A coordenadora administrativa Patrícia dos Anjos Miranda
até já se acostumou. Sempre que usa sua bolsa
transparente, cheia de florzinhas, aparece alguém querendo
saber onde conseguir uma igual. Um dia, um rapaz chegou a
abordar Patrícia no aeroporto de Florianópolis,
em Santa Catarina. Ele queria porque queria uma igual para
dar de presente. Ela não pensou duas vezes: tirou tudo
de dentro da sua e a vendeu ao interessado. Detalhe: a bolsa
que tanto encanta é inteiramente feita de Pet. E tem
sido motivo de mobilização de 99% dos moradores
da Rua Fernandes Pinheiro, na Penha, Zona Norte carioca.
Os vizinhos entraram na onda da dona-de-casa Maria José
de Oliveira Teixeira, a Zezé, de 46 anos, que resolveu
usar garrafas Pet como matéria-prima para uma variedade
de objetos: bolsas, porta-moedas, flores. Aprendi que
a gente tem que valorizar mais o lixo. Quando a gente joga
certas coisas fora, na verdade está jogando dinheiro
pela janela, explica Zezé.
Praticamente toda a rua passou a contribuir para manter o
estoque de Zezé em alta. Em vez de jogar fora as garrafas
vazias de refrigerante, o pessoal as deposita nos sacos de
100 litros que ficam no quintal da artesã. Sempre
tem uma criança batendo no portão para entregar
garrafas, conta a recepcionista Juliana de Oliveira
Teixeira, filha de Zezé. No quartinho da lavanderia,
no segundo andar da casa, não há lugar para
mais nada. É só Pet.
Bolsas em Floripa
As bolsas têm mesmo despertado interesse por onde
passam. Em agosto, a estada de Patrícia, amiga de Zezé,
por Florianópolis, rendeu ainda uma venda em consignação
de oito delas para uma loja perto do aeroporto. Agradaram
tanto que, em setembro, foi preciso mandar mais 30.
Daqui a pouco eles devem pedir mais, comemora
Patrícia, 25 anos, transformada em garota-propaganda.
Recentemente, seu marido foi levado para a emergência
de um hospital e uma das enfermeiras também se interessou
pela bolsa. Mais uma vez, Patrícia tratou de vender
mais uma, colaborando para o sucesso da iniciativa da amiga
Zezé.
A própria artesã nem acredita em tantos pedidos.
É muito bom imaginar que tem gente que eu nem
conheço usando algo que eu fiz, diz Zezé,
sorridente.
Por enquanto, Zezé tem vendido as bolsas só
no boca-a-boca. A R$ 15 (as forradas custam R$ 17), R$ 5 (necessaire)
e R$ 3 (porta-moedas), elas têm garantido uma renda
mensal ainda pequena, algo em torno dos R$ 300. Mas a artesã
se anima por estar fazendo exatamente o que gosta. Só
de ver as bolsas prontas já é uma realização,
afirma.
Em média, ela faz duas ou três por dia. Mais
ou menos 40 bolsas por mês, das quais metade encontra
compradores. A outra metade anda engrossando o estoque que
Zezé está fazendo para vender na praia de Copacabana
durante o verão.
Dá trabalho, mas de cada garrafa Pet que ela recebe,
tudo é aproveitado. Para cada bolsa, são 15
a 16 Pets a menos poluindo o ambiente. Até os retalhos
que sobram têm destino certo. Zezé manda tudo
para a igreja Nossa Senhora de Fátima, ali mesmo no
bairro, que está reformando suas instalações
à custa da revenda desse material. Todos os fiéis
colaboram.
As bolsas são resultado de um trabalho verdadeiramente
artesanal, a custo praticamente zero. São formadas
por vários quadrados de Pet, cortados e costurados
a mão. Em cada um deles, há desenhos de flores,
pacientemente feitos com a ajuda de uma ponteira aquecida.
Compromisso para o verão
Tudo começou há mais ou menos um ano, quando
Zezé e o marido, o aposentado Luís Monteiro
da Silva, de 75 anos, foram a uma exposição
de artigos reciclados na Marina da Glória. Ela se encantou
com o reaproveitamento daquele material. Daí às
aulas na Recicloteca - um Centro de Informações
sobre Reciclagem e Meio Ambiente criado pela ONG Ecomarapendi
e patrocinado pela AmBev para informar sobre questões
ambientais foi só mais um passo. Na natureza,
as garrafas demoram mais de 100 anos para se desfazer. Nesse
meio tempo elas podem muito bem virar bolsas, diz Zezé.
De cada garrafa aproveita-se tudo. A parte superior, cortada
e virada de cabeça para baixo, como um copo, serve
como suporte para pétalas de flores, que ficam acondicionadas
na parte interna da rosca. O fundo pode ser usado para guirlandas
natalinas. A parte do meio é a mais requisitada por
Zezé para suas bolsas. Só a tampa é jogada
fora.
Zezé não se incomoda de ensinar a quem quiser
aprender. Para ela, mais vale passar adiante informações
sobre o reaproveitamento de material reciclável. No
início ninguém acreditava que as bolsas eram
feitas com Pet. Antes de vê-las prontas, tinha gente
que até torcia o nariz. Mas conferindo a qualidade
do trabalho, a maioria muda de idéia, fala a
filha de Zezé.
Juliana, por sinal, não pára de receber encomendas.
A gente nem precisa fazer propaganda. Bastou aparecer
com a primeira bolsa - uma rosa que já está
velhinha de uso - para as colegas de escola fazerem encomendas,
conta.
Melhor do que couro
A amiga Patrícia também elogia: Carrego
Bíblia, agenda, necessaire, e mais um monte de bugigangas
nelas. A de couro não agüentou, mas a de Pet continua
novinha. Elas são resistentes, fáceis de limpar,
práticas e chamam a atenção, enumera.
Entusiasmados com a produção de Zezé,
os vizinhos e parentes não se acanham de recolher o
Pet onde quer que ele apareça. Juliana já chegou
a levar para casa sacos cheios de matéria-prima para
a mãe. A única coisa que eu não
gosto é quando ela cisma de catar garrafas e lacres
de latinha de refrigerante no shopping. Morro de vergonha
porque o shopping não é lugar para isso. Nos
outros lugares, tudo bem, fala.
Patrícia recolhe as garrafas nas festas que freqüenta.
Normalmente são em casa de conhecidos, por isso
não me incomodo de pedir. O que não posso é
deixar tantas garrafas irem para o lixo sabendo no que elas
podem se transformar, diz.
O marido de Zezé também faz o que pode para
ajudar. Sai à noite para ajudar a recolher garrafas
na rua, armazena-as em casa, recorta e fura os quadradinhos
no Pet para a mulher. Falam muito sobre a necessidade
de cada um fazer a sua parte para tornar o mundo um lugar
melhor. A Zezé está fazendo a parte dela. Se
os outros também fizessem, o mundo estaria bem melhor.
Ou pelo menos mais limpo, diz Luís.
Para este verão, ele até já tem compromisso.
Pretendo encher o carro com bolsas e flores para vender
na praia de Copacabana. A filha Juliana dá a maior
força: Ainda mais que, para ir à praia,
essas bolsas são super práticas. Elas vão
bombar!
VILMA HOMERO
do site EcoPop
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