A Comissão
de Constituição e Justiça da Câmara
aprovou ontem, em votação simbólica,
projeto de lei que permite que a indústria nacional
fabrique matéria-prima e medicamentos para prevenção
e tratamento da Aids sem pagar royalties aos detentores da
patente, geralmente de laboratórios multinacionais.
A proposta agora vai ao Senado. Se aprovada na Casa, precisará
ainda ser sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula
da Silva.
Enquanto o coordenador nacional de DST/Aids do Ministério
da Saúde, Pedro Chequer, comemorou, a Febrafarma (federação
das indústrias farmacêuticas) classificou o projeto
de "retrocesso".
A Interfarma (Associação da Indústria
Farmacêutica de Pesquisa) diz que o projeto, além
de não trazer resultados esperados, como reduzir preços,
viola acordos internacionais. Por isso, a entidade pretende
trabalhar para que a proposta não passe no Senado.
A aprovação acontece no momento em que o Ministério
da Saúde é pressionado por ONGs para quebrar
a patente de três medicamentos, que respondem por cerca
de 70% dos gastos da União com drogas contra a doença.
A pressão das ONGs ocorre porque o Brasil negocia com
laboratórios a obtenção da licença
voluntária para essas três drogas. Esse tipo
de licença resultaria em colaboração
do laboratório na cessão de tecnologia dos produtos.
"Acho, pessoalmente, que [a licença voluntária]
é uma falácia. Porque o governo vem negociando
há mais de um ano e fica uma discussão eterna,
infinita. Só faz postergar a capacitação
da indústria nacional", diz Chequer.
Ele se referia à qualificação da indústria
brasileira para produzir matéria-prima e medicamentos
mais novos e caros. Segundo o coordenador, o país teria
como produzir, em um ano, esses remédios negociados
pelo governo.
O presidente-executivo da Interfarma, Gabriel Tannus, discorda.
"O Brasil ainda não tem tecnologia para isso.
E temos que olhar também a qualidade do que será
produzido", disse.
A mudança
O texto aprovado ontem na Câmara modifica a Lei de Patentes
(nº 9.279/1996). Inclui no artigo que trata de não-patenteáveis
remédios contra a Aids e matérias-primas para
produzi-los. "A Câmara ter aprovado o projeto indica
que o país pode caminhar para viabilizar a produção
nacional", disse o deputado Roberto Gouveia (PT-SP),
autor da proposta.
Médico, Gouveia usou como argumento para apresentar
o projeto o fato de que os gastos do governo federal com anti-retrovirais
vêm crescendo a cada ano, inclusive devido aos preços
praticados pelos fabricantes.
Neste ano, a União tem verba que chegará a R$
950 milhões para medicamentos do coquetel. Cerca de
150 mil pacientes recebem o coquetel gratuitamente.
LUCIANA CONSTANTINO
da Folha de S.Paulo
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