"Há dois caminhos diante
de nós: o caminho do pão e o caminho da bomba
atômica. É preciso escolher sem vacilação.
Eu simbolizo pelo caminho do pão, o caminho da justiça
social para dar pão a todos os que têm fome”,
escreveu Josué de Castro (1908-1973), médico
pernambucano, no artigo intitulado Aos Pobres Pertence o Reino
da Terra.
Em homenagem a ele, durante a reunião do Conselho
Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA),
realizada no dia 26 de outubro, foi realizado o pré-lançamento
do vídeo Josué de Castro – Por um Mundo
sem Fome, de Tânia Quaresma. O documentário faz
parte do Projeto Memória, da Fundação
Banco do Brasil. No dia 25 de novembro o vídeo terá
seu lançamento no Rio de Janeiro.
Após a apresentação da obra, o presidente
do CONSEA, Chico Menezes, lembrou que Josué de Castro
é patrono do conselho, o que faz com que o vídeo
tenha uma importância particular para seus membros.
“O vídeo tem papel especial para nós e
para o público jovem, para o qual é direcionado,
entendo que colocou o assunto de uma forma muito boa. Não
infantiliza a questão, mas torna acessível um
tema que é de todos”, comentou.
O presidente da Fundação Banco do Brasil, Jacques
Pena, ressaltou o orgulho da instituição ao
homenagear um brasileiro como Josué de Castro, que
morreu no exílio, sem nunca ter abandonado seus ideais.
Ele lembrou ainda que o vídeo produzido a partir da
parceria entre a Fundação, a Petrobras e o Centro
Josué de Castro do Recife, “poderá ser
usado no trabalho que está sendo feito no combate à
fome no Brasil”.
Jacques Pena aproveitou a oportunidade para anunciar que,
em 2005, o Projeto Memória irá homenagear o
professor Paulo Freire. O projeto existe desde 1997 e foi
criado para valorizar a cultura e a história do nosso
país, destacando personalidades e celebrando fatos
que ajudaram a construir a identidade nacional e fortalecer
a cidadania do povo brasileiro.
Produção
O vídeo será distribuído em
cinco mil bibliotecas públicas brasileiras. Utilizar
uma linguagem dirigida aos jovens não foi uma dificuldade
para a diretora Tânia Quaresma, que trabalha desde 1989
com o Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua, onde
ensina sobre os conceitos de comunicação áudio-visual
e realiza oficinas de vídeo.
A produção exigiu o trabalho de quinze profissionais,
durante três meses, e se baseou no depoimento de diversas
pessoas sobre o personagem central e também sobre a
questão da fome, a partir da descrição
do dia-a-dia de comunidades excluídas.
O cenário principal é a Ilha de Deus, no Recife.
Uma comunidade carente, com cerca de 1,5 mil pessoas. O local
foi escolhido porque Josué de Castro teve grande parte
de seu trabalho nos mangues do Recife.
O resultado foi uma obra produzida junto com os moradores
desta comunidade, em um mês de viagem pela região
e quinze dias de convivência diária com os moradores
da Ilha de Deus. Crianças e adultos aparecem no vídeo
contando a história de Josué de Castro a partir
do que aprendiam em oficinas realizadas pela equipe de produção
do vídeo.
“Nós gravávamos e já os mostrávamos
para eles mesmos. Também mostrávamos depoimentos
de outras pessoas sobre o Josué. Isso foi muito interessante,
porque as pessoas da comunidade se reconheciam e passaram
a se reconhecer no que Josué de Castro dizia”,
lembra Tânia Quaresma.
Entre outros, há depoimentos do presidente Luiz Inácio
Lula da Silva, do cantor e compositor Chico Science, do senador
Cristovam Buarque, do assessor especial da Presidência
da República, Frei Betto, e da filha de Josué
de Castro, a socióloga Anna Castro.
O depoimento de Lula é fragmento de um discurso onde
ele se diz seguidor do “homem que escreveu a Geografia
da Fome”. Este homem é Josué de Castro.
O presidente da República faz as crianças rirem
com seu jeito engraçado de contar o passado triste.
Ele lembra histórias de quando era criança,
de quando levava marmita para o trabalho e das vezes que teve
vergonha “por não ter mistura para acompanhar
o feijão com arroz”.
O senador Cristovam Buarque destaca, em seu depoimento, que
Josué de Castro “percebeu, antes de todo mundo,
que é preciso aumentar a riqueza, mas também
diminuir a pobreza, e que estas duas coisas não são
iguais”.
Desta percepção resultaram 29 livros, traduzidos
em 25 idiomas. Entre eles, Homens e Caranguejos (1967), Geopolítica
da Fome (1951) e Geografia da Fome (1946). Além de
médico e escritor, Josué também foi cientista,
professor e político, tendo sido eleito deputado federal
pelo estado de Pernambuco por duas vezes.
Em 1952, Castro chegou à presidência do conselho
executivo da Organização das Nações
Unidas para a Agricultura e a Alimentação (FAO).
Após deixar o cargo, em 1957, fundou a Associação
Mundial de Luta contra a Fome (ASCOFAM). Em 1963 e 1970, recebeu
indicações para o Prêmio Nobel da Paz.
A diretora Tânia Quaresma conta que uma das líderes
comunitárias da Ilha de Deus, conhecida como Beró,
se sensibilizou ao ver os trechos gravados que iam sendo apresentados
durante a produção e compôs uma música
em homenagem a Josué de Castro. A canção
encerra o vídeo.
Depois deste trabalho, Tânia percebe que mudou sua
forma de ver a questão da fome. “Eu acho que,
a partir do trabalho de Josué de Castro, pode-se perceber
a diferença das fomes. Pode ser falta de nutrientes,
de cultura, de lazer... E também a análise histórica
que ele faz mostra que a fome tem que ser tratada como uma
questão política. A fome não é
natural, ela foi criada pelo sistema”, explica a diretora,
que deixa um recado para o Brasil que não conhece Josué
de Castro: “As pessoas poderiam procurar saber mais
sobre o Josué, entrar no site que a Fundação
Banco do Brasil desenvolveu sobre ele [www.projetomemoria.art.br].
Porque o trabalho de mapeamento da fome que ele realizou fez
com que seu nome se transformasse em referência em vários
lugares do mundo e aqui muita gente não o conhece”.
As informações são
da Fundação Banco do Brasil.
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