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Há três anos, o
cearense Antonio Erivaldo Silva, de 44 anos, tornou-se cobrador.
Antes de assumir a função, para ele - que já
havia trabalhado como metalúrgico e na área administrativa
- a rotina de cobrador parecia entediante. Não foi bem
isso que ele comprovou. "Você começa a conhecer
a cidade. Mesmo passando pelos mesmos locais todos os dias,
você vê coisas diferentes", diz ele. Silva
passou a observar cenas e monumentos de São Paulo e,
na sua retina, fixá-los como uma fotografia.
Decidiu ir além: comprou uma câmera digital, sem
grandes recursos, em 10 parcelas de R$ 40, e, nos últimos
2 anos, passou a registrar imagens da cidade a partir das janelas
dos ônibus. Sua história tomou tamanha projeção
que Silva ganhou sua própria exposição
fotográfica, Fotógrafo, Profissão Cobrador,
em cartaz a partir de hoje no Sesc Ipiranga. A mostra reúne
50 imagens, entre tantas registradas durante suas viagens entre
na linha Gentil de Moura-Praça da República. A
exposição faz parte da programação
comemorativa pelos 451 anos de São Paulo.
O itinerário do circular contribui,
e muito, para os cliques experimentais do cobrador. Todos
os dias, ele tem à disposição símbolos
paulistanos, como Praça da Sé, Pátio
do Colégio, Viaduto do Chá, Teatro Municipal,
Praça da República, Shopping Light, Ponto Chic,
entre tantos outros. Pode fazer e refazer uma foto, buscar
novos ângulos sempre que quiser. Muita dessa sua paixão
pelas coisas de São Paulo vem do grande interesse que
ele tem pela história da cidade. "Pesquiso muito
na internet e em livros." Ele já pensou até
em publicar um livro que combinasse fotos e textos. "Mas
como ficaria caro, a solução foi fazer um fotolog
(www.fotolog.terra.com.br/toninho). Além disso, mais
pessoas podem vê-lo."
Silva é uma alegria só:
nos últimos 8 meses, o site contabilizou 370 mil acessos,
recebeu cerca 2 mil mensagens de internautas de outros países,
como Portugal, Inglaterra, EUA. Além disso, consta
como link em 156 homepages.
Flagrantes
Além do aspecto histórico de São
Paulo, ele também desenvolveu, sem querer, gosto pelo
fotojornalismo. "Uma vez, fotografei um acidente na Rua
Libero Badaró. Foi um atropelamento, mas fotografei
de um jeito que o rosto da vítima apareceu encoberto."
Pela sua simples câmera, chegou a registrar uma movimentação
na frente do Fórum João Mendes, no centro, durante
a greve do Judiciário. As cenas do cotidiano também
o fascinam, confessa.
Apesar de ser uma prática freqüente,
muitos dos passageiros da linha Gentil de Moura-Praça
da República passaram tempos sem perceber sua vocação.
Descobriram em reportagens em TVs e jornais. É que
Silva é discreto: ele acomoda sua pequena digital numa
pochete e fica à espera de uma breve parada do ônibus
ou do pouco movimento de passageiros para entrar em ação.
E quando lhe perguntam se ele
tem uma técnica especial para fotografar, a resposta
é sincera. "Minha técnica é de apertar
o botão", brinca. Autodidata, adquiriu, por si
só, noções de enquadramento e linguagem
fotográfica. E também a autocrítica que
é peculiar aos fotógrafos. "Quero me aperfeiçoar",
planeja. "Quem sabe em não passa a viver só
com a fotografia."
ADRIANA DEL RÉ
do O Estado de S. Paulo
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