É
possível detectar rapidamente um erro de política
econômica. Não é o que ocorre na área
social
O economista Náercio Menezes, professor da USP e do
Ibmec, descobriu que o uso do computador nas escolas públicas
não modifica o desempenho dos alunos. Para ser mais
preciso, aqueles com acesso à informática têm
nota 0,03 mais alta - ou seja, nada.
Para chegar a esse resultado, contrário ao senso comum,
ele mergulhou nas notas e no perfil socioeconômico de
218 mil alunos do ensino fundamental e médio espalhados
em 5.600 escolas de todas as regiões do país.
Do cruzamento de dados apareceu uma série de fatores,
devidamente ponderados matematicamente, que ajudam o estudante
- entre os principais fatores estão a escolaridade
da mãe, ter freqüentado a pré-escola, a
existência de livros em casa e o número de aulas
por dia.
Daí se constatou que a presença dos laboratórios
de informática não fazem a diferença.
O dado é significativo porque os governantes anunciam
planos bilionários para disseminar a informática
entre os estudantes, inclusive dando-lhes notebooks. Não
significa que o acesso aos computadores seja um investimento
irrelevante, muito pelo contrário.
Mas será um desperdício se os professores não
receberem treinamento e a informática não integrar
um plano de ensino - assim como uma biblioteca não
fará efeito se os alunos não gostarem de ler.
Divulgado na semana passada, o estudo do professor Naércio
sinaliza a crescente sofisticação, traduzida
em números, para perceber como os recursos públicos
são jogados no ralo, devido ao baixo ou nulo impacto.
Na área econômica, as avaliações
são rotina. Somos informados todos os dias sobre os
níveis de emprego, de inflação, das exportações,
das importações, e assim vai. É possível
detectar rapidamente um erro de política econômica.
Não é o que ocorre na área social. Peguemos
os CEUs, tão badalados (e caros), lançados na
gestão do PT na Prefeitura de São Paulo e ampliados
na atual administração. Os equipamentos são
maravilhosos e melhoraram a paisagem da prefeitura, vendidos
como uma revolução educacional?
Nenhum CEU aparece na lista das 50 melhores escolas municipais,
avaliadas pelas notas de português e de matemática;
algumas dessas escolas estão localizadas em bairros
miseráveis. Pode-se dizer (com alguma razão)
que os CEUs ainda não tiveram tempo de mostrar resultados.
Mas também não se pode comemorar. O estudo do
professor Naércio Menezes traz a inevitável
pergunta sobre se aquela mesma verba não produziria
notas melhores caso fosse aplicada na ampliação
e melhoria da rede de pré-escolas - afinal, os alunos
que cursaram a pré-escola, segundo a pesquisa, demonstram
melhor desempenho.
Tais números diminuem o "chutômetro"
de políticas sociais e deveriam servir para inibir
a fúria de inaugurações para fixar a
imagem dos governantes. Quando Lula lançou o "Fome
Zero", técnicos advertiram que o programa estava
sem foco, baseado em dados errados. Pouco tempo depois, saiu
uma pesquisa do IBGE indicando que o problema da obesidade
é muito mais presente que o da desnutrição.
O plano contra a fome, colocado como a prioridade das prioridades,
acabou arquivado, jogando dinheiro no ralo.
Já o Bolsa Família mostra que, com pouco dinheiro,
pode-se diminuir muito mais eficazmente a pobreza e distribuir
a renda do que o aumento do salário mínimo.
Essas comparações é que, cada vez mais,
vão sustentar programas de longo prazo.
O governador Sérgio Cabral Filho viu na Colômbia
como a gestão integrada de diferentes níveis
de governos e departamentos, focada na comunidade, se traduz
em redução de gastos e aumento da eficiência.
O que explica, em boa parte, como Bogotá e Medellín
reduziram tão rapidamente seus níveis de violência.
São evidências que influenciaram a decisão
do governador de aplicar esse mesmo tipo de integração
em zonas de conflitos no Rio, evitando a pulverização
administrativa.
Vamos agora a um exemplo de desperdício anunciado.
A sofisticação dos métodos para avaliar
a relação custo-benefício está
radicalmente na contramão de uma decisão de
Lula de criar uma televisão pública ao custo
de R$ 250 milhões. Nem precisaria nenhum cálculo
refinado para perguntar se não seria o caso de fortalecer
as emissoras educativas públicas já existentes,
todas frágeis, em vez de criar uma concorrente delas.
Esse é mais um caso, entre tantos, em que sentimos
o cheiro do ralo.
PS- Bem empregado, o computador é um valiosíssimo
instrumento para estimular o aprendizado. Tenho visto, dentro
e fora do país, as maravilhas da educomunicação
- a comunicação aplicada à educação.
Descobre-se o encanto de aprender através da produção
de vídeos, blogs, fanzines, jornais, fotografias, rádio
e televisão. São recursos que ajudam a dar sentido
aos conteúdos das salas de aula, estimulam o ensino
da língua e desenvolvem a auto-estima do aluno. Separei,
no site, experiências,
no Brasil, de comprovado sucesso no uso da comunicação
para estudantes, algumas delas em fase de disseminação
na rede pública.
Coluna originalmente publicada na Folha de S.Paulo,
editoria Cotidiano.
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