A loja
da rede de fast food Bob´s, instalada no Carrefour da
Barra na Tijuca, no Rio de Janeiro, ganhou uma nova dinâmica
com a chegada de uma turma especial do Projeto Surdo-Mudo.
Desde setembro, cinco deficientes auditivos foram contratados
para trabalhar no atendimento da loja, a partir de um termo
de compromisso firmado com o Ministério Público
do Trabalho e com o DRT (Delegacia Regional do Trabalho) do
Rio de Janeiro.
A iniciativa faz parte das ações da empresa
que vem de encontro ao decreto 9298, de 1999, estabelecido
pelo Ministério do Trabalho, que determina que as empresas
com 100 ou mais empregados preencham o seu quadro de funcionários
com portadores de deficiência num percentual que varia
de 2% a 5% do total de empregados. De acordo com o censo do
IBGE de 2000, estima-se que 14,5% da população
do país apresente algum tipo de deficiência.
A incapacidade de enxergar, com seus diversos graus de severidade,
é responsável por quase a metade do total de
casos informados, ou seja, 16,5 milhões.
Os novos funcionários foram selecionados a partir
de um banco de dados fornecido pelo Núcleo de Cidadania
da DRT. Geraldo Gonçalves, diretor de Recursos Humanos
do Bob´s, explica que, normalmente, a política
de contratação da empresa exige que os funcionários
tenham entre 16 e 22 anos e o Ensino Fundamental completo.
No entanto, frente às diversas dificuldades que a pessoa
portadora de deficiência encontra para estudar, como
a locomoção até a escola, esse último
critério de contratação não foi
levado em consideração. "Nos preocupamos
mais em identificar aqueles que realmente tinham vontade de
trabalhar", comenta.
Eles passaram por um treinamento de 45 dias, sendo preparados
para trabalhar desde a limpeza e, principalmente, na produção
dos sanduíches e outros alimentos. Até agora,
duas turmas, com cerca de cinco alunos cada, participaram
do curso. Um novo treinamento terá início em
janeiro. "Alguns que passaram pelo curso acabaram saindo
ou pela dificuldade de distância do local de trabalho
ou pela falta de aptidão ao negócio. E isso
é comum a todos os funcionários, pois as exigências
são as mesmas. Os deficientes auditivos não
são tratados de forma diferente e a produtividade tem
que estar ligada ao serviço, senão, vira filantropia
e não política de trabalho", destaca Gonçalves.
Um intérprete de Libras (Língua Brasileira
de Sinais) foi treinado especialmente para este apoio de comunicação
entre os funcionários e os deficientes auditivos e
também com os clientes. Os demais empregados da filial
da Barra estão aprendendo a nova língua, com
apoio de um livro de sinais. Além disso, foi instalado
um novo sistema de cores que facilita essa comunicação,
já que as cores são mais fáceis de serem
ditas em libras. Por exemplo, quando o cliente pede um Big
Bob, já foi estabelecida que a cor azul é que
irá representá-lo.
Rafael Faria de Sá, gerente da loja, ressalta que
os resultados até o momento têm sido muito positivos,
já que os novos funcionários apresentam uma
grande força de vontade e motivação para
o trabalho. "Esse entusiasmo acaba influenciando todos
nós da loja. Eles são muito caprichosos e cuidadosos
com o que fazem", comenta. Para Gonçalves, essa
iniciativa é uma quebra de paradigmas, já que
as pessoas dificilmente imaginam um deficiente auditivo trabalhando
num sistema fast food. "Isso impacta tanto nos clientes,
que percebem uma nova postura da empresa, quanto no clima
interno, promovendo uma maior integração entre
as pessoas".
Marcelo Macedo Borges, 23 anos, deficiente auditivo, conta
que esta é uma nova oportunidade aberta para eles,
e que está achando o novo serviço muito bom.
O jovem, que atua como atendente no Bob´s, já
havia trabalhado em outro local, no departamento de almoxarifado
da empresa. No entanto, ele se recorda de ser difícil
a comunicação com os outros funcionários,
pois as pessoas não sabiam se expressar e falar com
ele.
O gerente de Recursos Humanos da empresa afirma ainda que
a contratação de deficientes sempre foi uma
preocupação do Bob´s, antes mesmo da exigência
da lei, quando a empresa já realizava um trabalho de
inclusão de portadores de deficiência física,
no seu quadro de funcionários, mas as atividades eram
restritas ao Bob´s Fone - sistema de atendimento telefônico
para pedidos. Apesar do serviço ter sido terceirizado,
alguns funcionários, como Pablo da Silva Marinho, 20,
portador de deficiência mental leve, continuaram a atuar.
Para o jovem, esta foi a conquista do primeiro emprego. Ele
está terminando os estudos do Ensino Fundamental e
pretende continuar no ramo caso haja oportunidade. "Estou
aprendendo muito. Além disso, é bem interessante
essa relação com os deficientes auditivos, apesar
de ser complicada, às vezes", destaca o jovem.
De acordo com Gonçalves, a proposta é expandir
o projeto, inicialmente, para as 60 lojas próprias
do Bob´s pelo país, principalmente as lojas escolas
– sendo que existem três no Rio de Janeiro e duas
em São Paulo – e, depois, incluir também
os 340 franquiados. Em São Paulo, o projeto deverá
ter início em 2005. Uma pesquisa divulgada no início
de dezembro pela Secretaria Municipal do Desenvolvimento,
Trabalho e Solidariedade da cidade, apontou que, de acordo
com o censo de 2000, existem 79 mil portadores de deficiência
que têm idade para trabalhar na capital paulista.
Na amostra colhida em novembro, a secretaria detectou que
88,7% estão sem emprego. Outros 15,9% estão
à procura de uma ocupação e 72,8% já
desistiram de procurar trabalhar. O diretor da empresa destaca
que, gradativamente, o Bob´s irá contratar novos
portadores de deficiência, para que a empresa possa
cumprir a lei. Atualmente, a rede Bob´s conta com 7
mil empregados, sendo que 1300 estão atuando nas lojas
próprias.
DANIELE PRÓSPERO
do site Setor3
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