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É comum adolescentes irem
desnorteados ao consultório de psicólogos para
fazer testes vocacionais. Chegam, por vezes, perdidos entre
as mais variadas e díspares opções, o
que é normal -um mesmo estudante é capaz de
oscilar entre opções como direito, jornalismo,
medicina e arquitetura. Muitos deles, porém, parecem
querer postergar ao máximo a escolha e exibem desinteresse
como se quisessem esquecer
o assunto, o que é, mas não deveria ser, normal.
"É um tema cada vez mais difícil para o
jovem", constata Mônica Chemin, psicóloga
especializada em orientação vocacional e profissional
e mãe de dois adolescentes.
Neste 1º de Maio, uma das melhores formas de avaliar
o clima provocado pelo desemprego é observar a ansiedade
aguda dos jovens da elite ou da classe média em relação
ao mercado de trabalho. Isso vai a tal ponto que muitos deles
se recusam a crescer. "A mensagem que eles recebem diariamente
é a de que, por mais que estudem, terão de enfrentar
um monstro que pode, a qualquer momento, engoli-los",
comenta Mônica, ao revelar uma tendência largamente
captada por educadores do ensino médio.
Nos dias de hoje, esse temor parece normal. Não faz
muito tempo, os adolescentes de classe média, quando
discutiam que carreira iriam seguir (embora se mostrassem
em dúvida entre as várias possibilidades), tinham,
quase todos, a certeza de que, de um jeito ou de outro, encontrariam
algo que lhes garantisse a sobrevivência futura. O desemprego
não estava no horizonte ao menos desse agrupamento
social.
A escolha da carreira ou da faculdade provocava dúvidas,
mas era carregada de otimismo - afinal, constituía
o símbolo máximo de um projeto de vida. Certa
ou erradamente, fomos educados ouvindo a pergunta: "O
que você vai ser quando crescer?". Crescer e ser
fundiam-se, nessa pergunta, no fazer. Encontrar a aptidão
era encontrar a independência.
O sonho da autonomia permanece. Mudou, porém, o otimismo.
Não há semana em que a mídia, em tom
de alarme, não dê uma notícia ruim sobre
o nível de emprego, como, aliás, aconteceu com
o índice do IBGE, divulgado na terça-feira passada.
Por todos os lados, fala-se das novas demandas profissionais
e das dificuldades de se manter informado, competitivo. Uma
única vaga para trainee chega a ser disputada por 2.000
candidatos.
Parece mesmo que não há o que baste para estar
preparado. Na semana passada, Harvard, um dos templos da vida
acadêmica mundial, divulgou oficialmente modificações
em seu currículo por considerá-lo defasado.
Para que os estudantes não se tornem precocemente obsoletos,
a universidade está propondo, entre outras coisas,
que eles, durante o curso, estudem em faculdades no exterior
para que aprendam a lidar com a diversidade. O aluno contemporâneo,
de acordo com o que dizem, é global, e criativo, e
intuitivo, e empreendedor, e sabe trabalhar em grupo, e tem
inteligência emocional, e nunca pára de estudar.
Como devem se sentir os adolescentes ao saberem que, no programa
Primeiro Emprego, o presidente Lula prometeu 250 mil postos
de trabalho e, por enquanto, somente algumas centenas de vagas
foram abertas?
O drama é que o estudante não sabe direito o
que fazer, mas imagina que tem de fazer alguma coisa, qualquer
coisa, já que passar no vestibular é para ele
e para os pais um sinal de status. O resultado se percebe
depois, na altíssima taxa de alunos que, em pouco tempo,
dizem estar frustrados, decepcionados, e mudam de curso. O
drama, entretanto, vai além disso e tem muito a ver
com as crenças e valores.
A frustração é conseqüência
também de uma atitude. "O jovem está vivendo
em tempo real, quer ver realizado o desejo imediatamente e
acaba tendo dificuldade de construir processos de longo prazo",
alerta Mônica. É, em outras palavras, o lado
exacerbado da cultura do consumismo: o prazer é aqui
e agora. No lugar de namorar, o "ficar", que exige
zero de compromisso. Nesse contexto do "aqui e agora",
o uso de drogas lícitas e ilícitas ganha diferente
dimensão, agravado pelo feroz bombardeio publicitário.
Não estou fazendo uma condenação moral
dos jovens -longe disso. O problema é que construir
uma carreira é o contrário disso: exige uma
série de etapas, de rituais, é algo que não
vem pronto. Daí que psicólogos alertem para
o perigo de pais protetores, sem disposição
de impor limites, que acabam gerando filhos com dificuldade
de lidar com a frustração.
Seja pelos valores exacerbados, seja pela licenciosidade paterna,
seja pelas novas regras do mercado de trabalho, o que temos
é a tristeza de jovens com medo do emprego - justamente
quem mais deveria encantar-se com o futuro profissional parece
querer esquecê-lo.
PS - Está na vanguarda do ensino superior quem propõe
que os primeiros anos da faculdade sejam dedicados a matérias
básicas, gerais, que ofereçam ao estudante uma
visão mais ampla. É o tempo necessário
para fazer a escolha mais apropriada. Formar precocemente
especialistas é formar obsoletos.
Esta coluna é publicada originalmente
na Folha de São Paulo, na editoria
Cotidiano.
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