As ações
afirmativas aumentaram a participação de minorias
em postos de trabalho mais qualificados, mas não foram
suficientes para reduzir a desigualdade entre ricos e pobres
nos países em que foram adotadas.
A conclusão é do "Relatório do Desenvolvimento
Humano 2004", que analisou as mudanças provocadas
por políticas de ações afirmativas nos
Estados Unidos, África do Sul, Malásia e Índia.
"Ainda que as políticas de ações
afirmativas tenham muitos êxitos, as desigualdades de
rendimento entre indivíduos continuaram a aumentar.
É verdade que essas desigualdades poderiam ter piorado
sem ações afirmativas, mas, para reduzir as
desigualdades individuais e construir sociedades verdadeiramente
inclusivas e eqüitativas, é preciso outras políticas",
diz o relatório.
O documento cita dados dos Estados Unidos -país que
adota ações afirmativas há mais de 30
anos- que mostram que, de 1978 para 2003, aumentou a proporção
de trabalhadores negros entre advogados, juízes, médicos,
engenheiros e professores.
No entanto, o maior acesso dos negros a empregos mais qualificados
não alterou a desigualdade entre negros e brancos.
A taxa de desemprego entre jovens (16 a 19 anos) negros em
1980, de 38,5%, era mais que o dobro da encontrada entre os
brancos, de 15,5%. Vinte anos depois, houve uma redução
na taxa dos dois grupos, mas os negros continuam tendo uma
taxa (24,5%) que é mais que o dobro da verificada entre
os brancos (11,4%).
No caso da Malásia, o documento mostra que as ações
afirmativas diminuíram a desigualdade de rendimento
entre grupos étnicos, mas não houve alteração
no quadro de distribuição de riqueza em toda
a população e, de 1987 para 1999, os 20% mais
ricos continuaram concentrando mais de 50% da riqueza.
Para o sociólogo Simon Schwartzman, ex-presidente do
IBGE e presidente do Iets (Instituto de Estudos do Trabalho
e Sociedade), é de se esperar que beneficiados pelas
ações afirmativas sejam, em geral, pessoas de
grupos minoritários em situação melhor
do que a média do mesmo grupo. Para ele, o importante
é saber se o benefício que essa pessoa ganha
é revertido de alguma forma para seu grupo.
"Não há muita confirmação
de que isso aconteça. Muitas vezes, as pessoas, quando
conseguem subir socialmente, preferem se afastar de seu grupo
de origem", diz Schwartzman.
Marcelo Paixão, professor da UFRJ (Universidade Federal
do Rio de Janeiro) e coordenador da ONG Observatório
Afro-Brasileiro, afirma que, no caso de políticas de
ações afirmativas no ensino superior, é
normal que apenas uma parcela de negros (via cotas raciais)
seja beneficiada.
"Apenas os que têm ensino médio completo
podem entrar na universidade. Uma política de cotas
não vai beneficiar analfabetos na extrema pobreza.
As ações afirmativas complementam ações
para diminuir a pobreza e a desigualdade", afirma Paixão.
Cotas no Brasil
No Brasil (que não é citado no relatório
nesse capítulo), a face mais visível -e polêmica-
da política de ações afirmativas são
as cotas estabelecidas por algumas universidades públicas.
A primeira universidade que adotou cotas a ter divulgado um
estudo foi a Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro),
com base no desempenho dos estudantes no primeiro semestre
do ano passado.
Neste ano, a Uerj divulgou um estudo mostrando que cotistas
tiveram maior reprovação por nota do que os
demais estudantes. Em 2003, no entanto, a instituição
(na gestão de outra reitoria) tinha divulgado um estudo
que chegava a uma conclusão inversa: cotistas tinha
índice de aprovação ligeiramente superior
aos demais. A taxa de evasão, em ambos os estudos,
foi menor entre os cotistas.
A diferença na conclusão é explicada
pela forma de comparação. A atual reitoria da
Uerj considerou mais adequado não levar em conta alunos
reprovados por abandono e divulgou que a reprovação
por nota foi maior entre os cotistas do que entre os demais.
O estudo comparativo da nota na Uneb (Universidade do Estado
da Bahia) mostrou que o desempenho dos cotistas foi inferior
ao dos demais estudantes. Na avaliação da Uneb,
no entanto, o desempenho dos cotistas foi bom, considerando
que a maioria deles estudou em escolas públicas.
As informações são
da Folha de S.Paulo.
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