo nas mulheres.
"Não podemos mais dar informações
distorcidas ou incompletas à sociedade sobre os métodos
ineficazes de prevenção de câncer, como
o auto-exame", afirma.
Para ele, o ministério deveria reavaliar a indicação
da mamografia apenas da faixa etária acima de 50 anos
porque há Estados, como o de São Paulo, em que
o pico de incidência se dá antes, entre os 40
e os 49 anos.
CLÁUDIA COLLUCCI
da Folha de S.Paulo
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