A
moda levou Ana Strumpf, por acaso, a mexer na própria
estampa de um pequeno pedaço da cidade de São
Paulo
Desde a adolescência, Ana Strumpf, 28, sabia que iria
viver da moda. Suas viagens de turismo para os locais mais
exóticos, como vilarejos no interior do Brasil, da
Índia ou do México, faziam com que pudesse pesquisar
sobre diferentes materiais e cores para roupas e acessórios.
Isso significa que tinham, para ela, o mesmo valor uma festa
junina no sertão da Bahia ou um ritual religioso às
margens do rio Ganges.
"As viagens significavam uma coleção de
estampas." A moda levou-a, por acaso, a mexer na própria
estampa de um pequeno pedaço da cidade de São
Paulo.
Para tocar os seus próprios negócios, Ana resolveu
se matricular num curso de administração na
Faap (Fundação Armando Álvares Penteado).
"Logo vi que não tinha nada a ver." Preferiu,
então, estudar apenas moda. Fez cursos em Nova York,
onde trabalhou como vendedora numa badalada loja de roupas
e peças de decoração. "Mais do que
o dinheiro que ganhava como vendedora, valia o estágio."
Logo abriria uma sobreloja na rua Oscar Freire, com suas próprias
invenções, mas teve de sair de lá, cercada
de grifes por todos os lados, e sentiu-se solitária
ao alugar um espaço na rua Bela Cintra, nos Jardins
-e, por isso, tornou-se uma espécie de corretora imobiliária
voluntária.
Ao lado de seu espaço, inaugurado no início
deste ano, havia cinco pequenas lojas, todas elas abandonadas
há muitos anos. "Fiquei curiosa em saber por que
aquelas lojas não estavam alugadas." Acabou por
descobrir que todas eram de um único dono, decidido
a alugar os espaços para apenas um inquilino, cansado
de gerir tantos aluguéis. Ele nem se mostrava disposto
a conversar.
Ana viu ali a chance de criar um novo ponto da moda, longe
da abarrotada e cara Oscar Freire -ainda mais cara e abarrotada
depois das reformas nas calçadas. Ela viu, em Nova
York, como muitos bairros aprendiam a desenvolver vocações.
Começou a chamar, então, designers dos mais
diferentes tipos de roupa e acessórios e os levou para
ver os espaços. Um dos convidados foi o estilista Marcelo
Sommer, uma das estrelas da moda paulistana, que topou se
mudar para lá.
Vieram então mais quatro designers interessados em
se mudar para outro lugar e criar um novo ponto da moda na
cidade. Com isso, Ana Strumpf voltou ao resistente proprietário
e apresentou o perfil dos candidatos a futuros inquilinos.
Ele aceitou fazer o negócio. Quem passa agora pela
esquina da alameda Franca com a Bela Cinta observa uma agitação
de operários. A inauguração das cinco
lojas está prevista para o início do próximo
mês. "Já não me sinto mais sozinha."
Sozinha não estará mais. Terá a chance
não só de bater papo com os novos vizinhos,
mas de movimentar a rua e atrair para aquele ponto uma nova
clientela. Se os negócios vão dar certo, não
se sabe. O que se sabe é que pelo menos um pequeno
ponto da cidade, abandonado, ganhou uma nova estampa.
Coluna originalmente
publicada na Folha de S.Paulo, editoria Cotidiano.
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