O Brasil tem avançado no cumprimento dos Objetivos
de Desenvolvimento do Milênio, mas em várias
áreas o desempenho do país ainda esbarra em
discrepâncias regionais e desigualdades entre ricos
e pobres, negros e brancos, zona rural e zona urbana e homem
e mulher. É o que aponta o estudo Objetivos de Desenvolvimento
do Milênio — Relatório Nacional de Acompanhamento,
elaborado pelo governo brasileiro e pelo Sistema das Nações
Unidas no Brasil, e divulgado na semana passada pelo IPEA
(Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) e pelo IBGE
(Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
A pesquisa analisa pela primeira vez a performance brasileira
em cada um dos oito Objetivos — um conjunto de metas
socioeconômicas que os países da ONU, em 2000,
se comprometeram a atingir até 2015. O relatório
mostra que, mantida a tendência recente, o Brasil deve
cumprir a maioria dos compromissos ligados a pobreza, educação
e saúde; em saneamento e moradia, é preciso
aumentar os esforços. Em algumas áreas, o país
não dispõe de indicadores recentes ou adequados
para avaliar o grau de avanço ou retrocesso.
“A década de 1990 apresentou uma série
de melhorias nos indicadores selecionados. No entanto, o Brasil
ainda está longe de atingir um patamar de bem-estar
social compatível com seu nível de riqueza e
desenvolvimento — apesar de o país já
ter avançado em diversas políticas e programas
na área social”, afirma o documento.
Pobreza
Segundo o relatório, o Brasil está prestes
a atingir a meta primeira meta dos Objetivos, que prevê
reduzir pela metade a proporção de pessoas em
situação de extrema pobreza — ou seja,
vivendo com menos de um dólar por dia, ajustado pela
paridade do poder de compra. Em 1990, ano de referência
para os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, 8,8%
dos brasileiros estavam abaixo dessa faixa; em 2000, eram
4,7%. Para o Brasil cumprir a meta, essa porcentagem deve
cair para 4,4% até 2015.
A pesquisa salienta, porém, que a queda foi significativa
no período entre 1994 e 1995, quando a inflação
foi debelada. Depois disso, houve uma “relativa estagnação”.
“Seja qual for o ‘termômetro’ usado,
o número absoluto de pessoas na extrema pobreza no
Brasil ainda é muito alto, a ponto de superar o total
da população de muitos países. Os muito
pobres podem ser 8 milhões ou 17 milhões, dependendo
de onde se traça a linha de indigência”,
ressalva o estudo.
Apesar da tendência positiva, a desigualdade de renda
pouco se alterou no período. Em 1992, aponta o relatório,
os 20% mais pobres do país tinha apenas 3% do total
da renda nacional; em 2002, o percentual subiu um pouco, para
4,2%. Os 20% mais ricos se apropriaram de 55,7% da renda em
1992, 55,8% em 1996 e 56,8% em 2002. “Apesar da melhora
na renda dos mais pobres, a distância em relação
aos mais abastados pouco se alterou”, observa o texto.
Além disso, persistem outros tipos de desigualdade.
Em 2002, a situação de extrema pobreza atingia
5,2% dos moradores da região Sudeste; no Nordeste,
a proporção era quase cinco vezes maior: 25,2%.
Entre o 1% mais rico da população, 86% eram
brancos em 2002; entre os 10% mais pobres, 65% eram de cor
preta ou parda.
Educação
Em educação, o desempenho do Brasil aponta
que o país já cumpriu ou está prestes
a cumprir os Objetivos do Milênio. O Objetivo número
2 prevê ensino básico universal a todas as crianças.
Em 1992, 78% das crianças de 7 a 10 anos estavam entre
a 1ª e a 4ª série do ensino fundamental (antigo
primário); em 2002, eram 90%. O Objetivo número
3 (Promover a igualdade entre os sexos e a autonomia das mulheres)
tem como principal meta eliminar a disparidade entre homens
e mulheres em todos os níveis de ensino; no Brasil,
na média, as mulheres estudam mais que os homens.
No nível básico, entre 1ª e 4ª série,
as conquistas abrangem todas as regiões, brancos, pretos
e pardos. Nos outros níveis, as diferenças se
acentuam. Os negros têm, em média, menos anos
de estudo. Há desigualdade também em nível
regional: no Sul, 91,7% dos alunos que iniciam a 1ª série
chegam à 5ª série; no Nordeste, esse percentual
cai para 70,2%.
Saúde
As projeções do relatório também
indicam que o Brasil deve cumprir o Objetivo número
4, que prevê reduzir em dois terços a mortalidade
de crianças menores de cinco anos. Em 1990, para cada
mil nascidos vivos, 53,7 crianças morriam antes de
completar cinco anos; em 2002, a taxa havia caído para
33,7 — uma redução de 37,2%. A meta para
2015 é diminuir a taxa para 17,9. Houve avanço
em todas as regiões, mas ainda há desigualdades.
Em 2000, por exemplo, a taxa de mortalidade infantil no Nordeste
era 160% maior que no Sul.
O Objetivo número 5 determina que, entre 1990 e 2015,
seja reduzida em dois terços a taxa de mortalidade
maternal. O relatório do governo brasileiro indica
que os dados do país sobre o assunto são pouco
confiáveis, já que há grande número
de subnotificação. O principal problema “é
o preenchimento inadequado da declaração de
óbito, principalmente no quesito referente à
presença de gravidez”. O documento usa uma estimativa
que indica que há 75,3 mortes maternas para cada 100
mil nascimentos, e ressalta que nos países desenvolvidos
esse número é de “no máximo 20
mortes por 100 mil nascidos vivos”.
O país tem conseguido reduzir o número de pessoas
infectadas pela Aids, como prevê o sexto Objetivo, que
trata de enfermidades. A malária registrou forte recuo
na década de 90, mas está voltando a crescer,
segundo o relatório, em razão de “problemas
decorrentes do crescimento desordenado e invasores nas periferias
de Manaus e Porto Velho”. A prevalência da doença
tem forte conotação regional: 99% dos casos
são registrados na Amazônia Legal (que inclui
áreas da região Norte, do Maranhão e
do Mato Grosso).
A tuberculose tem mostrado “lenta redução”,
na avaliação do estudo: a incidência recuou
caiu de 51,8 para 44,6 a cada 100 mil habitantes. Houve progressos
no combate à hanseníase, mas o Brasil é
o país com maior prevalência da doença
no mundo e o segundo maior em número de casos.
Na área ambiental, o relatório observa que
o desmatamento tem se acelerado na Mata Atlântica e
no Amazônia; por outro lado, houve um crescimento expressivo
no número de novas unidades de conservação.
O acesso à água tratada tem aumentado, mas
em ritmo menor na zona rural. Nas cidades, a cobertura passou
de 88,3%, em 1992, para 91,3%, em 2002; no campo, de 76,2%,
em 1992, para 80,6%, em 2002 (incluindo água proveniente
de poço ou nascente). O problema maior é no
acesso a esgoto. Uma das metas do Objetivo 7 é reduzir
pela metade a proporção de pessoas sem esse
benefício, mas o Brasil tem avançado em ritmo
lento: nas áreas urbanas, a porcentagem da população
atendida por rede geral ou fossa séptica passou de
65,9%, em 1992, para 74,9%, em 2002; no campo, o acesso passou
de 10,3% para 16,0% no período.
Sobre o Objetivo do Milênio número 8 (Estabelecer
uma parceria mundial para o Desenvolvimento), o documento
destaca as iniciativas do Brasil no campo das relações
exteriores, como o lançamento de um fundo de combate
à fome — em parceria com Índia e África
do Sul — e os descontos de US$ 993,1 milhões
na dívida de países em desenvolvimento.
As informações são do site PNUD Brasil.
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