Apesar
de ainda bastante presente no debate sobre discriminação
no Brasil, a tese de que o preconceito de classe é
mais forte que o preconceito racial é desmentida por
todos os principais estudos feitos sobre o tema nos últimos
anos, mesmo quando usam metodologias diferentes. É
o que aponta uma pesquisa divulgada pelo Ipea (Instituto de
Pesquisa Econômica Aplicada), que analisou os trabalhos
sobre relações sociais no Brasil publicados
nas décadas de 1940 e 1950 e a partir do final da década
de 1970.
Os estudos mais recentes “comprovaram que, ainda que
se comparem brancos e negros de mesmo nível socioeconômico,
persistem desigualdades entre eles inatribuíveis a
outras fontes que não o racismo”, afirma o texto,
intitulado A Mobilidade Social dos Negros Brasileiros, do
consultor da Diretoria de Estudos Sociais do Ipea, Rafael
Guerreiro Osório. O trabalho faz parte do projeto Combate
ao Racismo e Superação das Desigualdades Sociais,
apoiado pelo PNUD.
A série de trabalhos produzidos nas últimas
décadas, afirma Osório, também demonstra
que a desigualdade racial não pode ser atribuída
apenas à herança da escravidão. “A
ideologia racista inculcada nas pessoas e nas instituições
leva à reprodução, na sucessão
das gerações e ao longo do ciclo da vida individual,
do confinamento dos negros aos escalões inferiores
da estrutura social, por intermédio de discriminação
de ordens distintas, explícitas, veladas ou institucionais,
que são acumuladas em desvantagens”, acrescenta.
A pesquisa, uma espécie de revisão bibliográfica
sobre o tema, relembra que na primeira metade do século
XX era comum, mesmo entre pesquisadores que contestavam a
tese de que o Brasil é uma democracia racial, o prognóstico
de que a urbanização e a industrialização
do país contribuiriam para eliminar a desigualdade
racial. Os trabalhos feitos a partir da década de 70,
quando os dados sobre cor foram incluídos na PNAD (Pesquisa
Nacional por Amostra de Domicílios), mostram que o
prognóstico não se confirmou.
Um dos estudos destacados por Osório é o de
Carlos Hasenbalg, publicado em 1979. Analisando dados de seis
Estados do Centro-Sul brasileiro, Hasenbalg aponta que os
negros têm dupla desvantagem em relação
aos brancos na mobilidade social: por razões históricas,
partem quase sempre das faixas mais pobres da população
(“o que resultaria em desvantagem logo de partida”,
salienta o consultor do Ipea), e além disso também
enfrentam barreiras que resultam em menor escolaridade e menor
realização ocupacional.
Na década seguinte, um trabalho de Nelson do Valle
Silva (de 1988) com base em dados da PNAD de 1976 chega a
conclusões semelhantes: “os negros sofrem duplamente:
inicialmente, com as limitações da origem social
e, ao longo do ciclo de vida individual, pela acumulação
de desvantagens sucessivas”, relata Rafael Guerreiro
Osório.
Em 1994, a pesquisadora Elisa Caillaux compara a PNAD de
1976 com a de 1988. A conclusão é a mesma dos
estudos anteriores. “Os resultados de Caillaux são
ainda mais eloqüentes na demonstração da
rigidez racial da estrutura social quando se leva em consideração
que o esquema de estratificação empregado, tanto
para as evidências de 1976 quanto para as de 1988, apesar
de bem distinto do usado nos estudos de Hasenbalg e Valle
Silva, levou à descoberta dos mesmos padrões,
e, poder-se-ia dizer, tendências”, observa Osório.
O autor cita ainda estudos publicados em 2000 e 2003, em
que os resultados são essencialmente os mesmos. “Resumindo
em um exemplo o quatro atual da mobilidade social revelado
pelos estudos relatados nesta seção, quando
são tomados dois pais, um negro e um branco, ambos
com exatamente a mesma condição social, se esta
for baixa, o filho do branco terá melhores chances
de ascender na estrutura social; se for elevada, o filho do
negro correta maior risco de descender na hierarquia”,
afirma Osório. E ressalta: “tal situação
ocorrerá mesmo se esses dois filhos hipotéticos
atingirem o mesmo nível educacional, o que pode não
ocorrer, visto que há diferenças raciais na
realização educacional que prejudicam os negros,
para a vantagem dos brancos”.
As informações são
do site PNUD Brasil.
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