O Ministério da Saúde
informou ontem que abriu sindicância para apurar a suposta
interferência de políticos na fila de transplante
de medula óssea. O caso foi revelado anteontem pelo
jornalista Elio Gaspari, em sua coluna na Folha. O texto informava
que "um hierarca" do ministério teria mandado
furar a fila de exames de realização de transplante
para beneficiar um paciente.
A suposta interferência causou ontem o pedido de demissão
do diretor do Centro de Transplantes de Medula Óssea
do Inca (Instituto Nacional de Câncer), Daniel Tabak.
Ele se demitiu dizendo discordar da ação de
políticos no processo de escolha dos pacientes que
estão na fila de espera por um transplante de medula
óssea. A coluna também informava sobre o pedido
de demissão de Tabak.
Ele entregou ontem à direção do instituto
um documento expondo as razões de sua saída.
Tabak afirmou que o motivo "é a incapacidade de
coordenar o programa, que está sendo conduzido por
critérios que não foram os estabelecidos inicialmente".
A revista "Época" desta semana publicou
uma reportagem afirmando que o deputado federal Antônio
Serafim Venzon (PSDB-SC) pediu a interferência do ministro
Humberto Costa em favor de um paciente de 13 anos.
"Infelizmente, foi um caso que foi resolvido por interferência
de um deputado. Imagino que um grande número de pacientes
não consegue resolver seus problemas porque não
tem um padrinho. É preciso reformular o sistema",
disse o deputado, que afirmou não saber se o paciente
em questão furou alguma fila de exame, mas acrescentou:
"Sou grato ao ministro Humberto Costa e aos seus interlocutores
por terem sido muito prestativos ao dar um andamento rápido
ao caso".
O ministro da Saúde nega que tenha interferido em
favor do paciente ou conversado com o deputado sobre o assunto.
A definição dos casos mais urgentes para transplante
da medula óssea é um processo mais complexo
do que o usualmente adotado em casos de transferência
de outros órgãos, como rins ou coração.
Isso porque não basta ter o mesmo tipo sanguíneo
de um doador para fazer o transplante.
No caso da doação de medula óssea, é
preciso avaliar também se há compatibilidade
genética entre o doador e o receptor. A busca por doadores
compatíveis é feita em bancos de dados de todo
o mundo quando não há doadores compatíveis
na própria família.
Os exames para determinar a compatibilidade entre doadores
também não são simples e, uma vez confirmada
a possibilidade de transplantar a medula óssea, o procedimento
para importação e transplante do tecido é
caro -varia de US$ 25 mil a US$ 35 mil (de R$ 71 mil a R$
99.500).
De acordo com Tabak, os recursos disponíveis no Ministério
da Saúde não cobrem todos os gastos e é
preciso utilizar recursos da Fundação Ary Frauzino
(instituição de apoio do instituto) para viabilizar
o transplante.
Outro lado
A direção do Inca não quis se pronunciar
sobre a saída de Tabak ontem porque o Ministério
da Saúde divulgaria uma nota sobre o caso e porque
o diretor do instituto, José Gomes Temporão,
ainda não havia lido o relatório feito pelo
médico demissionário.
"Diante de denúncias veiculadas na imprensa,
o Ministério da Saúde decide abrir sindicância
para investigar supostas irregularidades na fila de exames
para transplantes de medula óssea", informa a
nota.
O documento do instituto afirma também que, "para
assegurar total transparência no procedimento, o Ministério
da Saúde solicitará ao Ministério Público
Federal que designe um membro seu para acompanhar as investigações.
A sindicância terá o prazo de 30 dias para apresentar
o seu relatório final".
ANTÔNIO GOIS
da Folha de S. Paulo, sucursal do Rio
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