As desigualdades econômica,
étnica, regional e urbana-rural, entre outras, não
só impedem o acesso a bens como determinam o sucesso
de crianças e jovens brasileiros, consolidando as diferenças.
A conclusão consta do relatório "Situação
da Infância e Adolescência Brasileiras",
divulgado ontem pelo Unicef (Fundo das Nações
Unidas para a Infância).
"Ainda hoje, o fato de uma criança nascer rica
ou pobre, negra, branca ou indígena, viver na cidade
ou no campo, morar no Sul ou no Nordeste, ter ou não
uma deficiência afeta de sobremaneira as suas oportunidades
ao longo da vida", disse Reiko Niimi, representante do
Unicef.
O relatório analisa a situação de 61
milhões de brasileiros com menos de 18 anos (35,9%
da população). O Unicef lida com dados de 2002
do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística)
e de outros órgãos do governo.
Os números refletem o posto do Brasil de país
com maior concentração de renda do continente.
E mais: as dificuldades de crianças e adolescentes
de hoje em ter acesso a educação e saúde
representam o fantasma de manutenção desse status
quo. Cerca de 29 milhões de brasileiros negros menores
de 18 anos, por exemplo, têm duas vezes mais chances
de ser pobre do que os brancos.
Entre as regiões, o Norte e o Nordeste apresentam os
piores índices. Lá, os jovens têm quatro
vezes mais possibilidade de morrer antes de completar um ano
de idade e 16 vezes mais chances de não aprender a
ler e a escrever na comparação com aqueles que
vivem nas regiões Sul e Sudeste.
O relatório do Unicef descreve que o acesso à
escola "está quase universalizado, mas 5,5% das
crianças de sete a 14 anos ainda não frequentam
as aulas". Desses alunos, 41,7% estão defasados
e 12,7% não foram alfabetizados.
Jornalistas do jornal Folha de S.Paulo tentaram localizar
o ministro da Educação, Cristovam Buarque, ontem,
mas sua assessoria não respondeu aos recados. Presente
ao lançamento do relatório, o chefe-de-gabinete
de Cristovam, Marcelo Aguiar, parabenizou o Unicef e disse
que pretende trabalhar com o organismo para a redução
das desigualdades.
Ao avaliar a educação levando em conta a renda
da família, previsivelmente há maior exclusão
dos mais pobres. Entre os 20% mais pobres da população,
9,2% dos que têm de sete a 14 anos estão fora
da escola. Na faixa dos 20% mais ricos, esse percentual cai
para apenas 1,2%.
Situação mundial
Também foi lançado ontem o relatório
sobre a Situação Mundial da Infância do
Unicef, em que é feito um ranking dos 191 países
signatários das Metas do Milênio -um conjunto
de compromissos sociais que devem ser cumpridos até
2015. O Brasil subiu uma posição em relação
ao ano passado, mas manteve o mesmo índice. O país
ocupa a 93ª posição, com uma taxa de 36
mortes até os cinco anos a cada mil nascidos vivos.
O Unicef recomenda que os governos nacionais invistam na inclusão
das meninas na escola.
Sugestões
Investir mais na prevenção de doenças,
avançar no conteúdo escolar e fortalecer os
potenciais comunitários e da família foram os
pontos delineados pelo Unicef para a superação
das desigualdades.
"A escola precisa ser o lugar privilegiado para que as
crianças e os adolescentes dominem os conteúdos
históricos e geográficos dos povos, do papel
do campo e da cidade na dimensão social e econômica
do Brasil, numa leitura mais ampla e responsável das
dinâmicas nacionais", diz o texto.
Iuri Dantas,
da Folha de S.Paulo.
|