BRASÍLIA.
Os primeiros meses de execução orçamentária
já demonstram que o governo este ano terá grandes
dificuldades para alcançar o superávit de 4,25%
do Produto Interno Bruto (PIB) nas contas públicas,
devido aos gastos adicionais que pressionam o Orçamento,
à falta de espaço para fazer novos cortes nas
despesas de investimentos e à rejeição
da sociedade a qualquer aumento da carga tributária.
Esta é a conclusão de um estudo do economista
Raul Velloso, especialista em contas públicas, que
aponta os grandes desafios do ministro da Fazenda, Antonio
Palocci, para manter as contas equilibradas em 2004.
Nos últimos dias, o governo anunciou a liberação
de R$ 4 bilhões para fazer frente a pressões
salariais dos funcionários públicos (que receberam
reajustes acima da inflação), acelerar a reforma
agrária, reforçar os investimentos e atender
políticos que reivindicavam recursos para suas emendas
parlamentares.
Gastar melhor
Mesmo com todas essas despesas, o Ministério da
Fazenda permanece com a convicção de que cumprirá
a meta de superávit deste ano. Segundo o secretário
do Tesouro, Joaquim Levy, os recursos anunciados nos últimos
dias já estavam previstos no Orçamento e não
representam gastos adicionais:
"Pressões existem em qualquer governo. Temos
que fazer o melhor possível dentro do que cabe no Orçamento.
Se não podemos gastar mais, vamos gastar melhor".
Mas, para Velloso, a equipe econômica está diante
de um difícil desafio para atingir a meta. Ele lembra
que o superávit de 4,25% do PIB, obtido em 2003 como
resultado de um ajuste fiscal vigoroso, tornou-se piso para
as contas em 2004. Portanto, não há como justificar
um resultado menor este ano, devido aos gastos adicionais,
sem que o governo passe ao mercado a impressão de que
está havendo descontrole nas contas públicas.
"O desafio do ministro Palocci é repetir o superávit
elevado de 4,25% nas contas públicas em um ano muito
mais difícil do ponto de vista fiscal", afirmou
Velloso.
Reajuste do mínimo
As dificuldades decorrem de um conjunto de fatores que
não pressionaram o Orçamento em 2003 e, agora,
tornam ainda mais difícil atingir a meta. Por exemplo,
os reajustes do salário-mínimo e dos aposentados
do INSS pela inflação passada, que se elevou
em 2003. O impacto desses reajustes se refletirá no
Orçamento de 2004, principalmente no segundo semestre.
Velloso menciona também como fatores de pressão
os gastos adicionais decorrentes do novo Estatuto dos Idosos
(que ampliou os benefícios previstos na Lei Orgânica
da Assistência Social) e a dívida do governo
com os aposentados do INSS — que ganharam na Justiça
uma correção relativa a planos econômicos
passados — ainda não incorporada aos benefícios.
Esse novo esqueleto é uma conta gigante de R$ 7 bilhões,
ressalta Velloso, que terá de ser incorporada ao Orçamento
num prazo provável de três anos.
Além disso, as estatais não devem apresentar
resultados tão satisfatórios como no ano passado,
por causa do pagamento de dividendos. O efeito do lucro histórico
da Petrobras em 2003 já apareceu nas contas do primeiro
bimestre. Isso porque o lucro foi computado no ano passado
e os dividendos estão sendo pagos este ano, reduzindo
a contribuição das estatais para o superávit
neste ano.
O economista lembra que a pressão por investimentos
tende a aumentar dentro do governo, porque esse gasto atingiu,
no ano passado, o nível mais baixo da década.
Foram destinados apenas 0,4% do PIB para investimentos em
2003, a metade do registrado em 1995. Para este ano, o Congresso
aprovou despesas equivalentes a 0,7% do PIB e o governo reduziu
esse patamar para 0,5% com o contingenciamento de recursos
efetuado em fevereiro.
"São pressões fortes e legítimas
e demonstram que não há espaço para novos
cortes nessa área", afirma o economista.
REGINA ALVAREZ
do jornal O Globo
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