O presidente
Luiz Inácio Lula da Silva decidiu ontem sancionar a
nova Lei de Falências e manter o artigo do texto que
pode facilitar uma solução para o caso Varig.
Havia semanas que Lula e seus principais ministros discutiam
com o vice-presidente e ministro da Defesa, José Alencar,
a possibilidade de vetar um artigo da lei para tirar da empresa
aérea a possibilidade de usar os benefícios
da nova lei para negociar uma dívida de cerca de R$
7 bilhões.
A decisão, tomada em reunião ontem no Palácio
do Planalto, foi uma vitória de Alencar e uma derrota
dos ministros José Dirceu (Casa Civil) e Antonio Palocci
Filho (Fazenda). Alencar argumentou que o veto ao artigo que
inclui as aéreas entre as afetadas pela nova lei equivaleria
a uma decretação de falência da Varig
e dificultaria a compra da empresa por um grupo privado.
Segundo a Folha apurou, Alencar disse que essa solução
acabaria reforçando o caminho de estatização
da Varig e afugentaria eventuais grupos privados interessados
em comprá-la. O vice argumentou que o governo acabaria
aumentando um problema já grave. Lula sinalizou simpatia
pela argumentação de Alencar.
O benefício, em tese, também pode contemplar
outras empresas do setor, como a Vasp -o governo, porém,
é cético quanto às possibilidades de
recuperação desta última, em grave crise.
Logo que a lei foi aprovada pelo Congresso, no final de 2004,
depois de 11 anos de tramitação, o Planalto
se inclinou pela sanção integral. Dirceu e Palocci,
porém, pressionaram pelo veto, por temer que a nova
Lei de Falências seja incapaz de solucionar o problema
do setor aéreo. Até a semana passada, a tendência
era pelo veto, devido às restrições dos
dois ministros, que cederam ontem.
Pesou ainda a alegação de Alencar de que um
veto poderia reduzir a repercussão do impacto positivo
da nova lei, reduzindo a sanção a uma discussão
sobre beneficiar ou não o setor aéreo.
A reunião, que durou cerca de duas horas, contou com
a presença de Lula, Alencar, Dirceu, Palocci e dos
ministros Luiz Gushiken (Comunicação de Governo),
Jaques Wagner (Conselho de Desenvolvimento Econômico
e Social) e Álvaro Ribeiro da Costa (Advocacia Geral
da União).
Artigo da discórdia
O artigo que dividiu o governo da tramitação
do projeto no Congresso até ontem é o de número
199 -o antepenúltimo do texto. Ele permite que as companhias
aéreas entrem em recuperação judicial,
o mecanismo que, dentro de 120 dias, substituirá a
atual concordata. Segundo o Código Brasileiro de Aeronáutica,
de 1986, as empresas do setor não podem pedir concordata.
A recuperação judicial tem o objetivo de preservar
empresas consideradas viáveis, mas em dificuldades.
Seus defensores argumentam que a concordata, nos moldes atuais,
é incapaz, na maioria dos casos, de evitar a falência
e o fim da empresa.
Segundo a lei, a empresa autorizada pela Justiça a
iniciar uma recuperação judicial deve apresentar
a seus credores um plano detalhado para superar seus problemas
financeiros, que pode incluir o alongamento de dívidas
e até a venda de bens e marcas.
Como tudo tem de ser aprovado pela maioria dos credores, uma
eventual recuperação judicial da Varig manteria
o poder do governo no processo -cerca de 60% das dívidas
da empresa são com a União, que estuda transformar
esse crédito em investimento.
"A participação dos credores é muito
maior na recuperação que na concordata, em que
um único comissário representa a todos",
avalia o advogado Ricardo Tosto, especialista na área.
Uma possibilidade criada pela nova lei é a venda total
ou parcial da empresa em recuperação sem que
os novos acionistas tenham de arcar com dívidas tributárias
e trabalhistas do passado.
No início da noite, o porta-voz da Presidência,
André Singer, confirmou que o artigo 199 seria mantido
na íntegra. O presidente Lula faria, disse, "apenas
vetos técnicos" no texto da lei.
KENNEDY ALENCAR
GUSTAVO PATU
da Folha de S. Paulo, sucursal de Brasília |