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A imagem
internacional dominante do Brasil na década passada,
de futebol, carnaval e bossa nova, está mudando lentamente.
Muitas empresas brasileiras estão tendo êxito
no mercado global usando design original apoiado em marketing
agressivo, gestão inovadora e custos baixos.
Das pequenas fábricas de sapatos e móveis às
imensas siderúrgicas e montadoras de automóveis,
empresas de todo o Brasil foram infectadas pela febre da exportação.
Ao longo dos dois últimos anos, de setembro de 2002
a agosto último, as vendas externas cresceram 63%,
para US$ 89 bilhões.
Tradicionalmente uma das economias mais isoladas do mundo,
o maior país da América Latina parece enfim
estar a caminho de fazer sentir seu peso nos mercados mundiais.
As exportações agora equivalem a 17% do Produto
Interno Bruto (PIB), ante apenas 6,5% em 1998. Numerosos setores,
do aço aos automóveis, passando pela agricultura
e o setor de papel e celulose, registraram maciço investimento
de capital.
Ao mesmo tempo, o dinamismo econômico vem sendo acompanhado
por uma política externa mais ativa e mais firme. Sob
Luiz Inácio Lula da Silva, o presidente esquerdista
que assumiu em 2003, o Brasil está levando adiante
seus planos de integração regional, que incluem
acordos comerciais e projetos de infra-estrutura. E começou
a assumir uma liderança entre as nações
mais pobres.
No ano passado, o Brasil ajudou a lançar o G20, uma
aliança de países em desenvolvimento, reforçando
a voz dos países pobres e exportadores de produtos
agrícolas na Organização Mundial do Comércio
(OMC). A iniciativa brasileira ajudou a manter as negociações
mundiais de comércio nos trilhos, depois dos revezes
registrados na conferência de Cancún, em 2003.
Subseqüentemente, o Brasil venceu duas disputas judiciais
históricas que aumentaram a pressão sobre a
Europa e os EUA para que desmantelem seus subsídios
à agricultura. O chanceler Celso Amorim não
tem dúvidas sobre a mudança no humor nacional:
"As pessoas estão mais conscientes. O Brasil ocupava
uma posição frágil. Agora, temos um selo
de qualidade: uma política econômica confiável".
Lula merece algum crédito pela vitória nas exportações.
Mas foi seu predecessor, Fernando Henrique Cardoso, que instalou
boa parte da estrutura econômica e política necessária.
Sustentado por um sistema de paridade cambial fixa, o plano
Real, adotado em 1994, colocou a inflação sob
controle, estimulando o investimento empresarial. A liberalização
do comércio, iniciada ainda mais cedo, mas concretizada
sob Cardoso, tornou as empresas brasileiras mais competitivas.
A privatização, nos anos 90, liberou as ineficientes
estatais, e os grandes e desajeitados conglomerados se tornaram
mais objetivos, para sobreviver.
Ironicamente, a crise financeira de 1999 também propiciou
benefícios. A desvalorização de 67% que
a moeda brasileira sofreu como resultado, e o regime de taxas
de câmbio livres então adotado, ajudaram a restaurar
a competitividade, enquanto os executivos das empresas brasileiras
se viram forçados a prestar atenção no
exterior como fonte de potenciais vendas, devido à
queda dos mercados brasileiros.
Quando Lula assumiu, em janeiro de 2003, a economia internacional
estava começando a se recuperar. O crescimento chinês
alimentou altas acentuadas nos preços do minério
de ferro, da soja e de outras commodities nas quais o Brasil
há muito detém vantagem competitiva.
A diplomacia comercial ativa de Lula encorajou muitos empresários
a procurar mercados fora do país pela primeira vez.
Ele liderou as maiores missões comerciais brasileiras
a países como China, Índia e África do
Sul, ajudando a garantir contratos.
Um crescimento ainda maior nas exportações,
no entanto, pode enfrentar obstáculos. Qualquer desaceleração
na economia mundial, especialmente um recuo na China, pode
solapar a demanda por muitos dos produtos brasileiros. O Brasil
também precisa seguir em sua abertura de mercados e,
a despeito dos progressos recentes, o desfecho das negociações
comerciais continua incerto.
Em segundo lugar, as indústrias brasileiras estão
em média operando com cerca de 85% de sua capacidade.
À medida que a economia se recupera, a alta da demanda
pode roubar produção aos mercados de exportação.
Terceiro, financiar as exportações continua
difícil. As taxas anuais de juros para as empresas
continuam a ser de em média 35%, em termos ponderados
pela inflação, muito acima das de seus concorrentes
internacionais.
Talvez o problema mais urgente seja a infra-estrutura, como
estradas e portos, que se tornou inadequada. De acordo com
uma estimativa, os custos de transporte são duas vezes
maiores que os da China ou os da Rússia.
No entanto, o Brasil ocupa hoje posição melhor
que nunca para resistir a uma desaceleração
dos mercados. Há diversos motivos para crer que a expansão
das exportações possa se sustentar.
Primeiro, a despeito das quedas recentes nos preços
das commodities, muitos economistas argumentam que as condições
de alta atuais são parte de uma tendência de
longo prazo. A entrada da China e da Índia nos mercados
ajudará a sustentar a demanda e reduzirá o impacto
das quedas cíclicas.
Além disso, as vantagens competitivas -terra fértil
abundante, recursos minerais, energia hidrelétrica
barata e baixos custos de mão-de-obra- significam que
o país é mais capaz de defender sua fatia de
mercado do que os rivais.
O mais importante é que o boom de exportações
se alargou e aprofundou. Em seus esforços por garantir
crescimento e longo prazo, o Brasil ainda terá de enfrentar
muitos obstáculos. Mas não há dúvida
de que o país vem explorando novos territórios.
Depois de meio século de experiência no coração
da indústria brasileira, Jorge Gerdau, 67, presidente
da siderúrgica Gerdau, está mais confiante que
nunca. "Essa não é a primeira tentativa
do Brasil para se tornar uma potência exportadora. Mas
é a mais promissora."
As informações são da Folha de S.Paulo.
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