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Dar um novo foco para o cotidiano
das comunidades das favelas do Rio de Janeiro foi o que motivou
o jovem fotógrafo Vincent Rosenblatt a criar a ONG
Olhares do Morro, localizada no coração do morro
Santa Marta. Um verdadeiro núcleo de criação
de imagens, onde moradores de comunidades do Vidigal, Rocinha
e Santa Marta aprendem a documentar pela arte da fotografia
a intensa vida social e cultural das favelas, na intenção
de explorar o que a mídia teima em não mostrar
para o grande público.
Dar um novo foco para o cotidiano
das comunidades das favelas do Rio de Janeiro foi o que motivou
o jovem fotógrafo Vincent Rosenblatt a criar a ONG
Olhares do Morro, localizada no coração do morro
Santa Marta. Um verdadeiro núcleo de criação
de imagens, onde moradores de comunidades do Vidigal, Rocinha
e Santa Marta aprendem a documentar pela arte da fotografia
a intensa vida social e cultural das favelas, na intenção
de explorar o que a mídia teima em não mostrar
para o grande público. O projeto é grandioso
e conta com o olhar sensível e coletivo de pessoas
que querem e sentem a necessidade de se expressar para o mundo.
Tudo sob o olhar apurado de um estrangeiro de apenas 31 anos
de idade, cheio de garra e entusiasmo que, além de
amante da fotografia, se apaixonou pela história e
comportamento de pessoas que, muitas vezes, sofrem vários
tipos de discriminação. Destaque para a exposição
da ONG, Olhares do Morro – Um Manifesto Visual, em cartaz
no Espaço Furnas Cultural, em Botafogo, até
dia 27 de junho.
Quando surgiu Olhares do Morro.
E de onde veio a idéia desta iniciativa?
Faz dois anos que estamos em atividade.
Quando estive no Brasil pela primeira vez, em 1999, me senti
tocado com a realidade vivida nas favelas tanto em São
Paulo como no Rio de Janeiro. Estudava na Escola Superior
de Belas Artes de Paris e vim fazer um intercâmbio aqui
que deveria durar três meses. Me beneficiei do programa
“Residência de Artista”, do Serviço
de Cultura do Consulado da França no Rio de Janeiro.
Meu encanto foi tanto pela riqueza cultural deste povo e tamanho
meu interesse pela problemática social e ambiental,
que acabei ficando nove meses. Em 2000, voltei para a França
e no ano seguinte estava outra vez no Brasil. Foi uma época
em que fiz algumas reportagens e comecei a idealizar o que
viria a se chamar Olhares do Morro.
O que fazia quando morava na França?
Trabalhava em coberturas jornalísticas,
principalmente para a imprensa francesa. Fiz muitas reportagens
no leste da Europa, paralelamente ao meu trabalho pessoal
de expressão fotográfica. Posso dizer que tenho
uma experiência em duas áreas que normalmente
se comunicam pouco: de um lado, o documento, o jornalismo,
e do outro, a fotografia inserida no mercado da arte contemporânea.
Daí uma grande abertura – sem preconceito –
sobre o que deveria ser “uma boa fotografia” dentro
do nosso Núcleo de Expressão Visual.
O objetivo principal do projeto
é capacitar os moradores formando uma rede de correspondentes
dentro das comunidades, para a criação de um
acervo de imagens. Qual a idade destes moradores? Qual a finalidade
deste acervo de imagens?
Em geral os participantes do projeto
são jovens com faixa etária entre 15 e 29 anos.
Com este acervo em constante crescimento, produzido pelos
jovens autores, tentamos conquistar um espaço na mídia
para outras imagens, longe do monopólio das representações
da violência que predominam quando o tema é favela.
São imagens criativas que mostram as reivindicações
dos moradores, o lado da vivencia, do cotidiano, a riqueza
das culturas fervendo nesses bairros. De fato, quem mora na
favela – falo da imensa maioria que não tem a
ver com o tráfico – não pode se identificar
com a imagem que a grande mídia reflete. Pelo contrário,
nosso trabalho tende a resgatar a auto-estima.
No “asfalto”, pessoas que nunca entraram numa
favela estão constantemente assustadas com o que vêm
nas capas de jornais e na TV. Essa exposição,
nosso “Manifesto Visual”, constitui uma ponte
de encontro entre os cidadãos do asfalto e dos morros
do Rio de Janeiro.
Entretanto, a emergência para
juventude das favelas é conseguir uma renda. Então,
o objetivo principal da nossa Agência de Imagens das
favelas é de responder a demanda nacional e internacional
de fotografias deste tema através de acesso virtual,
exposições itinerantes e edição
de livros. Comercializamos estas imagens para jornais e revistas,
grandes empresas (com atividades editoriais voltadas para
responsabilidade social), agências de publicidade, ONGs,
veículos de comunicação, coleções
públicas e privadas e para quem se interessar. Também,
longe de se restringir aos morros, os jovens fotógrafos
recebem encomendas para reportagens diversas. Quando uma imagem
é vendida, 60% do valor vai para o autor, 40% para
a ONG como forma de manter as atividades, comprar os insumos
da fotografia e contribuir com o pagamento dos cursos que
conseguimos para os jovens em instituições conceituadas,
como o Ateliê da Imagem, na Urca.
Como se processam as aulas de
fotografia nas comunidades? Que tipos de profissionais estão
envolvidos?
O Núcleo está aberto de quarta a domingo,
de 14h às 18 h. Os monitores do projeto – antigos
alunos experientes – repassam aos novatos o aprendizado
recebido no Ateliê da Imagem. Esta conceituada escola
de fotografia concede cursos com custo menor para os alunos
mais motivados do nosso Núcleo de Expressão
Visual (NEV). Dentro do NEV-1, no morro, o jovem autor aprende
o básico da fotografia, manuseio de câmeras,
revelação de filmes e ampliação.
Também, uma iniciação a digitalização
das imagens e Photoshop. O objetivo é saber controlar
todas as etapas de produção das fotografias.
Uma tarde por semana, temos uma oficina de redação,
com apoio de jornalistas profissionais, que ajudam a desenvolver
as matérias que acompanham as imagens. Recebemos regularmente
artistas brasileiros ou estrangeiros, repórteres conceituados
que vêm dar aulas e voluntários que ministram
palestras variadas. Muitos profissionais do mundo da imagem
se cadastram e entram em contato através do nosso site.
Por que o local escolhido para
esse pólo foi o morro Santa Marta?
Fui convidado, em junho 2002, a dar uma palestra em um
curso de liderança que estava sendo realizado na Associação
de Moradores. Foi nesta ocasião que distribuí
as primeiras câmeras descartáveis e conheci os
primeiros jovens autores. Com alguns desses primeiros alunos
constituí o Núcleo de Expressão Visual.
Quem apóia Olhares do Morro?
De que maneira?
Estamos tecendo, aos poucos, uma rede de parcerias na
cidade com empresas de excelência do mundo da imagem:
grandes laboratórios, como a SpeedLab e Studio Oficina,
escolas – já falei do Ateliê da Imagem.
A Selulloid AG, agência de comunicação
customizada (editora da Revista da Oi, entre outros produtos
de alta qualidade), até empresas de transporte de obras
de arte. Recebemos apoio da FNAC Barra Shopping e apoio institucional
da Unesco (vamos expor na sede mundial, em Paris, em outubro
deste ano) e do Consulado da França. Devo citar também
as empresas que fazem nossa assessoria empresarial, contabilidade
e auditoria: a Maximum Services e a High Quality, que garantam
o profissionalismo da nossa administração. Tentamos
sempre aprimorar nossas relações com as empresas
do ciclo de produção das imagens - os empresários
aprendem a conhecer os jovens do projeto,e surgem estágios
e até empregos: a Speedlab, por exemplo, convidou na
semana passada um aluno do Vidigal para trabalhar. Sabemos
que não são todos jovens que vão conseguir
viver da fotografia, mas dentro do grupo, pode surgir um excelente
produtor gráfico, um mestre da Arte Digital, um especialista
da restauração das fotografias, um outro será
webmaster e outros webdesigners... Quero dizer, são
atividades de alta tecnicidade que pagam bem. É disso
que os jovens das comunidades de baixa renda precisam. Ter
acesso a formação e empregos do tipo “primeiro
mundo”. Infelizmente, até hoje não conseguimos
um grande patrocinador ou investidor. Mas, graças ao
apoio (muitas vezes sob forma de serviços e permuta)
das pequenas e médias empresas, conseguimos manter
a atividade. É uma luta sem trégua, mas nunca
vamos desistir, pois o projeto é valido.
Quantas pessoas estão cadastradas
neste projeto?
Neste momento particular de recursos
fracos, só podemos receber 15 jovens autores. Mas,
no acervo da nossa agência de imagem, já existem
fotos de 40 pessoas que passaram pelas aulas do Núcleo.
Sem contar com os profissionais da área de design e
comunicação visual, e a participação
do ensino voluntário dos profissionais que se cadastraram
pelo site. Para participar é só preencher uma
ficha no nosso site – www.olharesdomorro.org. Uma observação
que cabe aqui é que tem muita gente “do asfalto”,
jornalistas e fotógrafos, que querem dedicar algumas
horas para dar aulas.
E pela sua experiência, qual
a relação destes moradores com a fotografia?
Ter uma máquina nas mãos
significa poder mostrar para o mundo o que muita gente não
sabe. Mostrar, por exemplo, que em um espaço cheio
de becos e vielas, há um morador “arquiteto”
do seu lar, que dribla a adversidade e improvisa seu abastecimento
de água e seu saneamento básico. Mostrar o carinho
e a intimidade, as relações interpessoais de
uma comunidade. Mostrar ainda que o povo das favelas, com
sua miscigenação, também embeleza as
praias do Rio. No Santa Marta, ter jovens percorrendo o morro
com câmera na mão já é cultura,
faz parte da paisagem e ninguém estranha. Para ter
uma mídia representativa e legítima no país,
precisamos ter mais jornalistas oriundos das classes populares.
Nosso núcleo é um viveiro de onde vão
surgir esses novos talentos.
Além de Santa Marta, Vidigal
e Rocinha, vocês pretendem estender as atividades de
Olhares do Morro?
A intenção é
constituir uma rede - sempre aberta a novos talentos - de
correspondentes / alunos em várias favelas do Rio.
Queremos atingir os jovens da Zona Oeste também, da
Zona Norte. Dar uma maior representatividade ao acervo da
nossa Agencia de Imagens das Favelas, além de implantar
um outro núcleo no asfalto. Nesse novo espaço,
as aulas serão também abertas para alunos de
maior poder aquisitivo, que ajudarão a manter os ensinamentos
dos jovens nas favelas. E será bem mais fácil
para receber os professores voluntários.
Além do site, da exposição, através
de que outros canais vocês divulgam o trabalho?
Além da comercialização de nossa
produção pelo site www.olharesdomorro.org, em
breve teremos produtos derivados. Cartões postais e
camisetas a serem comercializados. A edição
de um livro também está em desenvolvimento.
Como foi a articulação
para a montagem da exposição no Espaço
Furnas Cultural?
Furnas nos ofereceu um verdadeiro presente, patrocinando
toda realização da exposição assim
como a campanha de divulgação. Ter um bom trabalho
para mostrar não adianta, se não tem assessoria
de comunicação e publicidade para fazer chegar
a informação até o publico. Quer dizer
que trabalhar com Furnas foi ótimo. A equipe da Coordenação
de Responsabilidade social é extremamente profissional.
O fato do escritório central de Furnas estar quase
na frente da comunidade de Santa Marta ajudou bastante –
pois a empresa tem naturalmente como uma de suas prioridades
atuar nas áreas carentes da vizinhança.
Como você classificaria
a exposição Olhares do Morro – Um Manifesto
Visual?
A exposição retrata
uma arquitetura peculiar, que sabe tão bem driblar
obstáculos topográficos: valoriza os moradores
como os autores do espaço onde eles vivem, ao contrario
da cidade “planejada” do “asfalto”.
Além de questões ambientais e saneamento básico,
sem deixar de lado a ginga, a alegria e os maneirismos dos
moradores deste espaço em perpétua evolução.
Pode ser apenas uma “gota d´água”
contra um oceano de imagens da violência, mas a felicidade
nos olhos do público e os inúmeros parabéns
deixados no livro dos visitantes nos indicam que estamos no
caminho certo.
Além de livros, exposições
e Internet, quais são os outros projetos da ONG Olhares
do Morro – fotografia e cidadania ? O que já
está em andamento?
O próximo passo será
conseguir um espaço ‘no asfalto’ para dar
uma sede à nossa Agência de Imagens das Favelas
e acolher alunos de todas elas, independentemente das lutas
de facções. Um espaço neutro onde todos
vão poder se encontrar. Essa agência e escola,
o NEV J - Núcleo de Expressão Visual e Jornalismo,
será um espaço de capacitação
permanente e permitirá a participação
e ensino de outros profissionais e artistas, com acesso mais
fácil que o atual núcleo no morro. Por isso,
temos agora que convencer nossos atuais parceiros e novos
investidores, além de lutar para alcançar a
sustentabilidade. Desenvolver produtos derivados, vender mais
imagens. Neste sentido, estamos bem perto de fechar uma parceria
com uma grande agência de imagens internacional, para
atingir muito mais clientes para nossa produção.
O intuito é de ter uma visão macro de toda a
cadeia de produção e distribuição
das imagens. Desde o aprendizado no morro, o aperfeiçoamento
nas escolas e empresas parceiras, até a comercialização
via Internet, tentando atender nossos clientes com o máximo
de profissionalismo, numa abordagem empresarial.
As informações são
do site www.goldeletra.org.br.
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