A discussão
sobre a quantidade de alfabetizados no Brasil esconde o problema
real da educação no país: a falta de
qualidade. Segundo o economista Marcelo Neri, diretor de Centro
de Estudos Sociais da Fundação Getúlio
Vargas (FGV), a qualidade do ensino brasileiro é péssima
para os padrões internacionais. A mesma opinião
tem o economista Mauricio Blanco, do Instituto de Estudos
de Trabalho e Sociedade (Iets), que estuda desigualdade e
desenvolvimento humano:
"Se o critério fosse a conclusão do ensino
fundamental, a taxa cairia brutalmente. Esse indicador baseado
apenas na quantidade não está captando a situação
precária da educação no Brasil. O número
médio de anos de estudo é vergonhoso, é
de 6,2 anos. Ou seja, nem o ensino fundamental concluído,
que daria oito anos — disse o economista".
Neri complementa:
"Certamente, o Brasil não estaria dentro do seleto
grupo dos países de alto desenvolvimento humano em
educação. Estaria entre os subdesenvolvidos.
Esse dado é falso, portanto, não se pode acomodar.
Dá uma falsa sensação de dever cumprido",
diz.
O economista da FGV traz, porém, uma boa notícia:
a qualidade do ensino parou de cair. Pelo Sistema de Avaliação
do Ensino Básico (Saeb) do Ministério da Educação
e Cultura, de 2001 para 2003, a qualidade do ensino ficou
estável.
Desempenho na leitura
O Saeb é realizado, a cada dois anos, por
amostragem, nas quarta e oitava séries do ensino fundamental
e terceira série do ensino médio, em matemática
e língua portuguesa, com a participação
de 300 mil estudantes. Pelos dados oficiais, 96,4% das crianças
de 7 a 14 anos estão na escola, mas de cada cem alunos
que iniciam o ensino fundamental, 40 não conseguem
concluí-lo. Na quarta série, 55% dos estudantes
não sabem ler de forma competente e, na oitava série,
58% estão abaixo do desempenho esperado em matemática.
" Tem uma imagem no espelho, enquanto a quantidade parou
de crescer, a qualidade parou de cair. E a pesquisa inclui
anos de governos diferentes, o último de Fernando Henrique
Cardoso e o primeiro do governo Lula".
Desde 1995, as provas mostraram um desempenho cada vez pior
nas avaliações. Alguns especialistas creditavam
o resultado ruim ao aumento do acesso à escola, principalmente
da população mais pobre:"Em parte, essa
piora contínua poderia ser resultado da expansão.
Mas há o componente de falta de qualidade do ensino
mesmo, detectado por estudos feitos por nós",
disse o economista.
Blanco, do Iets, vai mais longe. Para ele, as Nações
Unidas precisam mudar a forma de aferição dos
progressos na educação. Usar a conclusão
no ensino fundamental e a freqüência no ensino
médio seriam formas mais fiéis de mostrar os
avanços:
"Em países de alto desenvolvimento, por exemplo,
não há analfabetos e nemcrianças fora
da escola".
CÁSSIA ALMEIDA
do jornal O Globo
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