Na maioria
das vezes, a asma não é diagnosticada, ou, quando
é, o tratamento costuma não ser correto
Durante sua pós-graduação em pneumologia
na Universidade de São Paulo, Iara Fiks tomou contato
com as mais diversas estatísticas sobre a incidência
de asma, mas resolveu testá-las, por conta própria,
em campo - mais precisamente nas piscinas. "Fiquei impressionada
com a ignorância generalizada". Uma ignorância
que a ajudou a entender por que muitas crianças e adolescentes,
especialmente nesta época do ano, faltam nas escolas
ou apresentam dificuldade de aprendizado e são tachadas
de preguiçosas.
Carregando uma mala com alguns equipamentos para avaliar insuficiência
respiratória, ela começou a fazer testes durante
campeonatos de natação e percebeu que, quase
que invariavelmente, cerca de 18% dos nadadores sofriam de
algum nível de asma. Mas a maioria não se tratava
ou não se tratava corretamente. Aplicou o mesmo teste
nos mais diferentes ambientes, particularmente entre estudantes,
e a estatística se repetia. Percebeu como a asma criava
estigma entre os sem-respiração. Não
eram chamados para jogar. "Os que gostavam de futebol
tinham de optar por ser goleiro". Mas o que a tocou mais
foi ver estudantes inteligentes com problemas de aprendizado,
devido, segundo ela, ao sono difícil. Nas suas estatísticas,
58% dos asmáticos perdem aulas com certa freqüência,
um problema agravado no outono.
Na maioria das vezes a asma não é diagnosticada,
ou, quando é, o tratamento não é correto.
"Fomos percebendo o número de lendas em torno
da doença; algumas das terapias usadas, passadas de
boca em boca, parecem curandeirismos." Um dos curandeirismos,
segundo ela, é imaginar que a natação
ajuda os asmáticos. "Está comprovado cientificamente
que não ajuda." Ocorre, porém, que, para
um asmático, a natação é um dos
esportes que menos incomodam. Daí ela ter lançado
a campanha que batizou de "Adote um asmático".
A médica começou a dar palestras onde houvesse
gente disposta a ouvi-la. Esteve em academias de ginástica,
clubes e até churrascarias. Sempre aproveitava para
fazer da platéia cobaia para seus testes e mostrava
como boa parte sofria de problemas respiratórios. Mostrava
como eram improcedentes os temores de que a bomba com corticóide,
para aliviar a crise de asma, poderia matar.
Iara recebeu uma lição de André, seu
filho mais novo, que voltou da escola com fortes dores no
estômago. Todos imaginavam que o menino tivesse comido
alguma coisa estragada. O pediatra informou-a de que não
havia nenhum problema no estômago, mas no pulmão.
André teve, na verdade, uma crise de asma, atacando
o estômago. Ele, pelo menos, não precisou ser
"adotado". "O desconhecimento sobre asma é
generalizado nas escolas, a começar das escolas públicas."
Por isso, a partir desta semana, Iara resolveu ser voluntária,
na cidade de São Paulo, tratando de estudantes de escolas
pública, para fazer disso um projeto-piloto a ser disseminado
pelo país. Nesses encontros, ela planeja ter pelo menos
um ajudante para dar depoimento - seu próprio filho,
transformado em garoto-propaganda da "Adote um asmático."
Coluna originalmente
publicada na Folha de S.Paulo, editoria Cotidiano.
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