Atentos aos horários dos
caminhões de coleta, eles adiantam-se para promover,
a seu modo, a propalada coleta seletiva, que é base
da indústria da reciclagem, atividade em franca expansão
e que recentemente deu ao país o orgulhoso título
de campeão mundial em reciclagem de alumínio.
Em Salvador, de acordo com estimativas do Centro de Estudos
Socioambientais - Pangea, cerca de 10 mil pessoas ocupa-se
desta atividade.
Eles não têm noção da importância
do que fazem para o meio ambiente, embora sejam considerados
legítimos ambientalistas. Os números da coleta
seletiva feita pelos catadores superam em muito os da coleta
oficial. Pelas mãos dos catadores de Salvador chegam,
por mês, à indústria, a custo zero para
a prefeitura, estimadamente 100 toneladas de garrafas pet,
280 toneladas de papel e papelão (dados do maior comprador),
21 de alumínio e ... de outros metais. Enquanto isso,
a prefeitura gasta ....para levar cerca de 200 toneladas/mês
para reciclagem.
Por falta de apoio e proteção social a maioria
dos catadores fazem o trabalho individualmente em condições
extremamente precárias. “Eles estão sujeitos
a uma cadeia perversa de atravessadores que lhes compram os
materiais a preços irrisórios e conseguem lucros
de até 200%”, observou o diretor Pangea, Antonio
Bunchaft. Apenas 5 a 10 % do total de materiais recicláveis
coletados são provenientes de cooperativas de catadores
ou de outras formas de associação da categoria,
informou ele.
Para a pesquisadora e doutora em resíduos sólidos
pela Universidade Estadual de Feira de Santana - Uefs, Fátima
Nunesmaia, os altos índices de reciclagem do país,
principalmente em alumínio, não pode ser atribuída
a uma maior consciência da classe média, mas
no fato de os pobres estarem buscando a sobrevivência
nesse mercado. “Além disso, eles estão
ajudando a prefeitura a gastar menos com a coleta feita por
empresas”, diz. Para ela, a prefeitura deveria reconhecer
isso e oferecer como contrapartida mais investimento na organização
dos catadores em cooperativas. “Não fazer isso
é contribuir para o agravamento do quadro de miséria
social”, avaliou.
Ajuda do Canadá
A empresa pública de limpeza urbana, Limpurb,
ainda não sabe quantas pessoas catam materiais recicláveis
pelas ruas de Salvador. Em documento da empresa, de 2003,
há referência à realização
de um cadastramento, mas, até o momento não
passa da intenção. O diretor da empresa, Jalon
Oliveira, disse que uma equipe multidisciplinar está
fazendo o diagnóstico da situação. Na
sua avaliação, porém, será difícil
tirar os catadores da informalidade. “Muitos se recusam
à idéia do trabalho cooperativado por causa
das regras. Eles não querem sair da informalidade”,
disse.
A ação mais objetiva da empresa neste sentido
é a formação de 170 agentes de limpeza
na comunidade de Bariri, no Vale do Ogunjá. Os agentes
são moradores que se ocuparão da coleta de lixo
onde os caminhões compactadores não conseguem
chegar. Em troca, receberão vale alimento da cesta
do povo e serão incentivados a vender o material reciclável.
A coleta seletiva feita pela Limpurb é cara, segundo
o diretor. O alto custo se deve principalmente ao uso de equipamentos
de alta tecnologia para separar o material recolhido nos 61
Postos de Entrega Voluntária - Pevs. O resíduo
é doado para a cooperativa Coopcicla, que tem unidades
em sete portas e na canabrava. Com recipientes específicos
para plástico, metal, vidro e papel, os pevs atendem
aos mesmos pressupostos da coleta seletiva das cidades dos
países desenvolvidos, mas ainda respondem por muito
pouco lixo reciclável. Apenas 8 toneladas das 2.300
coletadas diariamente.
Para corrigir os rumos do programa de coleta seletiva, a
Limpurb aposta em técnicos do Canadá que, em
acordo de cooperação técnica com a prefeitura,
vão testar novas metodologias. Entre os problemas já
detectados estão a falta de adesão da população
à idéia da separação do lixo e
a concorrência dos catadores que, segundo Jalon “atacam”
os conteineres para a retirada do material antes da passagem
dos caminhões. Chegam até a colocar crianças
dentro das caixas para facilitar.
Jalon acha que o mercado de reciclagem ainda não
é atrativo. Ele repete o que disse há cerca
de quatro anos, quando o mercado centrava-se basicamente na
reciclagem de latinhas. Para ele, a não-aprovação
do projeto de lei que define a política nacinal de
resíduos sólidos e que obriga os fabricantes
a recolherem as embalagens contribui para isso. “Hoje,
esta responsabilidade recai sobre as prefeituras que têm
que pagar a coleta”.
MAIZA DE ANDRADE
do jornal A Tarde, Salvador - BA
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