A psicanalista
Marie Rose Moro, 42, professora da Universidade Paris XIII,
realiza pelo mundo um trabalho sobre mães e bebês
em situação de risco.
Consultora da ONG Médicos Sem Fronteiras, ela esteve
nesta semana em Canela (RS), participando da Semana do Bebê,
evento que acontece há cinco anos com objetivo de desenvolver
uma cultura de prevenção e assistência
à saúde física e mental dos bebês.
Para Moro, as situações de guerra ou de violência
urbana, como as vividas no Rio de Janeiro, agravam os distúrbios
psíquicos na primeira infância. A seguir, trechos
da entrevista concedida à Folha.
Folha - Como é desenvolvido esse
trabalho com bebês em situações de risco?
Marie Rose Moro - Acontece em vários
lugares. Em Paris, começamos no norte da cidade, onde
há muitas famílias de imigrantes ilegais, sem
trabalho, doentes. Tentamos fazer com que essas famílias,
além de ter acesso aos serviços de saúde,
possam compreender as suas relações com os filhos.
A partir do momento em que esse programa começou a
caminhar sozinho, começamos a ter outros projetos onde
havia guerras -Palestina, Armênia, Afeganistão,
em Kosovo, na Croácia, em Serra Leoa, entre outros.
Começamos a criar programas com a comunidade para os
mais vulneráveis, especialmente as gestantes e as mães
de bebês.
Folha - Quais são as intervenções
psiquiátricas possíveis em situações
de guerra permanente?
Moro - Vamos às casas, aos campos
de refugiados e oferecemos consultas médicas gratuitas
e cursos de capacitação para pessoas da comunidade
para que reconheçam o sofrimento das mães e
dos bebês e tomem conta deles. Quanto se cura uma mãe,
se cura toda a família. Desenvolvemos programas específicos
para cada comunidade.
Folha - Há algum caso de intervenção
com bebês que tenha lhe marcado em especial?
Moro - Sim. Há seis meses estive
na Palestina fazendo um trabalho com bebês desnutridos.
Encontrei uma mãe que já tinha perdido cinco
filhos de desnutrição. As meninas conseguiam
sobreviver, mas os meninos morriam antes dos cinco meses.
Ela chegou com um bebê de dois meses e já não
lhe dava mais o peito porque achava que não valia a
pena porque ia morrer mesmo. A mãe estava muito deprimida
e acreditava que havia perdido a capacidade ser mãe.
Íamos diariamente à casa dessa mulher para alimentar
o bebê e falar com ele. Um dia, esse bebê procurou
o peito da mãe e ela ficou feliz, orgulhosa porque
o menino havia lhe mostrado que ainda poderia dar algo.
Folha - Essas crianças que vivem em
situações de violência urbana, como as
que moram nas favelas do Rio, correm o mesmo risco psíquico
daquelas que vivem na guerra?
Moro - A violência urbana é muito grave.
São situações repetitivas. Não
dura um ano, dura toda a vida. A sociedade tem de acompanhar
essas crianças ou haverá toda uma geração
sacrificada.
As informações são
da Folha de S.Paulo.
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