Dados
da Unesco e do Ministério da Saúde mostram que
a gravidez precoce e as dificuldades dela decorrentes já
respondem pela terceira causa de óbitos entre as mulheres
jovens do Brasil, perdendo apenas para homicídios e
acidentes de transporte. E mais: dados preliminares da Unesco
mostram que 25% das meninas entre 15 e 17 anos que deixam
a escola o fazem por causa da gravidez, mostrando que a maternidade
antecipada já é a principal causa de evasão
escolar de meninas nesta faixa etária. Segundo a Unesco,
das meninas de 15 a 17 que não estudam, 31% residem
no Nordeste. No país, 71% moram no interior e 12% nas
periferias.
Os dados, ainda inéditos, constam de três pesquisas
em fase de conclusão. Uma é do Ministério
da Saúde: o “Saúde Brasil 2005”,
segunda versão do mapa do setor produzido anualmente
pelo governo federal. Outras duas são da Unesco “Juventudes
Brasileiras” e “Juventudes e Sexualidade”,
sendo que a última será lançada hoje
em solenidade no Ministério da Educação.
Somente entre 2001 e 2003, nasceram no país 82.834
bebês cujas mães têm entre 10 e 14 anos.
Outros dois milhões são filhos de jovens entre
15 e 19.
A gravidez realmente está se tornando um grande problema
na educação. Se 25% das meninas de 15 a 17 anos
grávidas deixam a escola, isso significa dizer que
254 mil páram anualmente de estudar. E 2%, ou seja,
outras 20 mil, abandonam os estudos para casar — afirma
Miriam Abramovay, professora da Universidade Católica
de Brasília, vice-coordenadora do Observatório
Violência nas Escolas-Brasil e uma das coordenadoras
da pesquisa “Juventudes Brasileiras”, da Unesco.
Palestras contra a evasão escolar
No município de Vicência, a 87 quilômetros
de Recife, 40% das estudantes da única escola municipal
do distrito de Murupé estavam grávidas há
dois anos. Diante disso, a então secretária
de Educação Sara Lima implantou uma programação
de palestras para evitar a evasão escolar. Segundo
o atual secretário, Adilson Carlos Pereira, o problema
agora está contornado. Hoje secretária-executiva
de Educação de Pernambuco, Sara diz que, no
segundo semestre, o estado vai dar início a um programa
de prevenção à gravidez precoce nas escolas.
Segundo a coordenadora de Informações e Análises
Epidemiológicas da Secretaria Nacional de Vigilância
de Saúde, Maria de Fátima Marinho de Souza,
os óbitos atribuídos às causas provocadas
pela gravidez precoce vêm se mantendo no terceiro lugar
na estatística geral de mortes na faixa etária
de 15 a 19 anos, desde 2001. Em 2003, data do último
levantamento que constará no Mapa da Saúde desse
ano, a situação não é diferente.
Gravidez, parto e puerpério indicam taxa de mortalidade
de 2,7 por cada grupo de cem mil jovens naquela faixa etária.
Ou seja, a morte provocada por gravidez precoce e suas conseqüências
só perde no Brasil, entre garotas de 15 a 19 anos,
para causas violentas, como os acidentes de trânsito
(7 por 100 mil) e homicídios (6,5 por 100 mil). No
Norte, os óbitos femininos pelos mesmos motivos ainda
são mais preocupantes: 5,7 por 100 mil para as jovens
de 15 a 19 anos.
Mães meninas geram 10.200 bebês
No Norte e no Nordeste é onde nasce o maior
percentual de bebês de mães com idades entre
10 e 14 anos. Em números absolutos, o Nordeste é
a região mais fértil: são mais de 10.200
bebês que nascem a cada ano de mães meninas.
E os números não mudam muito de um ano para
outro.
Em Recife, a ONG Cais do Parto, que trabalha com humanização
do parto e educação sexual para adolescentes,
começou a percorrer escolas procurando um público-alvo
de 13 a 18 anos, mas teve que mudar de faixa etária.
A maioria das meninas já tinha atividade sexual e
engravidado. Baixamos a faixa etária para a pré-adolescência,
que é quando elas começam a fazer sexo, entre
9 e 13 anos, conta Suely Carneiro, coordenadora do Cais do
Parto.
Habituada a lidar com um público muito jovem,
Suely faz um alerta:
Normalmente, as adolescentes jogam os filhos para os avós
criarem e tentam trabalhar para sustentá-los. Muitas
deixam a escola e nunca mais voltam. E a reincindência
na gravidez é grande. Temos uma geração
de pais inexperientes e confusos, cujos filhos podem se transformar
em adultos sem referências.
Em Pernambuco, em 2003, nasceram mais de 1.500 bebês
de mães com idade entre 10 e 14 anos. Outros 226.102
foram gerados por jovens entre 15 e 19 anos, segundo o Ministério
da Saúde. Já os dados da Unesco indicam que,
em quatro capitais, o percentual de meninas que dizem ter
conhecimento de colegas grávidas varia de 54,2 a 76,3%.
Em Recife, 36,9% das alunas menores de 18 anos já
ficaram grávidas pelo menos uma vez. E em Fortaleza
e Cuiabá, a quantidade de meninas das escolas públicas
que já ficaram grávidas varia entre 33,3% e
22,2%.
LETÍCIA LINS
do jornal O Globo
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