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educação
17/05/2004
Internet faz adolescentes mudarem escola

SÃO PAULO - Há cerca de três semanas alguma coisa mudou na Escola Estadual Jacob Casseb, em São Bernardo do Campo, na Grande São Paulo. Os problemas com drogas entre os cerca de 1,5 mil alunos continuam, como na maioria das escolas metropolitanas do País, mas os professores estão percebendo uma melhora geral no clima: menor tensão e violência, mais respeito mútuo, maior vontade dos estudantes para participar e aprender.

Esta mudança começou quando os dez computadores do laboratório de informática da escola foram efetivamente ligados e, com uma conexão de banda larga, abriram aos alunos de 5.ª série ao ensino médio a perspectiva de falar com o mundo.

“Nossa relação com os professores mudou. Nos sentimos muito mais confiantes. Os nossos colegas nos respeitam mais. E temos que ser exemplo na escola”, conta Carolina Silva, de 14 anos, aluna da 8.ª série.

Grupos de adolescentes vêm trocando informações e idéias com colegas argentinos da cidade de Labarden, e só a articulação das turmas em torno do projeto já foi capaz de acender uma grande esperança no futuro. “Ajudar a escola que você gosta é muito importante. Esta experiência está trazendo cultura e muito mais”, diz Alan Corrêa da Silva, 15 anos, no 1.º ano do ensino médio.

Planos de futuro
A entrevista com os alunos foi feita pelo mesmo canal que possibilitou estas transformações: o fórum via internet. Qualquer pessoa, em qualquer lugar do mundo, pode conversar com estes adolescentes se entrar no site www.enlacesbrasil.org/cgi-bin/discus/discus.cgi e enviar uma mensagem ao fórum.

Também é possível conhecer um pouco da escola por meio das imagens disponíveis no mesmo site. As mais recentes mostram a festa que os alunos e seus 50 professores fizeram na semana passada para receber o apoio de dezenas de outras escolas à sua iniciativa.

“Temos de comemorar, porque hoje os nossos alunos começam a fazer planos para a faculdade, coisa que nem ousavam pensar”, explica Anita Simão Bernacci, 35 anos, professora de História e coordenadora destas atividades. “Temos agora um aluno de 16 anos especialista em Picasso e outro nos surpreendeu ao organizar sozinho toda a agenda das comemorações, mostrando uma impressionante visão de visão de processo.”

Escolas de Paz
O site onde funciona o fórum é da ONG Enlaces Brasil e o apoio moral vem da rede de alunos e professores que participa do projeto colaborativo Escolas de Paz, organizado pelo programa World Links, do Banco Mundial. As escolas recebem apostilas e capacitação diretamente do World Links, que funciona no Brasil desde 1998.

Na Escola Jacob Casseb, o projeto começou neste ano. A professora Anita chegou ali como voluntária ligada à Enlaces, que opera o programa no País. “Minha irmã, Alcione, é professora de Matemática na escola e pediu ajuda”, lembra ela. Aproveitando uma licença-prêmio, Anita fez um workshop na escola e pegou gosto. Transferiu-se de vez no fim do ano passado.

Não só ela se entusiasmou. “Os professores, de um modo geral, abraçaram a proposta. O medo diminuiu”, avalia Anita. O uso de drogas ainda é um problema, mas até os usuários ficaram mais responsáveis. “Antes, o uso de drogas era muito explícito, chegava a incomodar nas aulas com o cheiro, e agora eles procuram respeitar e não magoar os professores.”

A entrevista
Os principais trechos da entrevista com os alunos no fórum via internet.

Estado - Sobre o que vocês estão falando com os estudantes da Argentina? Que coisas interessantes vocês ficaram sabendo deles? Contaram alguma coisa interessante, que eles tenham gostado de saber?

Alan - Nós estamos apenas nos conhecendo um pouco para saber o que eles fazem da vida e gostam. Eles gostam das mesmas coisas que eu.(Alan Peterson Corrêa da Silva – 15 anos – 1.º ano do ensino médio)

Douglas - Começamos a nos comunicar duas semanas atrás. Os amigos argentinos nos ensinaram muitas coisas boas. Eu enviei uns desenhos por e-mail, que eles gostaram muito. As conversas são sobre as curiosidades dos nossos países. (Douglas Corrêa dos Santos - 15 anos – 2.º ano do ensino médio)

Carol - Nós moramos na cidade de São Bernardo do Campo, São Paulo. eles moram em Labarden - Buenos Aires, Argentina. Nós achávamos que Buenos Aires era só a capital da Argentina, como a capital do Brasil. Descobrimos que Buenos Aires é uma província, como nossos Estados, e Labarden é uma cidade como São Bernardo do Campo, e fica a 290 km da cidade de Buenos Aires. (Carolina Silva – 14 anos - 8.ª série)

Lívia - Estamos conversando sobre o projeto a paz na escola. (Lívia Nunes Sales - 14 anos – 8.ª série)

Márcio - Eles estão escrevendo em espanhol e nós respondemos em português!!! (Márcio Ferreira da Silva)

Estado - E como vocês se organizam aí para mandar as mensagens?

Daniela - Formamos grupos, e postamos nossas mensagens no fórum. (Daniela Favero - 17 anos – 3.º ano do ensino médio)

Alan - Nós nos organizamos em dupla ou em grupo, de jeito que todos possam se comunicar com os estrangeiros. Quem traduz as mensagens são as alunas Fernanda, Flávia e Andressa.

Deborah - O pessoal aqui é super unido. Quando mandamos nossas mensagens, tudo ocorre de maneira colaborativa, em duplas ou grupos. Deborah Favero - 17 anos – 3.º ano do ensino médio)

Estado - A escola tinha os computadores? Ou foram instalados agora? Vocês demoraram a aprender a usar o computador?

Carol - Os computadores chegaram há um tempo (acho que três anos), mas só a partir do ano passado começaram a ser usados pelos alunos. A professora Alcione começou com um curso básico de Informática e em outubro a professora Anita fez a capacitação da fase I com a gente. Este ano a capacitação é da fase zero, que é feita por nós e coordenada pelas professoras Anita e Alcione. Alguns alunos já sabem mexer no computador, outros não sabem nem ligar. Depende muito da força de vontade de cada um. Há monitores que nunca tinham feito curso de informática. Aprenderam tudo aqui e hoje ensinam outros alunos.

Deborah - Eu particularmente tinha uma noção sobre como usar o computador, mas aprendi muito aqui. Existem alunos que não conseguiam nem pegar no mouse. Mas é isso que acho importante, aqui sempre tem alguém disposto a ajudar, e realmente ajudam!

Eliane - Já existiam os computadores, mas eu não tinha noção de como se usava. Aprendi no laboratório. (Eliane Brito – 18 anos – 3.º ano do ensino médio)

Estado - Isso mudou a rotina da escola, não? O convívio com os professores melhorou? E com os colegas?

Carol - O uso do computador modificou nossa relação com os professores. Nos sentimos muito mais confiantes. Os nossos colegas nos respeitam mais. E temos que ser exemplo na escola (as professoras exigem isso).

Douglas - Eu posso dizer que eu sou prova de que muita gente mudou. Antes de ser monitor no laboratório eu não gostava de nada, a minha prioridade era bagunçar. Depois que comecei a participar das atividades do laboratório eu mudei 100%.

Estado - Muitas escolas têm problemas com violência, drogas... Na escola de vocês isso também acontece? O projeto está ajudando neste tipo de problema?

Alan - Qual a escola que não tem isso? Sim, o projeto Escola pela Paz não está somente movimentando a escola mas também a comunidade.

Jorge – Infelizmente, na nossa escola existe a violência, mas o projeto Escola pela a Paz está conseguindo combater não só a violência mas as drogas também. (Jorge Luis - 14 anos - 8ª série)

Estado - Vocês conhecem colegas da escola que mudaram bastante com o projeto? Que deixaram de usar drogas ou fornecer drogas?

Alan - Sim.

Deborah - Conheci alunos de outros períodos (pois estudo à noite e venho para a escola de manhã ou a tarde para ajudar nos projetos), então não falo só em relação a drogas; digo também em relação a diferenças. Eu mesma conversei com uma menina que não ia muito com a cara.

Jorge - Bem, ainda não deu para perceber grandes mudanças mas eu sei que aos poucos vamos conseguir transformar nossa escola em uma escola melhor.

Carol - Os alunos têm se unido muito mais. Gente que não se conhecia se conhece agora, todo mundo trabalha junto. A gente aprende, ri, se diverte, brinca . Os professores estão com a gente o tempo inteiro. O laboratório fez uma reviravolta na escola. Esta tudo melhor.

Flávio e Rodrigo - As nossas armas são caneta e papel. Sobre as drogas, em todas as escolas existem. (Flávio Tomas da Silva Maciel – 2.º ano do ensino médio / Rodrigo Amorim Rodriguês – 1.º ano)

Estado – O que esta experiência está trazendo para vocês, em termos de novas oportunidades?

Alan - Bom, na minha opinião mudou muito porque ajudar a escola que você gosta é muito importante. Para o meu futuro eu quero me dar bem. Esta experiência está trazendo cultura e muito mais.

Carol - Antes de participar do Projeto Enlaces, eu saía da escola e ia para casa. Como minha mãe trabalha, ajudo nos deveres. Agora sou monitora, ensino outros alunos. Minha mãe tem o maior orgulho de mim e nem fica brava quando deixo de fazer alguma coisa em casa. Ela sabe que estou ajudando outras pessoas a terem uma oportunidade melhor de vida.

Jorge - Isso fez com que eu pensasse mais no meu futuro no meio da informática.

 

As informações são da Agência Estado.

   
 
 
 

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