No mais
forte discurso em defesa da política econômica
do governo até agora, o presidente Luiz Inácio
Lula da Silva afirmou que o país vai voltar a crescer
neste ano e que a inflação está sob controle.
Lula criticou ainda o aumento de preços para uma platéia
formada por empresários e sindicalistas.
O presidente reconheceu também que os juros no país,
hoje em 16,5% ao ano, estão altos, mas afirmou que
são os menores juros reais em dez anos. Ao dizer que
não discute se as críticas aos juros altos são
"justas ou injustas", ele afirmou que eles se transformaram
no "bode expiatório de todo o problema do governo".
Sem fazer referência direta ao ajuste fiscal, criticado
até por governistas, Lula disse que, na política,
vem tentando fazer aquilo que faz na vida pessoal: nunca gastar
mais do que recebe.
O discurso de Lula, que durou 56 minutos, foi feito durante
reunião do CDES (Conselho de Desenvolvimento Econômico
e Social), realizada ontem no Palácio do Planalto,
para apresentação da política industrial
do governo.
"Não há como a economia brasileira não
crescer neste ano. Possivelmente não vai crescer o
tanto que nós gostaríamos que ela cresça,
mas vai crescer", disse Lula.
Seu discurso foi uma resposta às críticas à
condução da política econômica
feitas pela oposição, pelo PT e por membros
do próprio governo. Críticas que aumentaram
após a divulgação, no final de março,
de que a economia brasileira encolheu 0,2% em 2003.
Lula reconheceu que a política econômica "certamente
merece críticas", mas afirmou que não pretende
alterá-la. Para justificar, usou uma metáfora:
"Quando uma criança pequena tem crise de bronquite,
você leva ao médico. Tem médico que a
primeira coisa que faz é meter antibiótico no
moleque. A criança fica com problemas causados pela
enorme quantidade de antibióticos. Nós não
teremos antibiótico".
Sobre a inflação, disse que "estamos mais
próximos de atingir a meta de 5,5% de inflação
do que em qualquer outro momento deste país".
Com isso, deixou claro que não pretende alterar a meta
de inflação, medida defendida por empresários
e sindicalistas como forma de reduzir os juros.
Ao comentar medidas de estímulo à construção
civil, anunciadas na semana passada, afirmou: "Teve gente
que não gostou, mas também nem Jesus Cristo
conseguiu unanimidade. Por que nós haveríamos
de construir para cada coisa uma unanimidade? Vamos fazendo
a arte do possível".
Ao defender a política econômica, Lula defendeu
o trabalho do ministro Antonio Palocci Filho (Fazenda). Apesar
de integrar o Conselhão, como é conhecido o
CDES, ele não foi à reunião. A seguir,
os principais trechos do discurso do presidente.
DEMORA - No início do discurso, Lula dirigiu-se aos
que cobram crescimento econômico imediato. Disse que
"fazer a coisa com seriedade leva mais tempo (...) Como
nós não estamos pensando em fazer um programa
para um governo ou um programa para uma eleição,
não temos pressa de demorar um mês a mais ou
dois meses a mais, de receber mais ou menos críticas.
Queremos fazer as coisas com a solidez que uma nação
precisa ter para que ela possa crescer de forma sustentável".
"PLANO LULA" - "Cada ministro da Fazenda que
entrava inventava um plano, o seu plano, o seu nome, o seu
sucesso", disse, citando planos feitos por outros governos.
"Então, tomei a decisão: não é
justo que inventemos o Plano Palocci, o Plano Lula ou um plano
qualquer para ter sucesso de meio dia ou de meia hora. Porque
depois alguém vai ter arcar com o prejuízo.
E vai ser o próprio povo."
DESEMPREGO - O presidente também rebateu as críticas
daqueles que cobram a criação de 10 milhões
de empregos, prometida por ele durante a campanha presidencial.
"Preparar o Brasil que queremos não é inventar
como gerar emprego. O emprego que precisamos construir é
um emprego sólido. E, para isso, resta a economia voltar
a crescer. E vocês sabem que ela vai crescer."
TAXA DE JUROS - "Ela é alta mesmo, mas é
a mais baixa dos últimos dez anos do ponto de vista
dos juros reais [sem contar a inflação]. E ainda
é alta", disse Lula. "Todo mundo reconhece,
do mais simples mortal brasileiro ao mais importante dirigente
do país, que as taxas de juros reais ainda são
elevadas se comparadas às de outros países."
Segundo ele, "qualquer investidor sabe que alguém
que está aí oferecendo juros astronômicos
é porque alguma coisa não está bem".
INFLAÇÃO - Lula fez uma provocação
aos empresários que acompanhavam o discurso. Deu a
entender que setores da economia seriam gananciosos e teriam
sido os responsáveis pela retomada da inflação
em janeiro. "Quem sabe fosse importante que o Conselho
discutisse o que fazer quando um determinado setor da economia
tem sede de ganhar mais, aproveitando o poder de compra de
alguns segmentos e, em vez de vender mais, aumenta o preço."
Em seguida, lançou a pergunta: "Quais instrumentos
vocês indicariam para o governo evitar que isso [aumento
de preços] aconteça?". Dirigindo-se à
platéia, integrada por empresários, ele respondeu:
"Não conheço muitos. Um deles são
os juros, mas o outro poderia ser a redução
de alíquotas de importação daquele produto
similar a zero. Aí [citando nomes de sindicalistas],
iriam fazer passeata dizendo que isso estaria causando desemprego".
Em seguida, descartou o controle de preços como instrumento
a ser usado para baixar a inflação: "Está
provado que não dá certo".
META DE INFLAÇÃO - O presidente defendeu a
meta de inflação deste ano, de 5,5%. "Mas
aparece alguém e diz assim: "Por que 5,5%? Não
pode ser 6%". Ora, quem quer que chegue aos 6% vai querer
que chegue aos 7%. Sempre é possível 1% [sic]
a mais. Nós poderemos até ter 1% a mais de inflação
se não tivermos competência para cumprir aquilo
que nós mesmos determinamos."
Ainda recorreu a uma metáfora para falar da meta de
inflação: "É como uma criança
que vai para a escola. Ela sabe que o mínimo é
cinco e não estuda nunca para ter mais que cinco. Está
sempre na rebarba. Chega ao fim do ano e fica para recuperação.
Nós não queremos ficar para recuperação.
Queremos controlar a inflação".
RICARDO WESTIN
da Folha de S. Paulo, enviado especial a Brasília
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