|
Um projeto de salvação
de uma escola pública nasceu numa despretensiosa festa
e acabou virando, segunda-feira, uma referência nacional.
Ex-alunos da escola estadual Antônio
Alves Cruz, em Pinheiros, resolveram fazer, em 2000, um jantar
para se divertir e lembrar os velhos tempos de adolescentes.
A alegria se desfez quando eles, todos com mais de 40 anos,
resolveram visitar, antes da festa, a escola.
Nada fazia lembrar os velhos tempos,
quando havia aulas de teatro, oficinas de fotografia, ateliês
de arte, debates políticos e literários, numa
efervescência típica dos anos 60 e 70. Com aquele
nível educacional, não surpreenderia que Zyun
Masuda, então estudante do Alves Cruz, pudesse entrar
no concorrido curso de Medicina da USP, apesar de ser de uma
escola pública. "Chegamos a ter brigas feias,
quase saindo no braço, por causa de Capitu, quando
discutíamos o livro Dom Casmurro", lembra Masuda.
Atônitos, eles viram a lembrança
caindo aos pedaços. Paredes e muros pichados, salas
vazias, laboratórios abandonados, em meio ao rodízio
de desesperançados diretores e professores. Souberam
que o governo estadual planejava fechá-la, por falta
de alunos.
Aproveitaram a festa para, em vez
de lembrar velhos tempos, planejar novos tempos. Criaram a
Associação Fênix - referência ao
pássaro mitológico que ressurgia de suas próprias
cinzas. "Sentia-me em dívida com a escola. Não
fosse o Alves Cruz, não teria chegado onde cheguei",
diz Masuda, indicado presidente da associação.
Até chegar naquela escola, ele nem sequer falava português
direito.
Levantaram recursos para reformar
o prédio, implantaram programas extracurriculares de
artes, esportes e informática. Chamaram o Ballet Stagium
para ensinar dança. Fizeram parcerias com faculdades
da Universidade de São Paulo para capacitar os professores.
Duplicou o número de alunos,
atraídos pela qualidade de ensino -e se afastou o risco
de fechamento do Alves Cruz. Nesta segunda-feira, veio o reconhecimento
nacional. A Associação Fênix foi escolhida
pelo prêmio Itaú-Unicef, entre 1.824 projetos
brasileiros, uma das dez mais interessantes experiências
para melhorar a educação pública.
Coluna originalmente publicada na
Folha de S. Paulo, às quartas-feiras.
|