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O personagem da coluna de hoje
não é um indivíduo, como de costume,
mas um prédio desconhecido, sem nenhum atrativo arquitetônico
capaz de fazê-lo figurar na história da cidade.
Trata-se do edifício que abriga
a unidade da Febem da Vila Maria. O fato de estar bem em frente
a um quartel da tropa de choque da Polícia Militar
não foi suficiente para intimidar os 38 internos que
recentemente conseguiram escapar de suas dependências
-situação que nos leva a supor que a fuga tenha
ocorrido com a conivência dos monitores. Aliás,
com base na confissão de dois jovens, foi registrado
um boletim de ocorrência, em que se relata que um monitor
lhes teria cedido uma arma. Assim se vê a que ponto
chegou a Febem.
Rebeliões e fugas fazem parte
da rotina dos jovens privados de liberdade, muitas vezes vítimas
de maus-tratos. Mas, naquele ponto da zona norte paulistana,
prepara-se uma experiência que, ainda que não
traga grandes resultados, certamente mudará um pouco
o aspecto daquilo que tem sido até hoje a Febem.
Escolheu-se aquela unidade da Vila
Maria como um laboratório de engenharia comunitária
para que os jovens não só deixem de fazer rebeliões,
encenando as costumeiras fugas, mas consigam fazer o trajeto
da prisão para o mercado de trabalho. Num reconhecimento
de suas limitações, o governo estadual iniciará,
na Vila Maria, a experiência de terceirização
da Febem, entregando-a a uma entidade especializada em educação.
Será firmado contrato de gestão,
segundo o qual a entidade deverá cumprir metas em tempo
determinado. Na Vila Maria, haverá apenas 120 adolescentes,
divididos em três grupos de 40.
A idéia é fazer as mais
diversas parcerias com a comunidade, reforçando não
só o atendimento psicológico mas também
programas de arte e tecnologia, além de projetos profissionalizantes.
A idéia é que, ao sair, o jovem já esteja
habilitado a entrar no mercado de trabalho. Para tanto, algumas
empresas se disporiam a receber menores em regime de liberdade
assistida.
Tudo isso está, por enquanto,
só no papel. Levará muito tempo até que
se possa avaliar a experiência, com início previsto
para o próximo semestre. Os riscos de fracasso são
imensos, especialmente se novos funcionários não
forem treinados. Mas, com a iniciativa, a Vila Maria, conhecida
como antigo reduto de admiradores de Jânio Quadros,
que a elegeu como bairro do coração, entra na
vanguarda da experimentação social brasileira.
Coluna originalmente publicada na
Folha de S. Paulo, na editoria Cotidiano.
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