Prevista
na Constituição de 1988, a autonomia universitária
só neste ano deve começar a ser colocada em
prática, graças ao projeto de reforma que o
governo pretende finalizar até novembro.
Após uma série de debates com acadêmicos
e entidades, entre maio e setembro, o governo federal definirá
um novo papel para as instituições, dando ênfase
ao maior acesso às universidades e à melhoria
do ensino.
Além da autonomia, as discussões sobre a reforma
universitária incluem temas como o papel das instituições
públicas e privadas, o gerenciamento e o financiamento
das públicas, o acesso e a permanência de alunos,
os programas e conteúdos dos cursos e a avaliação
do ensino.
Com a reforma, após 16 anos do estabelecimento legal
da autonomia universitária, as instituições
brasileiras devem conseguir, na prática, decidir sobre
seus cursos e currículos, estabelecer políticas
gerais de administração e gerenciar os recursos
financeiros. Em contrapartida, terão de prestar contas
à sociedade.
Entidades ligadas ao ensino superior, acadêmicos e
governo federal concordam que a autonomia financeira, administrativa
e didático-pedagógica é importante e
deve ser implementada.
Como não existe autonomia sem os recursos necessários
para manutenção e investimento, a divergência
de opiniões surge quando se fala do financiamento das
universidades federais.
Há sugestões, como a da Andifes (Associação
Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais
de Ensino Superior), que prevêem o repasse de um percentual
anual de recursos do governo para as federais. A definição
de como e em que gastar os recursos ficaria a cargo da universidade.
"A atual gestão das universidades federais está
dentro de um modelo burocrático e hierárquico,
que não tem como funcionar a contento, posto que o
Estado não é capaz de controlar tantas coisas",
aponta Ricardo Musse, professor de sociologia na USP e um
dos integrantes do Fórum de Políticas Públicas,
que tem reunido intelectuais para o debate da reforma universitária.
Para o grupo da USP, a autonomia precisa vir acompanhada do
fortalecimento dos mecanismos de democratização
da gestão universitária.
Captação
Para a Andifes, além dos recursos do governo, haveria
a possibilidade de captação de verba por meio
de cooperação financeira com entidades privadas
e públicas. Hoje essa possibilidade existe por meio
das fundações de apoio, que não têm
orçamento vinculado ao da instituição.
O uso do recurso seria decidido pela universidade. "Só
autonomia para buscar recursos não resolve", diz
o vice-presidente da Andifes, José Fernandes de Lima.
O Andes (Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições
de Ensino Superior) faz ressalvas à captação
de verba, defendendo algum tipo de controle social.
Para o presidente do sindicato, Luiz Carlos Lucas, a busca
da verba precisa ser voltada para a política que a
universidade definir. "Não se pode permitir que
pesquisas com recursos de empresas, por exemplo, sejam voltadas
apenas aos financiadores, sem estar à disposição
da sociedade."
As duas instituições e o Ministério
da Educação concordam que o sistema público
deve continuar gratuito. E que a autonomia implica aumento
de recursos destinados pelo governo ao setor.
"Não adianta fazer reforma se não houver
mais recursos", diz Nelson Maculan, secretário
de Educação Superior do MEC.
Para o deputado federal Eduardo Valverde (PT-RO), a decisão
sobre a gratuidade do ensino deve caber também a cada
instituição. "Um país onde nem todos
têm acesso ao ensino fundamental não pode se
dar ao luxo de garantir gratuidade no superior", diz
Valverde, autor do projeto de lei que institui a Lei Orgânica
da Autonomia Universitária.
"Enquanto boa parte das universidades reivindica autonomia
de gestão financeira, o que pressupõe, nas públicas,
um Estado que as financie, o oferecido é diferente.
É a autonomia para "se virar". Aquela para
captação de recursos para complementação
dos minguados orçamentos governamentais", disse
a professora Deise Mancebo, coordenadora do grupo de trabalho
de política da educação superior da Anped
(Associação Nacional de Pós-Graduação
e Pesquisa em Educação).
LUCIANA CONSTANTINO
FERNANDA MENA
da Folha de S. Paulo
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