O comissário de Relações
Exteriores da União Européia, Christopher Patten,
disse que está "apreensivo" diante da proposta
do governo brasileiro de uma "CPMF internacional"
para financiar programas sociais em países pobres.
"Eu fico apreensivo com a possibilidade de se obter
um efeito oposto ao desejado. O que queremos é ver
mais investimentos em países mais pobres e em desenvolvimento,
não menos. Qualquer coisa que possa restringir os fluxos
financeiros significa o risco de obtermos o efeito reverso
ao que pretendíamos", disse Patten à Folha,
na segunda-feira à noite.
Ele se encontrara horas antes com o presidente Luiz Inácio
Lula da Silva, que pretende apresentar a idéia da "CPMF
internacional" em um encontro com o presidente da França,
Jacques Chirac, e com o secretário-geral da ONU (Organização
das Nações Unidas), Kofi Annan, no fim do mês,
em Genebra.
Ao ressalvar que sua objeção era "pessoal",
Patten acrescentou: "O governo brasileiro pode ter respostas
para essas perguntas [sobre os riscos da proposta] e, certamente,
há líderes europeus, como o presidente Chirac,
que acreditam nela [na idéia]".
A idéia original de taxação de fluxos
de capitais internacionais -agora chamada de "CPMF internacional"
pelo governo Lula- foi do americano James Tobin, professor
da Universidade de Yale e Prêmio Nobel de Economia.
Em 1999, ela foi encampada pelo então presidente Fernando
Henrique Cardoso para tentar impedir os efeitos das crises
financeiras sobre os países mais pobres. Lula defende
sua aplicação diretamente em programas sociais.
Se depender do britânico Patten, que completa 60 anos
neste ano e desde o início da carreira tem laços
com o Partido Conservador, a idéia não vai muito
longe. Ele, porém, ressalvou que é cedo para
conclusões: "Não há uma posição
da União Européia, pois há diferentes
pontos de vista apresentados por diferentes países
membros".
Para ele, "de todos os modelos que foram experimentados
para lidar com movimentos financeiros gigantescos, o que mais
obteve sucesso não foi o que taxa o dinheiro quando
ele sai de países, mas quando ele entra".
Programa espacial
Patten passou dois dias no Brasil, segunda-feira e ontem.
Em Brasília, foi recebido também pelo chanceler
Celso Amorim e pelo ministro José Viegas (Defesa).
Com Amorim, assinou um acordo de cooperação
científica e tecnológica e outro de cooperação
entre UE e Brasil. Também falaram sobre a possibilidade
de fechar o acordo UE-Mercosul até o final do ano.
Com Viegas, o comissário europeu conversou sobre o
sistema Galileo de navegação e posicionamento
global, que se coloca como opção ao sistema
americano para o programa espacial brasileiro, suspenso depois
do acidente com a base aérea de Alcântara (MA),
no ano passado.
América Latina
A uma pergunta sobre as recentes preocupações
de Washington com um eventual processo de "esquerdização"
da América Latina, Patten foi irônico:
"Eu não tenho nenhuma evidência para despertar
no meio da noite tremendo de medo".
Ele criticou tanto Cuba como a política americana
para a ilha: "Os direitos humanos em Cuba são
deploráveis. As pessoas devem se perguntar como [Fidel]
Castro se mantém no poder por tanto tempo. Se o objetivo
das sanções e de isolá-lo foi o de se
livrar dele, não funcionou muito bem".
Fichamento nos EUA
Patten discorda dos novos procedimentos impostos pelos EUA
aos estrangeiros que chegam ao país: "Eu tenho
dúvidas se colher impressões digitais vai aumentar
nossa segurança. É uma questão mais ampla.
O ideal seria que medidas de segurança fossem discutidas
em fóruns internacionais e não impostas pelos
americanos sem debates".
Em seguida, foi irônico: "O principal problema
que enfrentamos foi que um vôo da British Airways foi
cancelado e atrasado por vários dias. Depois, uma pessoa
entrou num avião em Washington e foi pego em Londres,
carregando cinco balas".
ELIANE CANTANHÊDE
ANDRÉ SOLIANI
da Folha de S. Paulo, sucursal de
Brasília
|