Autor de alguns dos projetos arquitetônicos
mais caros e comentados da cidade, Ruy Ohtake não sabia
o que o esperava quando, numa entrevista, classificou a favela
de Heliópolis de um dos símbolos da feiúra
paulistana.
Incomodado com a entrevista, João Miranda, um dos principais
líderes comunitários de Heliópolis, foi
direto ao assunto na conversa telefônica com o arquiteto.
Não queria reclamar, mas apenas perguntar: "Você
pode nos ajudar?". Podia.
Ohtake começou, então, a freqüentar reuniões
em Heliópolis, um agrupamento de 100 mil pessoas espalhadas
em 1 milhão de metros quadrados na zona sul. É,
de fato, um dos exemplos da degradação urbana.
Em 1972, viviam ali apenas 60 famílias, transplantadas
pelo poder público de um terreno da zona leste. Essa
pequena vila tornou-se rapidamente a maior favela de São
Paulo e passou a freqüentar o noticiário policial.
Numa reação ao caos, prosperaram associações
que desenvolveram em Heliópolis um sentido de coletividade
e ajudaram a implantar creches, escolas e centros de saúde.
"Foi o que me seduziu", conta Ruy Ohtake.
Nas reuniões, ele percebeu que, além da demanda
pelos tradicionais serviços sociais e de infra-estrutura,
havia uma demanda específica por estética. "Eles
querem ver coisas belas em sua comunidade."
Notou-se, nos encontros, que a beleza seria um estímulo
à auto-estima coletiva.
Decidiu-se iniciar neste mês uma operação
de embelezamento colorindo, com tons fortes, todas as casas
de duas ruas.
Os moradores de cada casa terão o direito de escolher
suas cores preferidas. "Meu trabalho será fazer
uma interferência em cada uma das fachadas para que,
no final, saia um painel harmônico."
A inauguração da primeira fase do projeto está
prevista para as festas de junho. "Estamos correndo contra
o tempo", diz o arquiteto. Uma empresa (Basf) doou as
tintas e se recrutaram, na comunidade, desempregados que estivessem
dispostos a ganhar um salário e serem habilitados na
profissão de pintor.
O motivo da pressa: as festas de são João. Afinal,
é uma festa tipicamente nordestina, assim como Heliópolis
-não há melhor data para mostrar ruas coloridas.
Esta coluna é publicada originalmente
na Folha de S.Paulo, na editoria Cotidiano.
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