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Ricardo Oliveros*
Na década de 50 era um dos
lugares mais chiques da cidade. Nos anos 60 e 70 foi ponto
de encontro da juventude, época em que os famosos "rachas"
aconteciam e foram imortalizados na música "Rua
Augusta" de Hervé Cordovil, cantada não
só pela Jovem Guarda, como também por Raul Seixas
e os Mutantes: "Entrei na Rua Augusta a 120 por hora..."
Nos anos 80, a Augusta mudou suas
características, e o que muita gente chama de declínio,
prefiro denominar de novos rumos. Sou arquiteto de formação
e meu mestrado foi sobre três edifícios de São
Paulo: Copan de Oscar Niemeyer, Edifício Nações
Unidas de Abelardo de Souza e Conjunto Nacional de David Libeskind.
O que eu procurava mostrar é como a cidade foi se deslocando
do centro original em direção a Paulista por
duas grandes vias: Brigadeiro Luiz Antonio e rua Augusta.
Mais do que a cidade, o poder político e econômico.
Sempre me pergunto, porque consideram
decadência a mudança de status que uma determinada
região sofre, seja por questões políticas,
econômicas ou sociais. Sim, se compararmos as fotos
da Augusta com seu comércio de luxo de outrora com
os de hoje, de imediato as pessoas dirão: Ai que pena,
tudo era tão melhor antes. Melhor para quem? Para quem
tinha dinheiro, claro.
Sim, os prédios não
são tão reluzentes como antes. O comércio
mudou muito. As pessoas também. Mudança de classe,
mas não de vida. Há dez anos atrás morei
num prédio incrível entre as ruas Mathias Aires
e Fernando de Albuquerque. Vários amigos como vizinhos.
Na porta, sempre uma prostituta fazendo seu "ponto".
Adorava seus modelos, suas histórias.
Convivemos em plena harmonia, nos quase quatro anos em que
morei lá. Quando queria ir ao cinema, era só
olhar pela janela e ver se tinha fila ou não no Espaço
Unibanco. Sair de noite, não era problema, porque a
Lôca, era logo ali. E continua lá.
Passada uma década, continuo
andando feliz pela Baixa Augusta, porque o Vegas Club ali
se encontra, lado a lado com as Saunas For Men. O
Studio SP, logo vai se mudar para lá. Sem contar
que tem coisas que só se encontra por lá, como
a tradicional rotisseria Bologna, ou os mais lindos chapéus
do belga Maurice Plas.
Recentemente, fui convidado para fazer
uma edição de moda, para a Revista
da Folha, com roupas das lojas que vestem os travestis
e prostitutas do local. Por que me escolheram? Talvez, pela
total intimidade e uma completa ausência de preconceitos
sobre isso.
Aprendi
que espaço público é isso, o encontro
com o diferente e não só com nossos pares. A
Augusta para mim é um antídoto contra as luzes
monótonas dos shoppings centers. Sinto falta do Spazio
Pirandello, do Antônio Maschio. Sinto falta do Promocenter.
Sinto falta do Ceasar Park, sinto falta de morar lá.
Por isso, sempre volto quando o tédio bate à
minha porta.
*Ricardo Oliveros
é editor de moda, mestre em Arquitetura e blogueiro
do Fora
de moda.
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