Transformar
salas ociosas em porta de entrada de jovens ao mercado de
trabalho é um caminho inspirador
Uma escola pública de ensino fundamental e médio
da cidade de São Paulo vai começar a fazer,
no início do próximo ano, uma experiência
para empregar jovens no mercado de trabalho. Nos períodos
vespertino e noturno, quando existem salas vagas, serão
ministrados cursos gratuitos para webdesigner e técnicos
em montagem de rede de computadores.
A julgar pelas estatísticas divulgadas na semana passada
pela Brasscom (Associação Brasileira das Empresas
de Software e Serviços para Exportação)
sobre a carência de 40 mil técnicos por ano,
no Brasil, em tecnologia da informação, a chance
que têm aqueles jovens de obter um emprego é
enorme. Além de já faltar mão-de-obra
especializada, segundo informa a entidade, brasileiros que
desenvolvem programas estão se mudando para outros
países, atraídos por bons salários.
Abalada por uma antiga crise, aquela escola (Carlos Maximiliano
Pereira dos Santos) estava ameaçada de fechar e resolveu
se mobilizar. Uma das saídas para a situação
foi atrair para lá alunos interessados em entrar no
mercado de trabalho.
A idéia surgiu como forma de resolver o problema da
falta de espaço que o governo estadual encontra para,
por meio do Centro Paula Souza, expandir a sua oferta de cursos
técnicos. Veio, assim, a oportunidade de economizar
dinheiro aproveitando salas vazias da escola.
Do encontro de dois problemas, surgiu uma solução
aparentemente simples ou mesmo irrelevante. Simples ou não,
a idéia nada tem de irrelevante: transformar salas
ociosas em porta de entrada de jovens ao mercado de trabalho
é um caminho que pode ser mais inspirador do que se
imagina para estimular o crescimento do país, gerar
empregos, aumentar salários e distribuir a renda. É
um dos modelos a serem acompanhados para tentar evitar o chamado
"apagão de trabalhadores".
A forma mais simples de constatar como o despreparo dos brasileiros
produz desemprego e baixo salário está no relatório
divulgado na semana passada pelo governo federal, que mostra
a dificuldade das empresas em contratar mão-de-obra.
Empresas de setores estratégicos da economia chegam
a repensar investimentos por causa da falta de trabalhadores
e até cogitam a possibilidade de expandir seus negócios
em outros países em vez de fazê-lo aqui. Foi
o que sinalizou, por exemplo, a Companhia Vale do Rio Doce.
Vive-se, neste momento, uma ansiedade decorrente do risco
de falta de gás, o que agrava o medo de um apagão
energético. A Petrobras informa que, para explorar
as gigantescas reservas de gás (e mesmo de petróleo)
e nos tirar da imprevisibilidade externa, não há
mão-de-obra disponível.
É mais fácil perceber o risco para a geração
de empregos quando se fala de infra-estrutura física
(portos, estradas, usinas hidrelétricas e aeroportos).
O inusitado é que, agora, todos estão vendo,
na prática, o que alguns acadêmicos, baseados
nos mais abundantes estudos, vêm há anos alertando:
a relação entre educação e dinheiro
no bolso. Com isso, o tema educação sai do mundinho
fechado de especialistas e pedagogos e passa a virar conversa
de bar -assim como os buracos das estradas ou a tragédia
dos aeroportos.
Centenas de milhares de empregos estão disponíveis
todos os anos, mas não são ocupados por causa
de uma cadeia de incompetência, patrocinada com recursos
públicos. É uma cadeia que começa numa
escola que forma indivíduos incapazes de ler um manual,
passa por uma estrutura educacional que não valoriza
o ensino técnico e por empresários que não
educam seus trabalhadores, até chegar aos sistemas
sindicais patronais e de trabalhadores, que oferecem cursos
obsoletos. Há anos, empresários reclamam do
atraso de uma série de cursos do chamado "sistema
S" (Sesi e Senac) -sem falar no desvio de dinheiro que
vai para os sindicatos.
Daí que aquela experiência de transformar salas
de aula vazias em rota para o emprego é algo que ajuda
a evitar o "apagão do trabalhador" - e, de
quebra, dinamiza a educação pública.
PS - Coloquei no
site uma série de artigos críticos sobre
os programas de formação profissional no Brasil,
além de informações sobre novos cursos
técnicos e superiores que se adaptam às mudanças
do mercado de trabalho. Outro modelo a ser estudado é
uma experiência do Instituto OI Futuro: estão
ensinando jovens de escolas públicas no Nordeste a
desenvolver software para telefones celulares. A Secretaria
da Educação do Estado de São Paulo promete
para o próximo ano oferecer cursos técnicos
semipresenciais, reduzindo custos.
Coluna originalmente publicada na
Folha de S.Paulo, editoria Cotidiano.
|