O aumento
do número de casos de gravidez na adolescência
e a desigualdade entre ricos e pobres no acesso a serviços
reprodutivos no Brasil são dois problemas ''preocupantes'',
diz a representante do Fundo de População das
Nações Unidas (UNFPA), Tania Cooper Patriota.
O alerta foi feito durante divulgação do Relatório
sobre a Situação da População
Mundial 2004, feito pela organização.
A ONU reconhece vários avanços do Brasil, principalmente
nas políticas de educação, redução
da mortalidade infantil e combate à Aids. Mas um balanço
da execução de metas acertadas no Consenso de
Cairo (Egito), feito há 10 anos, mostra que a falta
de dinheiro para as políticas públicas, os preconceitos
de gênero e as diferenças de atendimento aos
pobres nos sistemas de saúde dificultam avanços
na área de saúde reprodutiva e no combate à
pobreza.
"A gravidez na adolescência no Brasil é
uma preocupação. É a gravidez não
planejada, que pode acabar em morte", diz Tania Patriota.
Nas estatísticas fornecidas por 179 países
que se comprometeram em contribuir para diminuir a desigualdade
e a pobreza, o Brasil aparece com uma taxa de mortalidade
de 260 mulheres para cada 100 mil nascidos vivos, quase 10
vezes maior que no vizinho Uruguai, onde morrem 27.
A taxa brasileira é de 73 nascimentos de crianças
por cada grupo de mil mulheres entre 15 e 19 anos de idade.
Há 10 anos, o índice era de 62. No Chile, são
44 crianças e no Canadá a taxa é de 16.
Pela avaliação da ONU, altos índices
de gravidez entre mulheres jovens trazem mais riscos à
saúde e maior incidência de aborto. Além
disso, a ONU aponta um grande impacto social sobre as vidas
dessas adolescentes, que costumam interromper os estudos para
cuidar dos filhos. Outra taxa que chama a atenção
no Brasil é a da mortalidade infantil: 38 óbitos
para cada mil nascidos vivos, três vezes maior que no
Chile e quase o dobro da Argentina. Nos Estados Unidos, a
taxa é de 7.
Para a ONU, a saúde reprodutiva está diretamente
ligada ao crescimento sustentado das nações.
O relatório diz que o fortalecimento social das mulheres
e a garantia dos direitos individuais de homens e jovens -
incluindo o direito à saúde reprodutiva e a
opção de ter filhos - são condições
vitais para o crescimento econômico e a diminuição
da pobreza.
Para a ONU, foi um grande avanço o Brasil aprovar
a lei de planejamento familiar. Mas a representante auxiliar
do UNFPA, Taís de Freitas Santos, acha que a implantação
da lei ''está aquém do desejado''. Tania Cooper
Patritota acredita que, apesar das dificuldades, o Brasil
é um dos países que estão na frente no
cumprimento das metas de desenvolvimento do milênio.
"Na América Latina, o Brasil está entre
os mais avançados", afirmou Tânia.
Pelo relatório, o Brasil investe 3,2% do PIB em saúde.
Na Argentina e no Uruguai. o percentual sobe para 5,1%. O
Chile, investindo 3,1%, tem melhores indicadores que o Brasil.
Os países ricos se comprometeram no Cairo a dar US$
6,1 bilhões por ano para a redução das
desigualdades no mundo, mas só vêm contribuindo
com a metade. O Brasil também não vem depositando
todo o dinheiro prometido. Mesmo assim, é elogiado
pela liderança nas políticas para tentar combater
a miséria no continente.
O retrato traçado pela ONU mostra um planeta com muitas
desigualdades sociais. Cerca de 2,8 bilhões de pessoas
- duas em cada cinco - lutam para sobreviver com menos de
US$ 2 por dia. Apesar de uma redução da fertilidade
no planeta, a população mundial vai passar dos
atuais 6,4 bilhões para 8,9 bilhões até
2050. Os 50 países mais pobres triplicarão suas
populações.
HUGO MARQUES
do Jornal do Brasil
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