O governo brasileiro é um
dos que mais gastam com juros no mundo. Levantamento feito
pela agência de classificação de risco
Standard & Poor's em 96 países e na União
Européia coloca o Brasil no quarto lugar da lista em
2003, atrás apenas de Jamaica, Turquia e Líbano.
Em 2002, os quatro países já ocupavam o topo
do ranking, mas os três primeiros em diferentes posições
(pela ordem): Turquia, Líbano, Jamaica e Brasil.
Segundo Lisa Schineller, diretora da Standard & Poor's,
até há pouco tempo a vulnerabilidade externa
era um dos maiores obstáculos ao desenvolvimento da
economia brasileira. Agora, a atenção está
voltada aos gastos com juros. "A vulnerabilidade externa
ainda é um problema, mas hoje a preocupação
está, especialmente, na vulnerabilidade fiscal",
diz a analista, especializada em países latino-americanos.
Ao citar a vulnerabilidade externa, Schineller se refere
às dificuldades do país nos últimos anos
para obter dólares suficientes para equilibrar suas
contas.
Foram essas dificuldades, por exemplo, que fizeram o país
recorrer ao FMI (Fundo Monetário Internacional), ainda
em 1998, durante o governo Fernando Henrique Cardoso (1995
a 2002). A equipe econômica de Luiz Inácio Lula
da Silva renovou o acordo com o Fundo no fim de 2003.
Agora, porém, o problema são os juros. O levantamento
da S&P compara os juros pagos pelo governo (incluindo
Estados e municípios) com o PIB (Produto Interno Bruto)
de cada país. A idéia é verificar qual
o tamanho dos encargos da dívida em relação
ao total de riquezas produzidas.
Com o governo direcionando boa parte de seus recursos ao
pagamento de juros, sobra menos verba para investimentos que
poderiam estimular o crescimento. Nos últimos três
anos o Brasil cresceu a taxas inferiores a 2% -o percentual
exato de 2003 ainda não foi divulgado.
A pesquisa foi realizada com dados disponíveis em
novembro -a partir de resultados parciais de cada país,
projetaram-se números para todo o ano de 2003. No caso
do Brasil, segundo a estimativa, os gastos com juros chegaram
a 8% do PIB no ano passado. Números fechados pelo governo
no final de janeiro, porém, mostram que essa proporção
fechou o ano em 9,49%.
Em 2003, União, Estados, municípios e estatais
gastaram, juntos, R$ 145,210 bilhões com os encargos
da dívida pública, valor mais alto já
registrado no país desde que o BC passou a acompanhar
essa estatística, em 1991.
Os encargos da dívida pública brasileira são
altos quando comparados com os de outros países emergentes.
No México, por exemplo, as despesas com juros representam
3% do PIB. Os governos de China e Cingapura gastam, cada um,
o equivalente a 1%.
Dívida pública
Schineller diz que, no caso brasileiro, os altos gastos com
juros refletem a elevada dívida pública, que
também é atrelada, em grande parte, a taxas
de juros de curto prazo (como a taxa Selic, hoje em 16,5%
ao ano) e ao dólar.
"A política monetária não é
a única maneira de resolver o problema, mas uma queda
nos juros [Selic] contribuiria." Ela diz, porém,
que "o BC não pode agir sozinho", pois a
redução do juro depende da estabilidade da inflação.
Schineller afirma ainda que, diante dos elevados gastos com
juros, o Brasil deve persistir no aperto fiscal. "É
muito importante que o governo mantenha um superávit
primário elevado", diz, ao se referir ao dinheiro
economizado pelo governo para o pagamento de juros da dívida.
Procurado pela Folha, o Ministério da Fazenda disse
que não iria comentar o levantamento. O Banco Central
não se manifestou.
NEY HAYASHI DA CRUZ
da Folha de S. Paulo, sucursal de Brasília
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